Retorno da Cova: Resgatando Meu Coração Traído
img img Retorno da Cova: Resgatando Meu Coração Traído img Capítulo 1
1
Capítulo 5 img
Capítulo 6 img
Capítulo 7 img
Capítulo 8 img
Capítulo 9 img
Capítulo 10 img
img
  /  1
img
img

Retorno da Cova: Resgatando Meu Coração Traído

Gavin
img img

Capítulo 1

Voltei para São Paulo depois de três anos, não para buscar perdão, mas para morrer.

Minha família, que me culpava pela morte da minha mãe, me expulsou. Eles me substituíram por uma órfã quieta e grata chamada Gabriela. Ela roubou o amor do meu pai, o carinho do meu irmão e meu namorado de infância, Caio.

Agora, com uma doença terminal, meu único desejo era recuperar o vestido de noiva da minha mãe. Uma última parte dela para me agarrar. Mas Gabriela ia usá-lo para se casar com Caio.

Quando a confrontei, ela destruiu o medalhão da minha mãe e me amaldiçoou, desejando que eu caísse morta. Cega de fúria, eu lhe dei um tapa. Ela gritou, esfaqueou o próprio braço e me incriminou pelo ataque.

Enquanto minha família e Caio me olhavam com nojo, me chamando de maníaca, meu corpo cedeu. Eu desabei, tossindo sangue, minha doença secreta revelada da maneira mais brutal possível.

"Vocês sempre me culpam", eu disse com dificuldade, as palavras borbulhando com sangue. "Mas eu só estava... morrendo."

Seus rostos se encheram de um horror crescente, mas era tarde demais. Eu já tinha partido.

Até que abri os olhos novamente, e minha mãe, que esteve me esperando o tempo todo, pegou minha mão. "Nós vamos renascer", ela prometeu, seus olhos ardendo de fúria contra a família que me destruiu. "Juntas. Como mãe e filha, de novo."

Capítulo 1

Meu retorno a São Paulo não foi anunciado com festa ou mesmo com boas-vindas cautelosas. Foi marcado pelas manchetes cruéis que me seguiram por três anos, um fantasma em todos os grandes jornais: "A Ovelha Negra dos Alencar Retorna: Bianca Poole, a Famosa Maníaca de São Paulo, de Volta à Terra Natal."

Os artigos se apressaram em lembrar a todos do meu passado. Eles me pintaram como uma força destrutiva, uma rebelde imprudente que despedaçou sua influente família. Eu sabia que a maioria das pessoas ficou aliviada quando parti. Respiraram fundo, como se uma tempestade finalmente tivesse passado. Eles viram o caos, os escândalos, as prisões, e me julgaram.

Eu já fui uma figura constante nas colunas sociais deles. Uma jovem bailarina promissora, uma herdeira dos Alencar. Depois, me tornei um tipo diferente de celebridade: aquela cujos surtos eram públicos, cuja dor era usada como arma contra ela, cuja sanidade estava sempre em questão. Agora, após anos de silêncio, o zumbido familiar do escrutínio público começava a soar novamente. Minha reaparição era uma ferida fresca, um novo escândalo esperando para acontecer.

Mas eu não estava aqui por eles. Não estava aqui para reconciliação, ou mesmo vingança. Eu estava aqui por um túmulo. Um lugar de descanso final, bem ao lado da única pessoa que já me amou de verdade.

Minha primeira parada não foi a imponente mansão da família ou as ruas movimentadas do centro. Foi o verde silencioso e sereno do Cemitério do Morumbi. O ar aqui era sempre diferente, sussurrante e respeitoso. Um contraste gritante com o barulho da cidade e o ruído dentro da minha própria cabeça. Meus pés conheciam o caminho de cor, me guiando por fileiras de mármore polido e pedra gasta até que eu o alcancei. O túmulo da minha mãe.

"Oi, mãe", sussurrei. As palavras ficaram presas na minha garganta, com gosto de cinzas. A pedra estava fria sob meus dedos. Parecia que o mundo tinha acabado ontem, e ainda assim, uma vida inteira de dor se desenrolou desde então.

Uma sombra caiu sobre mim. Eu não precisei me virar para saber quem era. O cheiro de perfume caro, a postura rígida, o silêncio que falava volumes de desaprovação. Bruno. Meu irmão mais velho.

"Bianca", sua voz era seca, sem calor, como uma camisa perfeitamente passada sem um corpo dentro. "O que você está fazendo aqui?"

Eu não respondi imediatamente. Meus dedos traçaram o nome gravado. Eleonora Poole Alencar. O nome que eu carregava, mas o amor que perdi. O que eu estava fazendo aqui? Eu estava morrendo. Lenta, dolorosamente, de dentro para fora. Câncer de estômago terminal. Um segredo que eu carregava, mais pesado que qualquer uma das acusações lançadas contra mim.

