O zumbido do motor do táxi era o único som que acompanhava as batidas rápidas do meu coração. Eu estava fora. Livre. Mas a liberdade parecia fria, afiada e aterrorizante. O apartamento de Hugo, um espaço elegante e moderno com vista para a cidade, era um refúgio bem-vindo. Ele me encontrou na porta, seu rosto marcado pela preocupação, seus braços fortes me puxando para um abraço reconfortante.
"Elisa, o que aconteceu?", ele sussurrou, sua voz gentil. Ele viu o hematoma florescendo no meu braço, o cansaço em meus olhos.
"Tudo", engasguei, a represa finalmente se rompendo. Contei a ele tudo, desde o pedido de aniversário até o estúdio secreto, o vídeo, a agressão de Heitor e o teatro de Dália. Ele ouviu pacientemente, sua mandíbula tensa, seus olhos cheios de uma fúria silenciosa.
"Ele não vai se safar dessa, Elisa", disse Hugo, sua voz firme. "Eu te prometo." Ele era mais do que um amigo; ele era minha âncora. Ele representava estabilidade, respeito e um cuidado genuíno que contrastava fortemente com o mundo volátil de Heitor.
Na manhã seguinte, após um sono agitado e assombrado por sonhos, encontrei consolo no quarto de hóspedes de Hugo. Meu telefone, que eu havia carregado durante a noite, vibrava com notificações. Chamadas perdidas de Heitor, dezenas de mensagens. Todas ignoradas. O mundo ainda estava se recuperando do meu post anônimo no blog de fofocas. A seção de comentários era uma zona de guerra, uma mistura de indignação e especulação. A imagem cuidadosamente construída de Heitor estava começando a rachar.
Hugo entrou, uma bandeja com café e torradas nas mãos. "Bom dia, flor do dia", ele disse, tentando ser leve. "Ainda seguindo em frente?"
Encontrei seu olhar, minha decisão inabalável. "Mais do que nunca."
Ele assentiu, colocando a bandeja na mesa. "Ótimo. Porque eu já redigi os papéis iniciais do divórcio. E", ele fez uma pausa, sua expressão endurecendo, "incluí uma seção por má conduta conjugal, com base nas evidências que você coletou. Isso vai atingi-lo com força."
Uma satisfação sombria se instalou em mim. Ele merecia. Cada momento agonizante disso.
Mais tarde naquela tarde, uma mensagem chegou. Não de Heitor, mas de Dália. Meu sangue gelou imaginando o que sua mente distorcida poderia inventar. "Elisa, podemos conversar? Por favor. Preciso explicar."
Olhei para a mensagem, uma risada amarga escapando dos meus lábios. Explicar? Depois de tudo? Digitei uma resposta rápida e desdenhosa: "Não há nada a explicar, Dália. Você fez suas escolhas. Agora viva com elas."
A resposta dela veio imediatamente. "Heitor está arrasado. Ele está culpando você por tudo. Você não quer piorar as coisas, quer?"
Meu coração martelou. Ela estava tentando me manipular. Tentando virar Heitor ainda mais contra mim. "As coisas não poderiam piorar, Dália", digitei de volta, "Elas estão apenas se tornando reais."
Então outra mensagem, desta vez de Heitor: "Elisa, onde você está? Precisamos conversar. Isso é uma loucura. Você vai nos destruir. Por favor, apenas me ligue." Suas mensagens eram uma mistura de raiva, confusão e um estranho pânico subjacente. Ele não entendia. Ele achava que ainda podia controlar a narrativa, me controlar.
Eu o bloqueei. E a Dália. Eu precisava respirar, pensar, sem a influência tóxica deles envenenando minha mente.
Os dias se transformaram em uma semana. Minha vida parecia um sonho surreal. Eu estava morando com Hugo, trabalhando remotamente em projetos de arquitetura que havia deixado de lado há muito tempo, lentamente me recompondo. As engrenagens legais estavam em movimento. Os advogados de Heitor já estavam recuando, negando tudo, ameaçando processos judiciais. Estava feio, assim como Hugo previu.
