RECOMEÇO - O que fazer quando a vida nos mostra dois caminhos?
img img RECOMEÇO - O que fazer quando a vida nos mostra dois caminhos? img Capítulo 4 O retorno - parte II
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Capítulo 6 Na berlinda. img
Capítulo 7 Revelações. img
Capítulo 8 O quê img
Capítulo 9 O quê - parte II img
Capítulo 10 A feira anual. img
Capítulo 11 Revelando detalhes img
Capítulo 12 Primeiro dia de aula img
Capítulo 13 Sala dos professores img
Capítulo 14 Visita a fazenda Alonso img
Capítulo 15 Surpreendida! img
Capítulo 16 Desnorteada. img
Capítulo 17 Lutando contra os sentimentos. img
Capítulo 18 Desabafo. img
Capítulo 19 O pedido img
Capítulo 20 A hora da verdade. img
Capítulo 21 Benjamim. - Encarando a realidade. img
Capítulo 22 O baile dos calouros. img
Capítulo 23 O susto. img
Capítulo 24 A vida voltando ao normal. img
Capítulo 25 O casamento. img
Capítulo 26 Casamento - parte II img
Capítulo 27 Casamento - parte III img
Capítulo 28 Decepcionada. img
Capítulo 29 Exigindo explicações. img
Capítulo 30 O grande dilema. img
Capítulo 31 Colocando às cartas na mesa. img
Capítulo 32 Epílogo - Surpresa de Natal. img
Capítulo 33 Epílogo - Surpresa de Natal parte II img
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Capítulo 4 O retorno - parte II

Monte Verde é um paraíso bucólico, repleto de belíssimas paisagens. Não é à toa que ela é chamada assim. Os mais antigos dizem que seu nome foi herdado do seu colonizador, porém, eu costumo dizer, que seu nome foi herdado pela beleza natural que lhe cerca. Seu isolamento em meio às montanhas da Serra, aliado à generosidade da natureza, deixa tudo mais atrativo. Particularmente, eu acho Monte Verde um dos cartões postais mais lindos dessa região.

Ela também é conhecida por seus famosos queijos artesanais, mas sua maior economia está centrada no turismo e no comércio local diversificado. A estreita via principal, repleta de bares, lojinhas e restaurantes, parece resumir o que há de melhor nesse lugar, mas a cidade oferece muito mais. Ela é um destino certeiro para as pessoas que querem curtir umas boas férias. Um convite perfeito para fugir da rotina muitas vezes tumultuada dos grandes centros.

Entro na cidade e vejo o quanto ela está movimentada. Fico impressionada com a quantidade de pessoas circulando pela rua em pleno meio dia de uma sexta-feira. Posso ver os restaurantes completamente lotados, devido à hora do almoço. Todo esse alvoroço me fez lembrar, que a festa anual do queijo acontece sempre na última semana de janeiro, e entendi o motivo de tanta agitação. Nessa época do ano a cidade entra em euforia total, por conta dos preparativos e dos atrativos turísticos.

Noto quando Benjamim ajeita o corpo no assento e olha atentamente o que acontece lá fora. Manuela tinha acabado de acordar. Ela bocejou, e perguntou com voz sonolenta.

- Chegamos mamãe?

- Quase lá meu amor. Daqui a poucos minutos você verá sua vovó Dulce.

Ela assentiu algumas vezes e ainda com a cabecinha encostada nas costas da cadeira, determinou-se a olhar a agitação ao seu redor.

Saio do asfalto me afastando do centro da cidade e pego a estrada de barro que dá acesso às fazendas, granjas e aos sítios.

Finalmente, depois de mais de seis horas cansativas de viagem, chegamos ao Sítio Nova Esperança. Um sorriso irônico aparece em meus lábios, quando me dou conta de que até o nome da propriedade, me incentiva a seguir em frente. Eu estou retornando para casa. Estou de volta ao mesmo lugar de onde saí há dezoito anos, na intenção de começar uma nova vida ao lado do meu marido. Eu sei que Téo aprovaria minha decisão, porque para ele o mais importante sempre foi o bem-estar da família, e eu tinha a plena certeza que isso era o melhor a fazer. Dentro de mim eu sabia que, de hoje em diante, tudo seria diferente.

