Servida com Restos pelo Meu Marido Cruel
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Capítulo 2

Meu estômago se contraiu, ameaçando se rebelar. Forcei a última mordida goela abaixo, a textura como cinzas na minha boca. Minha garganta ardia. Lutei contra a vontade de vomitar, lutei com cada fibra do meu ser.

Esse era o jogo. E eu tinha que vencer.

Consegui esboçar um sorriso fraco e grato para Breno. Uma performance perfeita de subserviência. Meus olhos, no entanto, mantinham uma resolução fria e inabalável que ele não conseguia ver.

Karina oscilou levemente, a mão voando para a boca. Seus olhos, arregalados e horrorizados, alternavam entre Breno e eu. Ela parecia que ia passar mal. A ironia não me escapou.

Lembrei-me de um tempo em que eu não suportava um grão de poeira nas minhas roupas, uma mancha nos meus talheres. Minha antiga eu, aquela que organizava meticulosamente seu império farmacêutico, que exigia perfeição em cada faceta de sua vida. Aquela Clarice teria rido da ideia de comer do lixo. Ela teria demitido Breno, e depois seu chefe de gabinete, só por sugerir isso.

Meu pai estava tão orgulhoso de mim naquele dia, o dia em que anunciei meu divórcio de Breno. Ele viu o fogo nos meus olhos, o aço na minha espinha. Ele sabia que eu não toleraria infidelidade, nem em um parceiro, nem nos negócios. Ele aplaudiu minha força.

Essa força, no entanto, foi rapidamente usada contra mim.

O que eu não sabia era que Breno e Karina já haviam conspirado. Enquanto eu focava em reconstruir minha vida, eles envenenavam a medicação cardíaca do meu pai, assistindo-o desaparecer lentamente, e depois celebrando sua morte "acidental". Minha suspeita, meu luto, minha fúria – tudo foi distorcido como sintomas de instabilidade.

Eles atacaram rápido.

Semanas após a morte do meu pai, Breno, tendo garantido sua posição através da minha curatela, tomou o controle do Grupo Mendes. O legado da família, construído por gerações, agora era deles. Seus nomes estavam estampados em todas as manchetes, em cada conquista. Enquanto eu estava trancada, sedada, rotulada como "mentalmente instável".

Minha fúria, uma brasa crua e ardente, explodiu uma vez. Eu confrontei Breno, gritando, acusando-o do assassinato do meu pai. Tentei até empurrá-lo, uma tentativa desesperada e desajeitada de retribuição. Foi toda a prova de que precisavam. O "surto". O "perigo". O prego final no meu caixão.

Eles usaram meu amor pelo meu filho, Léo, contra mim.

- Você é um perigo para ele, Clarice. Você não está bem.

A Dra. Alice, a psiquiatra gentil e astuta que trouxeram, foi rapidamente influenciada pelas mentiras encantadoras de Breno e pela performance chorosa de Karina. Fui institucionalizada.

Por meses, eles viveram no luxo, banhando-se em sua glória roubada, em sua fortuna roubada. Eles achavam que tinham vencido. Mas não tinham visto o fogo nos meus olhos de fantasma.

Um gemido suave me trouxe de volta.

Léo. Ele estava chorando no berçário.

Meu coração apertou. Caminhei até lá, minhas pernas pesadas, cada passo um esforço consciente. Peguei-o no colo, aninhando seu corpo pequeno e quente contra meu peito. O choro dele suavizou para um gorgolejo. Ele se aconchegou em mim, seu peso inocente um bálsamo, uma razão.

Karina estava na porta, nos observando. Havia algo não dito em seu olhar, algo quase suplicante. Ela abriu a boca, depois fechou novamente.

Evitei os olhos dela, virando-me, carregando Léo para dentro do quarto. Ouvi-a suspirar, um som suave e derrotado.

Uma fresta de luz sob a porta. Era Breno. Ele tinha seguido Karina. Ele estava zombando dela, eu sabia.

- Não se preocupe, Karina. - A voz dele era baixa, debochada. - Ela vai limpar. Ela sempre limpa. - Ele entregou a ela um frasco de limpador industrial. - Aqui. Você parece precisar disso.

Karina pegou o frasco, os dedos tremendo. Ela não olhou para mim, mas seus olhos continham um novo tipo de medo.

- Obrigada - ela sussurrou, a voz quase inaudível.