Então, uma nova mensagem apareceu no meu telefone. Uma mensagem anônima novamente. "Assista a isso. É para você." Meu estômago se contraiu. Cliquei no link.
Era uma compilação de vídeos. Uma montagem de clipes publicamente disponíveis de Heitor, de entrevistas e aberturas de galerias. Cada um o apresentava falando sobre mim, sua "musa", seu "único e verdadeiro amor". E intercaladas entre esses clipes, brutalmente editadas, estavam as fotos explícitas de Dália de seu projeto secreto. O vídeo terminava com um close do rosto de Dália, um sorriso triunfante, quase predatório. E um único e arrepiante cartão de título: "O Projeto Dália: Exposto."
Minhas mãos tremiam tanto que quase deixei o telefone cair. Isso não era apenas uma traição. Era uma execução pública de cada memória amorosa minha. Meu coração se contorceu, uma nova onda de náusea me atingindo. Era tão vil, tão nojento. Apenas Dália poderia orquestrar algo tão cruel, tão calculado. Ela não estava apenas tentando me substituir; ela estava tentando me apagar.
Eu queria gritar. Eu queria quebrar alguma coisa. Mas, em vez disso, uma calma fria e assustadora se instalou sobre mim. Isso não era mais apenas sobre meu coração partido. Isso era uma guerra. E eu acabara de receber toda a munição de que precisava.
Meu telefone tocou. Era Heitor. Atendi imediatamente.
"Elisa! Você viu isso? O vídeo? Está em toda parte! Que diabos está acontecendo?" Sua voz era um grito frenético e desesperado.
"Ah, agora você está interessado, Heitor?", eu disse, minha voz perigosamente suave. "Agora que sua preciosa imagem pública está em frangalhos? Agora que sua 'integridade artística' está sendo questionada?"
"Não! Não a minha! A sua! Estão dizendo que você vazou meu trabalho pessoal! Estão te chamando de mulher desprezada, de ex vingativa! Isso está destruindo tudo!" Ele estava gaguejando, mal coerente. "E a Dália! Ela está recebendo ameaças de morte! Você tem que tirar isso do ar, Elisa! Você tem que explicar! Foi longe demais!"
"Tirar o quê do ar?", perguntei, fingindo inocência. "Eu não fiz aquele vídeo, Heitor. Mas fico feliz que alguém tenha feito. A verdade tem um jeito de aparecer, não é?"
"Você é um monstro, Elisa! Um monstro vingativo e cruel!", ele rugiu. "Como você pôde fazer isso com a Dália? Comigo? Depois de tudo o que tivemos?"
"Tudo o que tivemos foi uma mentira, Heitor", eu disse, minha voz endurecendo. "Uma mentira linda e requintada que você construiu cuidadosamente. E agora está desmoronando. Ótimo."
Ele desligou. Silêncio. Mas desta vez, parecia diferente. Não vazio. Mas grávido de consequências. Eu havia dado um passo, um passo ousado e perigoso, em território desconhecido.
Meu telefone vibrou novamente, desta vez com uma mensagem de Hugo. "O vídeo saiu. É brutal. Você sabe quem fez isso?"
"Tenho uma suspeita muito forte", digitei de volta. "E não sou eu. Mas quem quer que tenha sido, acabou de nos dar a vantagem de que precisávamos."
Eu sorri, um sorriso frio e duro que não alcançou meus olhos. A guerra tinha acabado de começar, e pela primeira vez em muito tempo, senti um lampejo de poder. Um poder perigoso e emocionante.
Uma nova notificação de e-mail apareceu, de Hugo. "Redigindo a petição oficial de divórcio. Vou protocolar amanhã de manhã. Pronta para isso, Elisa?"
Meus dedos pairaram sobre o teclado. *Pronta nem começa a descrever.* Pensei. Digitei de volta uma única palavra. "Pronta."
O telefone tocou novamente. Era Heitor. Ignorei. Ele podia ligar o quanto quisesse. Era tarde demais para desculpas, tarde demais para explicações. O tempo de conversar acabou. Agora, era hora de agir.