Retorno da Cova: Resgatando Meu Coração Traído
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Capítulo 3

Bianca Poole POV:

O e-mail de confirmação do jazigo da mamãe chegou, uma pequena vitória em uma batalha perdida. O custo era exorbitante, muito mais do que eu tinha em minhas economias minguantes, mesmo depois de vender os poucos objetos de valor que me restavam. Isso solidificou a necessidade desesperada do meu fundo fiduciário, dos últimos resquícios do patrimônio da minha mãe. E daquele maldito vestido.

Respirei fundo e trêmula, o gosto metálico de medo e doença cobrindo minha língua. Eu tinha que enfrentar Gabriela. Tinha que pegar o vestido de volta, de um jeito ou de outro. Era mais do que apenas tecido; era um símbolo, o último fio que me conectava ao mundo, à minha mãe, antes que eu desaparecesse.

Enquanto eu me dirigia para a opulenta sala de estar, onde Gabriela costumava reinar, uma figura bloqueou meu caminho. Caio. Seu rosto estava tenso, seus olhos sombrios, um cansaço desconhecido agarrado a ele como uma segunda pele. Ele parecia... assombrado.

"Bianca", ele disse, sua voz áspera, um contraste gritante com o tom descontraído que eu lembrava da nossa infância. "Por que você voltou?"

Eu não respondi. Meu olhar caiu para a mão dele, depois para a perna dele. Aquela que, todos aqueles anos atrás, desferiu o golpe que estilhaçou minha patela, acabando com meus sonhos. A memória era uma cicatriz fresca, latejando sob minha pele.

Minha mente repetiu a cena como um disco quebrado: o rosto manchado de lágrimas de Gabriela, suas acusações sussurradas sobre o falso sequestro, seu dedo trêmulo apontando para mim. Caio, seu rosto contorcido de fúria, seus olhos ardendo com um ódio do qual eu nunca o julguei capaz. Ele não apenas acreditou nela; ele agiu com base nas mentiras dela. Ele me chutou, me quebrou, tudo por ela. Minha promissora carreira como bailarina, a única coisa que me trouxe alegria e propósito após a morte da mamãe, terminou em um estalo doentio de osso e cartilagem. Lembro-me da dor surda, depois da dor lancinante, e então da dormência horrível enquanto o médico explicava o dano irreparável. Minha vida, meu futuro, se foram. Simples assim.

E eu não senti nada então. Não de verdade. Apenas uma observação estranha e distante da agonia física, como se estivesse acontecendo com outra pessoa. A dor emocional já era grande demais, avassaladora demais, para registrar outro golpe.

Ele viu meu olhar, seguindo-o até sua perna, até o fantasma da violência que ele infligiu. Um lampejo de algo, culpa talvez, cruzou seu rosto. Ele recuou, puxando a perna ligeiramente para trás.

"Eu... eu não deveria ter", ele começou, sua voz mal um sussurro, seu olhar fixo no chão. "Eu estava com tanta raiva. Gabriela... ela estava com tanto medo. Ela disse que você torceu o tornozelo dela tentando empurrá-la para dentro do carro. Eu só... eu reagi." Ele estendeu a mão, sua mão pairando incerta. "Bianca, eu sinto muito. Juro, eu nunca quis... quebrar sua perna. Eu pensei que você era perigosa. Pensei que estava tentando machucá-la."

Eu recuei de seu toque, uma reação visceral. Desculpe? Depois de todo esse tempo? Depois de destruir minha vida? A palavra parecia barata, sem sentido. "Não", eu disse, minha voz quase inaudível. "Não finja que se importa agora."

Ele visivelmente murchou, seus ombros caindo. "Eu me importo, Bianca. Sempre me importei. Você só... você ficou tão diferente depois que a Eleonora morreu. Tão zangada. Tão fora de controle."

Eu contive uma risada amarga. Zangada? Fora de controle? Essa era a narrativa deles, a desculpa conveniente para me abandonar. Eu era uma criança que teve seu mundo despedaçado, e tudo que eu queria era que alguém me visse, me amasse. O amor deles dependia da minha conformidade, do meu sofrimento silencioso. Quando ousei exigir atenção, eles me rotularam de louca.

"Não importa", eu disse, virando-me, o cansaço se instalando profundamente em meus ossos. Eu não queria suas desculpas. Não queria sua culpa. Eu simplesmente queria completar minha missão final.

"Onde você esteve, Bianca?", ele perguntou, sua voz mais suave agora, quase suplicante. "Por três anos, você simplesmente desapareceu."

"Por aí", respondi vagamente, a única palavra um muro entre nós. O que eu deveria dizer a ele? Que passei o último ano entrando e saindo de clínicas, passando por tratamentos brutais que me deixaram fraca e enjoada? Que estive lutando contra os demônios da depressão, os ecos de suas acusações, o aperto frio de uma doença terminal?