Encontro a porteira aberta. Entro com o carro passando em frente as duas casas e estaciono um pouco mais adiante. Quando abro a porta do carro e salto para fora dele, o cheiro maravilhoso de comida caseira me acerta em cheio. Mamãe deve estar colocando em prática seus dotes culinários. Isso é uma coisa que ela sabe fazer muito bem.

Neste momento, mamãe aparece na varanda da frente. Estou tentando segurar as lágrimas de emoção que eu sinto surgir na parte de trás de minha garganta, quando a vejo acenar para mim, com um amplo sorriso estampado no rosto. Sua expressão é de extrema felicidade por nos ver aqui.

Sua estrutura física é bem parecida com a minha e para uma senhora de meia idade, ela parece uma mulher muito ativa. Isso me fez lembrar de onde Manuela herdou tanta energia.

- Até que enfim chegaram! – Exclamou entusiasmada.

Ben saiu do carro e foi tirar nossas bagagens do porta-malas, e eu fui de encontro a ela no terraço.

- Boa tarde, mamãe. Como vai a senhora?! – Ela envolveu seus braços em volta de mim, me puxando para um abraço forte.

Dou nela um abraço cheio de saudade.

A última vez que nos vimos foi no enterro do Téo e a partir daí, nos falamos apenas por telefone.

- Bem melhor agora que vocês estão aqui.

Mamãe me soltou assim que viu Benjamim chegar com as malas e se impressionou com o seu tamanho.

- Deus do céu, esse é o Ben?! – Pergunta olhando para mim e eu faço que sim. – Mas ele está muito lindo! O garotão da vovó cresceu e agora é um rapagão! Dá cá um abraço na vovó!

Mamãe caminhou até ele e o envolveu em um abraço de urso. Ben ficou ali, segurando as malas ao lado do corpo, completamente imobilizado. Ele olhou para mim arqueando as sobrancelhas e fazendo uma cara de, "me socorre, por favor!"

Acabei rindo de sua expressão engraçada.

Logo atrás vem Manu, toda faceira e distraída, arrastando sua pequena maleta cor de rosa de rodinhas prateadas.

Mamãe – ainda abraçada ao Ben – inclinou a cabeça para o lado quando viu aquela coisinha melindrosa, vindo ao nosso encontro. Ela ficou admirada com a princesinha loira de cabelos cacheados, de olhos verdes e bochechas rosadas.

E antes que Manuela a alcançasse, mamãe olhou para mim dizendo:

- Ela é igualzinha a você quando tinha essa idade. A mesma cor de cabelo, de olhos, e por incrível que pareça suas bochechas também eram bem rosadas.

Mamãe se abaixou para ficar na altura da neta e a abraçou.

- Pequenina da vovó, como você cresceu meu amor!

- Hum-Hum! – afirmou minha filha balançando a cabeça positivamente. – Eu estou quase do tamanho da Eveline.

Mamãe me olhou novamente, querendo saber de quem ela estava falando.

- É uma coleguinha da escola... – explico. - A melhor amiga dela.

- Ah! - expressou ela voltando a olhar Manu e logo em seguida, assegurou: – Acredito que logo, logo meu amor, você estará da altura de Eveline.

Manu assentiu várias vezes, orgulhosa com a afirmação da avó e nos fazendo rir.

Olhei em volta procurando meu irmão.

- Onde está Dominique?

- Ah, ele deu uma saída. Foi até sua loja de móveis na cidade. - Afastou do rosto de Manuela uma mecha de cabelo, que o vento havia açoitado, e colocou atrás da orelha dela. Depois, se levantou. - Já, já ele estará de volta.

- Ele está se dando bem com a loja?

- Sim. Graças a Deus, está indo de vento em popa. As pessoas gostam do trabalho dele e de móveis rústicos também, porque eles nunca saem de moda.

Concordei com a cabeça.

- Vamos entrar? O almoço está pronto e acredito que vocês estejam morrendo de fome.

- Estou faminto! – confessou Ben, sem perda de tempo, alisando a barriga.

- Que bom, meu querido! Lá dentro tem o bastante para um rapaz do seu tamanho.

Entramos todos em casa rindo.

Na cozinha, reunidos à mesa, conversamos um pouco sobre a festa anual que aconteceria em uma semana.

