Tentei me concentrar nas árvores que passavam, em qualquer coisa que não fosse a ansiedade roendo meu estômago. Ele sempre me priorizava. Ele sempre garantia que eu tivesse meu espaço. Ele sempre sentava ao meu lado.
Então eu o vi, finalmente, correndo em direção ao ônibus, Alessandra agarrada ao seu braço. Ela estava rindo, a cabeça jogada para trás. Ele sussurrou algo para ela, e ela deu um soco brincalhão em seu ombro. Eles eram a imagem da juventude despreocupada, alheios à minha vigília silenciosa.
Ele subiu no ônibus, seus olhos percorrendo as fileiras. Ele me viu. Seu olhar se prendeu nos dois assentos vazios ao meu lado. Por uma fração de segundo, vi um brilho familiar em seus olhos – reconhecimento, talvez um pingo de culpa. Ele começou a se mover em minha direção. Meu coração deu um pequeno e estúpido solavanco.
Mas então, Alessandra puxou seu braço. Ela sussurrou algo, suas unhas cravando-se de brincadeira em seu bíceps. Seus olhos, brilhantes e calculistas, encontraram os meus. Um pequeno sorriso quase imperceptível brincou em seus lábios. Ela não o soltou.
Josias hesitou. Seus olhos saltaram de mim para Alessandra, e de volta para mim. Seus ombros caíram quase imperceptivelmente. Ele respirou fundo, depois se virou, permitindo que Alessandra o guiasse para o fundo do ônibus, onde dois assentos acabavam de vagar. Ele se sentou ao lado dela, um gesto casual que rasgou os últimos resquícios da minha esperança.
Ele a escolheu. De novo. Publicamente. Inquestionavelmente.
Eu olhei pela janela, forçando meu rosto a se tornar uma máscara em branco. Meu celular vibrou. Uma mensagem dele.
"Ei, desculpa, a Alê queria sentar no fundo. Fica mais fácil com os amigos dela lá. Tá tudo bem aí?"
Eu não respondi.
Outra mensagem, quase imediatamente. "Você tá com seus aparelhos auditivos, né? Sei que o ônibus é barulhento. Não quero que você perca nada."
Ele ainda pensava que era meu protetor, minha voz. Ele ainda pensava que eu precisava dele. Ele não percebia que eu já estava surda para suas palavras vazias. Eu simplesmente bloqueei o número dele. A pequena satisfação foi fugaz, engolida pelo buraco enorme no meu peito. Peguei meu caderno de desenho, me enterrando no mundo silencioso de linhas e sombras. A viagem de ônibus passou como um borrão de indiferença forçada.
Quando chegamos ao acampamento, os monitores anunciaram a primeira atividade: uma caça ao tesouro, em duplas. Meu estômago se revirou. Eu odiava essas interações forçadas. Preferia a solidão tranquila da minha própria companhia.
Antes que eu pudesse pensar em uma desculpa, Alessandra estava lá, um sorriso meloso no rosto. "Graça! Você e eu, certo? Melhores amigas!" Ela entrelaçou seu braço no meu. Seu toque era frio, possessivo.
Eu recuei, puxando meu braço. O sorriso dela não vacilou, mas seus olhos se estreitaram. "Qual o problema, Gracinha? Não quer ser minha parceira?"
Eu balancei a cabeça, meu maxilar tenso. Eu não confiava nela. Não depois do mural. Não depois da traição de Josias.
"Ah, qual é", ela ronronou, aproximando-se. "Vai ser divertido! Podemos nos conectar. Você e eu. Um dia de garotas na natureza." Sua voz baixou para um sussurro. "Além disso, o Josias está com o Marcos. Você não gostaria de estragar o momento deles, gostaria?"
Eu apenas fiquei ali, uma pedra no riacho. Ela se aproximou ainda mais, sua mão alcançando meu braço novamente. Desta vez, eu recuei bruscamente, dando um passo inteiro para trás.
O sorriso dela desapareceu. Seus olhos brilharam com algo feio. "Tudo bem", ela sibilou, sua voz quase inaudível. "Seja assim."
Então, com um suspiro dramático e um balanço teatral, ela tropeçou para trás. Seu pé se prendeu em uma raiz invisível, e ela caiu com um grito exagerado, aterrissando com um baque suave na terra úmida.