Eu tossi, um som seco e áspero que vibrou no meu peito. Senti uma pontada familiar no abdômen, uma dor surda que parecia zombar de cada movimento meu. Era uma companhia constante e indesejada, um lembrete do relógio correndo dentro de mim.

"Só visitando", eu finalmente disse, minha voz rouca, tentando uma leveza que eu não sentia. Era um velho hábito, desviar com sarcasmo, um mecanismo de defesa aprimorado ao longo de anos de guerra emocional. "Sabe, a reunião de família de sempre. Edição lápide."

Ele permaneceu imóvel, uma estátua de julgamento. Esse era o Bruno. Sempre julgando, sempre desaprovando. Lembro-me de uma época em que seu olhar continha admiração, quando ele era meu protetor, meu confidente. Isso foi antes da mamãe morrer. Antes que o amor em seus olhos se transformasse em gelo, substituído por um ressentimento frio e duro que parecia me culpar por tudo. Fazia anos que eu não via nem um vislumbre do irmão que um dia conheci.

"Você não volta há três anos", ele afirmou, não uma pergunta, mas uma acusação. "E agora, de repente, decide nos agraciar com sua presença?"

Eu queria gritar, atacar, dizer a ele o porquê. Rasgar minha camisa e mostrar as cicatrizes, os hematomas desbotados das cirurgias, a magreza sob minhas roupas. Esfregar meus prontuários médicos na cara dele, fazê-lo ver a verdade. Mas qual era o sentido? Ele não se importaria. Ninguém nunca se importou.

"Eu decidi", respondi, dando de ombros, tentando parecer indiferente. Mas minhas mãos tremiam levemente, um sinal revelador da tempestade que se agitava dentro de mim. Meu corpo, antes um recipiente de graça e movimento, era agora uma jaula de dor e fraqueza.

"Quando você chegou?", ele pressionou, seus olhos examinando meu rosto, como se procurasse por algo, talvez um sinal da "maníaca" que ele acreditava que eu era.

Notei o pequeno medalhão de prata manchado em sua mão. O medalhão da mamãe. Aquele com uma pequena bailarina gravada na frente, um presente que ela me deu no meu quinto aniversário. Meu coração se apertou, uma dor familiar. Ele não deveria tê-lo. Era meu.

"Ontem", murmurei, meu olhar fixo no medalhão. "Bem a tempo do aniversário, certo? Tenho certeza que todos vocês tiveram uma bela reunião. Sem mim, é claro."

Seu maxilar se contraiu. "Tivemos. E você não estava lá. De novo."

"Por que eu estaria?", retruquei, uma risada amarga escapando dos meus lábios. "Para ser culpada? Para ser lembrada de como eu arruinei tudo?"

"Você ainda guarda esse ressentimento, não é?", a voz de Bruno estava carregada de um cansaço que quase soava como pena, mas eu sabia que não era. Era apenas outra forma de acusação.

Ressentimento? Não. Não mais. Não por eles, de qualquer maneira. Eu estava cansada demais para isso. Perto demais do fim para desperdiçar meus preciosos suspiros restantes com raiva. O único ressentimento que eu guardava era pela mão cruel que o destino me deu, pela doença que estava roubando meu tempo restante. Mas eu não podia dizer isso a ele.

A verdade era que eu não comparecia às reuniões deles porque o ar em nossa casa de família me sufocava. O silêncio, as acusações não ditas, os fantasmas do que um dia fomos. Era demais. A picada amarga da rejeição deles, sua fria indiferença, havia cauterizado meu coração há muito tempo.

No meu oitavo aniversário, tudo que eu queria era o bolo perfeito - um bolo de morango com cobertura extra. Mamãe, com seu amor e paciência infinitos, prometeu buscá-lo, mesmo que isso significasse atravessar a cidade sob uma chuva repentina. Ela nunca mais voltou. Um motorista bêbado. Uma carcaça de metal retorcido. E meu mundo, meu tudo, se estilhaçou em um milhão de pedaços.

Meu pai, Fernando, um homem cuja dor se transformou em uma fúria fria e dura, olhou para mim como se eu tivesse pessoalmente arrancado seu coração. Bruno, meu irmão mais velho, seus olhos espelhando os do nosso pai, não viu uma criança de coração partido, mas a causa. O desejo inocente por um bolo de aniversário, torcido em uma exigência monstruosa que levou à morte dela. Eles nunca disseram em voz alta, não diretamente, mas seus olhos, seu silêncio, sua retirada absoluta de afeto, gritavam isso. Eu tinha oito anos e havia matado minha mãe.

Eles pararam de me amar então. Eu senti isso, profundamente, como uma amputação física. E então, um ano depois, veio Gabriela. Uma garota que mamãe apadrinhava, de origem humilde. Depois que mamãe morreu, eles a adotaram. Ela era tudo que eu não era: quieta, obediente, grata. Eles a cobriram com a bondade que um dia me deram, a bondade que eu agora desejava como oxigênio.

