Cinquenta milhões de reais. A quantia exata do meu resgate. Meu sangue gelou, o medo e uma terrível percepção nascente batalhando em meu peito. Não. Não podia ser. Não o Thiago. Não a minha família.
A mão pesada do sequestrador agarrou meu braço, me arrastando em direção ao telefone. "Ligue para ele", ele sibilou, empurrando o aparelho na minha mão trêmula. "Uma última chance. Diga a ele para pagar."
Disquei, meus dedos dormentes, uma esperança desesperada tremulando em meu peito. Talvez fosse um mal-entendido. Talvez.
O telefone tocou duas vezes, depois um clique. Mas não foi a voz de Thiago que atendeu. Foi Gisele. Sua voz, suave e confiante, encheu o pequeno e sujo cômodo.
"O Thiago está em uma reunião muito importante agora, Helena", disse ela, seu tom tingido com uma diversão sutil que arranhou meus nervos. "Ele não pode atender."
"Gisele, por favor", engasguei, minha voz rouca, "Diga a ele que sou eu. Diga a ele que eles vão me machucar se ele não-"
"Querida", Gisele interrompeu, uma risada suave e íntima flutuando pela linha, "ele está realmente muito ocupado. Nós dois estamos. Você não acreditaria na carga de trabalho desde a aquisição. E, bem, algumas coisas são mais importantes que outras, não são?"
Então eu ouvi. Uma risada baixa ao fundo, inconfundivelmente a de Thiago. A voz de Gisele suavizou, quase um ronronar. "Thiago, querido, é só a Helena. Quer conversar."
Outra risada baixa, então a voz de Thiago, distante, abafada, mas clara o suficiente. "Diga a ela que estou ocupado. E para parar de... fazer drama."
A linha ficou muda.
Minha mão caiu ao meu lado, o telefone batendo contra o chão de cimento. Drama. Era isso que eu era. Uma perturbação. Um inconveniente.
Thiago havia escolhido. Ele havia escolhido os cinquenta milhões de reais, o império corporativo, o futuro deslumbrante ao lado de Gisele. Em vez de mim. Em vez de sua noiva. Em vez da mulher que ele dizia amar. Ele me via como uma transação, e eu aparentemente não valia o investimento.
Tropecei para trás, minha mente girando. Os sequestradores, seus rostos agora contorcidos de raiva, me encaravam como se eu fosse um fantasma. Eles sabiam. Eles entenderam o que acabara de me ser dito.
Era o oitavo dia. Ainda sem resgate. A paciência dos sequestradores havia se esgotado. Eles se moveram com uma eficiência arrepiante, não mais cuidadosos, não mais hesitantes. Começaram a me machucar, não apenas fisicamente, mas de maneiras projetadas para quebrar meu espírito. Eles enviaram vídeos, provas grotescas e degradantes do meu sofrimento, para Thiago, na esperança de obter uma resposta.
Não houve nenhuma. Apenas um comunicado de imprensa genérico da empresa de Thiago, uma declaração fria e corporativa sobre não negociar com terroristas e não ceder à extorsão. Era uma declaração pública de que eu era descartável.
O nono dia. Os vídeos escalaram. Eles me forçaram a posições de humilhação abjeta, ameaçando liberá-los para o mundo. Qualquer coisa para fazê-lo pagar.
Ainda nada. Apenas mais notícias sobre a ascensão meteórica de Thiago, sua determinação inabalável, sua "postura corajosa contra o terrorismo".
Então veio o décimo dia. Outra reportagem. Meus pais. Miriam e Roberto Vasconcelos. Eles estavam fazendo um anúncio conjunto, seus rostos sombrios, mas compostos. Estavam retirando oficialmente todos os investimentos da empresa de Thiago. E estavam se mudando. Permanentemente. Para fora do país. Por "motivos de saúde".
Assisti, entorpecida, enquanto eles assinavam seus bens para uma instituição de caridade, efetivamente me deserdando. Eles estavam me abandonando. Minha família, as pessoas que deveriam me amar incondicionalmente, haviam escolhido sua reputação, sua liberdade, em vez de sua própria filha. Eu não fui apenas abandonada pelo meu noivo; fui descartada pelo meu próprio sangue. Eu não era mais uma filha querida, uma noiva amada. Eu era um passivo. Um peão em um jogo que eu nem sabia que estava jogando, jogado de lado por todos que eu já amei.
A raiva dos sequestradores, antes dirigida ao meu valor percebido, agora se transformou em algo puramente vingativo. Eles haviam sido enganados, desprezados. Seu prêmio, eu, era inútil. E eles descontaram suas frustrações no meu corpo, no meu espírito.
Suportei quinze dias de horrores indizíveis. Cada dia era uma nova camada de tormento, uma nova ferida esculpida na minha carne, na minha alma. Fui privada de comida, espancada, humilhada. Eles me queimaram com cigarros, gravaram palavras na minha pele. Eles quebraram meus dedos, um por um, garantindo que meu futuro artístico, minha paixão, fosse roubado para sempre. Gritei até minha voz ficar rouca, até que nenhum som saísse. Implorei pela morte, por um fim para a agonia, mas até essa misericórdia me foi negada. Eles queriam que eu sofresse. E eu sofri. Cada momento.
Mas o golpe mais agonizante ainda estava por vir, algo que eu não compreenderia totalmente até muito mais tarde, depois de ter escapado do inferno em vida em que me prenderam. Uma vida, uma pequena e preciosa centelha de vida, extinta antes mesmo que eu soubesse que existia. Meu filho por nascer, um segredo que eu planejava compartilhar com Thiago na nossa noite de núpcias, foi perdido em meio à violência, ao terror, à traição.
Thiago, enquanto isso, decolava. Sua empresa se tornou um nome conhecido. Ele foi elogiado como um visionário, um homem que construiu um império do nada, livre de sentimentalismo. Gisele estava sempre ao seu lado, sua sombra, sua confidente. Suas aparições públicas se tornaram cada vez mais íntimas, seu vínculo inegável. O mundo celebrava sua ascensão, alheio ao custo humano de sua ambição. Eles eram a história de sucesso. Eu era apenas o detalhe infeliz e esquecido.
Eles tinham tudo. Eu não tinha nada. Apenas as cicatrizes, visíveis e invisíveis, que cobriam cada centímetro do meu ser. E uma raiva ardente e silenciosa que um dia exigiria sua paga.