Minha saúde mental foi uma corda bamba por anos, uma luta constante contra a escuridão que ameaçava me consumir. Pós-trauma, pós-abandono, pós-diagnosticada com depressão severa. E então o câncer. Uma invasão lenta e agonizante que começou sutilmente, depois rugiu para a vida. Os médicos foram claros: 'Estágio IV. Agressivo. Prognóstico... sombrio. Coloque seus assuntos em ordem. Encontre apoio, Bianca. Você precisa da sua família.'

Família. A ironia era um gosto amargo na minha boca. Minha família foi a arquiteta do meu sofrimento, aqueles que me levaram ao limite. Eles eram as últimas pessoas a quem eu recorreria em busca de conforto. E além disso, qual era o sentido? O resultado era inevitável. Eu estava morrendo. Eles provavelmente nem se importariam. O pensamento trouxe apenas uma dor surda, não a dor lancinante que um dia traria. Eu estava entorpecida à indiferença deles agora.

Caio abriu a boca para falar novamente, mas uma voz aguda e açucarada o interrompeu.

"Caio, querido! Aí está você!" Gabriela. Ela emergiu da sala de estar, uma visão em branco, um delicado robe de seda agarrado à sua figura esguia. Seus olhos, no entanto, não eram delicados. Eram afiados, calculistas, estreitando-se imperceptivelmente quando me viu com Caio.

Ela deslizou em direção a ele, possessivamente passando o braço pelo dele, seus olhos fixos em mim com uma hostilidade mal disfarçada. "O que você está fazendo, querido? O pessoal do buffet está aqui. Você sabe como eu fico estressada." Ela fez uma pausa, seu olhar percorrendo-me, um sorriso de escárnio brincando em seus lábios. "Ah, Bianca. Ainda aqui? Pensei que você já tivesse feito estrago suficiente por um dia."

Eu encontrei seu olhar, sem piscar. "Não estou aqui para causar estragos, Gabriela. Estou aqui pelo que é meu."

Seus olhos se arregalaram, uma exibição teatral de inocência. "O que é seu? Querida, tudo aqui é nosso agora." Ela apertou o aperto no braço de Caio. "A menos que você queira dizer o último resquício da sua reputação? Porque eu te garanto, isso já se foi há muito tempo." Sua voz pingava condescendência. "Pensando em causar problemas de novo, é? Tentando recuperar sua posição? É patético, Bianca. Ninguém te quer aqui."

Senti um leve sorriso tocar meus lábios. Ela realmente não entendia. Ela pensava que eu ainda estava lutando pelo reino patético deles. Minha vida era curta demais para tais trivialidades. O câncer me purgou de todas aquelas necessidades desesperadas e infantis. Eu não me importava mais com o amor deles, a aprovação deles, sua posição social. Tudo que eu queria era paz. E o vestido da minha mãe.

"Eu não quero o amor deles, Gabriela", eu disse, minha voz suave, mas firme. "Eu parei de querer isso há muito tempo. O que eu quero é o vestido de noiva da minha mãe. O feito sob medida. Onde está?"

Suas sobrancelhas perfeitamente esculpidas se ergueram em surpresa, um lampejo de choque genuíno em seus olhos. Ela não esperava isso. Ela esperava uma briga por Caio, pela família, pelo dinheiro. Não pelo vestido.

Então, uma risada desdenhosa irrompeu dela. "O vestido? Ah, Bianca, querida. Esse é o meu vestido de noiva agora. Fernando e Bruno me deram. Eles disseram que era um símbolo do meu lugar nesta família. Um símbolo do quanto eles me amam." Ela levantou a mão esquerda, o anel de noivado brilhando. "E combina perfeitamente com o anel do Caio, não acha?"

Minha respiração engasgou. O anel. O anel de Caio. Aquele que ele me deu, anos atrás, uma simples aliança de prata com uma pequena safira. Já se fora há muito tempo, é claro, descartado em algum lugar no rescaldo da minha vida. Agora, ele havia dado um diamante a ela.

"Você não pode tê-lo", declarou Gabriela, sua voz se elevando, um brilho triunfante em seus olhos. "Assim como você não pode ter o Caio. Ou esta família. Ou qualquer outra coisa. Tudo que um dia foi seu, Bianca, é meu agora. Cada coisinha." Ela se inclinou, sua voz um sussurro venenoso. "E não há nada que você possa fazer a respeito."

Eu olhei para ela, realmente olhei para ela, seu rosto uma máscara de alegria maliciosa, e depois para Caio, que estava ao lado dela, seu rosto pálido e conflitante, mas silencioso. Ele acreditava nela. Ele sempre acreditou. Ele sempre acreditaria.

Um desespero estranho e silencioso se apoderou de mim. Ela estava certa. Eles haviam tirado tudo. E eu estava cansada demais para lutar. Cansada demais para sequer me importar. Meu mundo estava encolhendo, dia a dia, hora a hora. Não havia espaço para batalhas, nem energia para a guerra. Apenas a marcha silenciosa em direção ao inevitável.

            
            

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