O olhar de Breno demorou em mim, um comando silencioso. Eu entendi. A limpeza. O ritual. A penitência por ousar existir.

Fechei a porta do berçário suavemente. Léo dormia pacificamente agora. Meu pequeno guerreiro.

Caminhei até o banheiro, o cheiro forte e químico do limpador já preenchendo o ar. Minhas mãos ainda estavam em carne viva da esfregada forçada de ontem. Minha pele descascava, pequenos cortes cruzando as palmas.

Derramei o líquido agressivo no chão, os vapores ardendo no meu nariz, nos meus olhos. Ajoelhei-me, empurrando minhas mãos nuas na solução cáustica.

A dor foi imediata, abrasadora.

Minha pele gritou. Mordi o lábio para conter um grito, um gemido. Eu não daria a eles a satisfação. A mordida ácida corroía minha carne, cada esfregada uma punição pela minha própria existência. Minhas mãos eram uma confusão de carne viva e sangue.

- Já chega, Clarice. - A voz de Breno, desprovida de emoção, quebrou o silêncio. - Você terminou.

Levantei-me, meu corpo rígido, minhas mãos latejando. Vesti rapidamente uma camisa limpa e larga, meus movimentos desajeitados. Minhas mãos ardiam como se estivessem no fogo. Breno estava me esperando.

- Clarice, você está horrível - disse ele, a voz carregada de uma preocupação fingida. - Talvez você devesse tentar ser menos... dramática. Isso só torna as coisas mais difíceis para você. - Ele fez uma pausa, um brilho predatório nos olhos. - Sabe, se você apenas obedecer, nada disso precisa acontecer.

Obedecer. A palavra pairou no ar, pesada com ameaças não ditas. Obedecer, e talvez eu não voltasse para a clínica. Obedecer, e talvez eu pudesse ver meu filho.

Lembrei-me de Breno. O homem que me arrebatou, seu carisma uma luz cegante. Ele era o talento jovem, ambicioso e brilhante que contratei, aquele que viu minha visão, que entendeu minha garra. Ele jurou que amava minha ambição, jurou que sempre seria minha rocha, meu parceiro.

- Para sempre, Clarice. Com você, é sempre para sempre.

As palavras dele agora pareciam uma piada cruel.

Breno se mexeu impacientemente.

- Clarice, você está me ouvindo?

Assenti, forçando um sorriso vazio.

- Claro, Breno. Eu entendo. - Tentei passar por ele, em direção ao berçário, impulsionada por uma necessidade instintiva de verificar Léo.

Mas Breno bloqueou meu caminho, a mão no meu braço. O aperto era surpreendentemente gentil, mas firme.

- O que aconteceu com você, Clarice? - A voz dele era baixa, quase um sussurro. - Você costumava ser tão vibrante. - Ele parecia genuinamente perplexo, talvez até magoado.

Meu coração parecia uma coisa murcha dentro do peito.

O que aconteceu comigo? Você aconteceu, Breno. Você e sua bruxa conspiradora. Vocês me quebraram, pedaço por pedaço agonizante. Vocês me fizeram assistir meu pai morrer, roubaram minha empresa e me marcaram como louca. Vocês me fizeram passar pelo inferno, me despiram da minha dignidade, e agora você me pergunta o que aconteceu?

Lembrei-me do dia do nosso casamento. O sol brilhando no oceano, o cheiro de rosas frescas, a mão dele na minha. Seus votos, sussurrados no meu ouvido: "Prometo te amar, te honrar, ficar ao seu lado, sempre."

E eu acreditei nele. Tão completamente.

O rosto de Breno estava perto agora, os olhos procurando os meus.

- Sinto falta da velha Clarice - ele murmurou. - Aquela que tinha luz. - Ele se inclinou, como se fosse me beijar.

Recuei, meu corpo reagindo instintivamente. Os lábios dele roçaram minha bochecha, frios e insensíveis.

- Por que você me afasta, Clarice? - A voz dele estava carregada de algo que quase confundi com dor. - Você não se lembra de nós?

Eu me lembrava de tudo. Cada mentira, cada traição, cada movimento calculado.

E eu me lembrava da verdadeira Clarice. Aquela que eles achavam que tinham enterrado. Ela ainda estava aqui. Observando. Esperando.

E ela ia queimar o mundo deles até o chão.

            
            

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