Eu assisti, uma observadora silenciosa, enquanto ela deslizava sem esforço para o meu lugar. Meu quarto, minhas roupas, os olhares de aprovação do meu pai, os sorrisos gentis de Bruno. Eu lutei, das únicas maneiras que uma criança ferida e negligenciada sabia. Eu me rebelei. Quebrei regras. Gritei por atenção, por uma migalha do amor que eles davam tão livremente a Gabriela. Eles me chamaram de "difícil", "indisciplinada", "louca".

Bruno zombou, me puxando de volta para o presente. "Você certamente mudou. Menos... teatral." Ele me olhou, um brilho de algo indecifrável em seus olhos.

Eu tinha mudado. A garota que antes ansiava pela validação deles, que fazia birras e quebrava coisas apenas para ser vista, se foi. A doença me despojou dessa necessidade desesperada, deixando para trás uma casca oca, calma em sua rendição. Não havia espaço para o amor deles, ou o ódio deles, diante do que estava por vir. Eu estava além de me importar com a aprovação deles. O amor deles havia sido retirado de forma tão completa, tão brutal, que meu coração simplesmente aprendeu a bater sem ele.

"É, bem", eu disse, uma risada seca presa na garganta, "três anos no exílio tendem a fazer isso."

Ele se mexeu, um toque de constrangimento em sua postura. "Papai quer que você volte para casa. Só... por um tempo."

Casa. A palavra tinha gosto de veneno. Minha casa era um campo de batalha, um lugar onde cada canto guardava uma memória de traição, de um amor perdido e uma vida roubada.

A mídia, é claro, adorou. "Bianca Poole: A Herdeira Louca", "A Filha Escandalosa", "A Maníaca de São Paulo". Eles se deleitavam com cada acusação que Gabriela fabricava, cada fofoca, cada incidente encenado.

Lembrei-me do pior, três anos atrás. Gabriela, com seus olhos inocentes e coração venenoso, fingiu um sequestro por uma gangue local. Ela apontou um dedo trêmulo para mim, alegando que eu havia orquestrado tudo, movida pelo ciúme. Meu namorado de infância, Caio Dodson, que um dia fora meu defensor mais feroz, ficou ao lado dela, seus olhos duros de acusação. Ele havia acreditado nas mentiras dela, assim como todo mundo. Foi ele quem quebrou minha perna, uma fratura brutal que encerrou minha carreira de balé, uma carreira que minha mãe havia nutrido com tanto cuidado. "Você é um monstro, Bianca", ele rosnou, seu rosto contorcido de nojo ao ver o terror fingido de Gabriela.

Meu pai, Fernando, acreditou em todos eles. Ele me internou em um hospital psiquiátrico, assinando os papéis sem um olhar, seu rosto uma máscara de desdém frio. "Você está doente, Bianca", ele disse, sua voz seca. "Você precisa de ajuda."

Quando finalmente saí, uma casca do que eu era, eles se foram. Todos eles. Eles me deserdaram, me cortaram completamente. Não havia casa para voltar, nenhuma família para salvar. Deixei São Paulo, não por escolha, mas porque simplesmente não havia outro lugar para ir. Eu não tinha ninguém. Estava totalmente sozinha.

"Casa?", repeti, a palavra um eco amargo. "Que casa, Bruno? Eu deixei de ter uma há muito tempo." Minha voz falhou na última palavra, uma ponta de emoção crua que eu não pretendia revelar. Meu peito se apertou e senti uma onda de náusea. Isso era demais. Tudo isso. As memórias, a dor, a fria indiferença.

Eu precisava sair. Agora. Antes que eu desmoronasse completamente. Antes que eles vissem a real extensão do dano, as rachaduras na minha fachada cuidadosamente construída. Dei um passo para trás, meu olhar endurecendo, me afastando da beira do colapso emocional. Eu não lhes daria essa satisfação.

"Eu tenho que ir", eu disse, minha voz mal passando de um sussurro, meus olhos piscando para os contornos borrados da cidade, qualquer coisa menos o rosto dele. Eu podia sentir a pressão familiar se acumulando atrás dos meus olhos, a ardência de lágrimas não derramadas. Eu não choraria. Não aqui. Não na frente dele. Nunca mais.

Bruno me observou, sua expressão indecifrável, e por um momento fugaz, pensei ter visto um brilho de algo que se assemelhava a... arrependimento? Mas desapareceu tão rápido quanto apareceu, substituído pela frieza familiar. Ele não disse nada. Ele simplesmente me deixou ir.

Era isso. O começo do fim. E eu tinha que enfrentar, assim como enfrentei tudo o mais - sozinha.

            
            

COPYRIGHT(©) 2022