"Ai! Meu tornozelo!", ela gritou, agarrando a perna.
Imediatamente, Josias estava lá. Ele correu em direção a ela, seu rosto uma máscara de preocupação. "Alê! Você está bem? O que aconteceu?"
Alessandra, com lágrimas brotando nos olhos, apontou um dedo trêmulo para mim. "A Graça... ela... ela me empurrou! Eu só queria ser amiga, e ela... ela me empurrou!"
Meu sangue gelou. Ela me empurrou. A mentira pairava no ar, espessa e nauseante.
Josias se ajoelhou ao lado dela, sua mão tocando gentilmente seu tornozelo. Ele nem sequer olhou para mim. Seu foco estava inteiramente em Alessandra.
"O quê?", eu finalmente consegui coaxar, minha voz rouca de choque e indignação. "Eu não... eu não a empurrei!"
Um coro de suspiros e murmúrios irrompeu dos alunos ao redor. Seus olhos, antes indiferentes, agora estavam fixos em mim, cheios de acusação e nojo. Marcos, o amigo de Josias, deu um passo à frente, seu rosto contorcido de raiva. "Você empurrou ela mesmo? Qual é o seu problema, Graça? Ela estava tentando ser legal!"
"Não! Eu não empurrei!", insisti, minha voz falhando, quase inaudível acima de seus sussurros crescentes.
"Ela está mentindo!", Alessandra lamentou, enterrando o rosto no ombro de Josias. "Ela sempre me odiou! Ela tem ciúmes!"
Os sussurros ficaram mais altos, transformando-se em condenação aberta. Louca. A mudinha ficou maluca. Sempre tão esquisita.
Minha visão embaçou. Minhas mãos tremiam. Eu estava presa, engolfada pelo julgamento coletivo deles.
Josias, embalando Alessandra, finalmente olhou para mim. Seus olhos, geralmente tão gentis, agora estavam duros, frios e totalmente desprovidos de pena. "Graça", ele disse, sua voz baixa e perigosa. "Peça desculpas a ela. Agora."
Minha cabeça se ergueu bruscamente. Eu? Pedir desculpas? Por algo que eu não fiz?
"Não", eu engasguei, minha voz mal um sussurro. "Eu não vou. Eu não fiz nada."
"Graça, não piore as coisas", ele avisou, seu aperto em Alessandra se intensificando. "Ela está machucada. E está chateada. Apenas peça desculpas, e podemos superar isso."
"Mas eu não a empurrei!", minha voz era um apelo desesperado, mas se perdeu na maré crescente da opinião pública.
"Você vai pedir desculpas, ou eu vou ter que te arrastar até aqui?", ele ameaçou, seus olhos ardendo com uma raiva desconhecida. "Você quer fazer a Alessandra parecer mal? Quer que todo mundo pense que ela está mentindo?"
Suas palavras, seu tom, foram uma traição mais profunda do que qualquer outra antes. Ele não estava apenas escolhendo ela; ele estava se voltando ativamente contra mim. Ele estava sacrificando minha dignidade, minha verdade, pela conveniência dela, por sua própria popularidade.
Os rostos ao meu redor se fundiram em um mar de desprezo. Marcos deu um passo à frente, sua voz um silvo venenoso. "Anda, aberração. Diz que sente muito. Você está sempre causando problemas, não é? A coitadinha da garota muda que não consegue se cuidar, sempre estragando tudo para todo mundo."
Meu corpo tremeu com uma raiva tão feroz que me consumiu. Mas então a voz de Josias a cortou, fria e insensível. "Graça. Peça desculpas. Agora." Ele se levantou, Alessandra ainda agarrada a ele, e deu um passo em minha direção. Seus olhos, antes meu porto seguro, agora eram um inimigo.
Ele me alcançou, sua mão agarrando meu ombro. Seus dedos cravaram na minha carne, me empurrando para frente. Minhas pernas fraquejaram. Eu caí, meus joelhos batendo no chão áspero com um estalo agudo. Eu estava ajoelhada diante de Alessandra, um espetáculo público de humilhação.
Os alunos ao nosso redor pegaram seus celulares, os flashes das câmeras disparando, capturando minha degradação. Eles estavam documentando minha execução pública.
A voz de Josias, fria e clara, ordenou: "Diga, Graça."