Todos os anos, os fabricantes de queijos artesanais da região montam suas barracas no pátio da cidade e exibem sua arte para degustação e para vendas. Podíamos encontrar queijos de todo tipo e qualidade, desde os mais simples aos mais sofisticados. Eu gostava de provar um pouco de cada, mas o meu preferido sempre foi o tradicional queijo com especiarias da fazenda Alonso.

Essas lembranças acabam me deixando com água na boca.

Benjamim, não se animou muito em ir a uma festa sem graça – palavras usadas por ele quando se referiu ao evento – no entanto, eu deixei bem claro que todos nós iríamos. E para não parecer que eu estou forçando a barra, digo que Manuela iria gostar de ter sua companhia.

E mesmo a contragosto ele acabou aceitando, em consideração a irmã.

- E quando chega o caminhão de mudanças?

Perguntou mamãe, mudando de assunto.

- Acredito que amanhã de manhã. Quando saí de lá, o pessoal da mudança já tinha colocado tudo no caminhão. Eu pensei em alugar o apartamento com todos os móveis dentro, mas depois de muito pensar, decidi trazê-los de uma vez. Afinal, são coisas que foram conquistadas por mim e por... – Olho para meu filho, que ainda está sentado à mesa, e falo – Ben, por favor, leve Manuela para dar um passeio; mas não vá muito longe.

Ele concorda.

Ben se levanta pegando a mão da irmã e os dois saem pela porta da cozinha, na lateral da casa. Quando percebo que eles se afastaram o suficiente, continuo falando:

- Eu estava decidida a deixar tudo para trás. Pensei que, se eu evitasse olhar alguma coisa que lembrasse Téo, se ficasse longe de tudo que recordasse ele... – balanço a cabeça – Não sei... Acho que eu sofreria menos. Mas percebi que isso seria impossível, porque, para onde quer que eu vá, as lembranças do que vivi com meu marido sempre irão me acompanhar.

Afundo meu rosto nas mãos, tentando aliviar a agonia que essa conversa está me causando. Segundos depois, volto a encarar os olhos doces e piedosos que estão me observando, e continuo dizendo:

– Téo sempre vai estar vivo aqui dentro, mamãe. Sempre! - Determino colocando a mão no coração - Eu não tenho como arrancá-lo de mim.

Ela concorda, com um sorriso compreensivo no rosto.

- E nem pode minha querida, mesmo que queira. – Me advertiu. – E a maior prova disso são seus filhos. Principalmente o Benjamim, que a cada dia que passa se parece mais com o pai.

Eu concordo, com o semblante triste.

- Sim, eu sei. - Minha voz sai embargada - Eu tentei, mamãe. Continuei com meu trabalho, continuei estudando, mas não deu... não sei como consegui aguentar tudo aquilo. Acredito que se eu passasse mais um minuto naquele apartamento, morreria sufocada.

Ela se levanta, senta mais perto de mim e tenta me confortar colocando sua mão sobre a minha.

- Susan. Eu entendo como está sendo difícil para você passar por tudo isso. Eu também senti o mesmo quando seu pai morreu, e olha que vocês ainda eram muito pequenos. – Ela pressionou minha mão com mais força, procurando me incentivar – Ouça sua mãe: tente seguir em frente meu amor. Por seus filhos.

Ela ergue a mão livre e limpa com o polegar uma lágrima que corre em meu rosto, e propositalmente, procura mudar de assunto, falando sobre a vaga de professora substituta que conseguiu para mim, na escola de Educação Integral Coronel Pedro Alonso.

Mamãe é muito conhecida por participar junto aos moradores em ações sociais e é estimada por todos da região. Isso facilitou para ela conseguir essa vaga de emprego, junto à diretora do colégio.

- Falei com Aurora sobre sua situação e de pronto ela garantiu sua vaga, e os meninos já estão matriculados. As aulas terão início em fevereiro e como você bem sabe, isso acontece logo após a festa anual.

- Obrigada.

- Ela também me disse que, provavelmente, surja mais adiante uma vaga definitiva, por conta da transferência de uma das professoras para a cidade vizinha. – Minha mãe vibra quando diz: – Agora é torcer para que tudo corra bem.

- Assim seja mamãe... assim seja.

Nossa conversa foi interrompida, quando ouvimos uma voz masculina misturada com as gargalhadas de Manuela, vindas lá da sala. Dominique entrou na cozinha carregando minha filha nos braços e fazendo cócegas em sua barriga.

- Olha só, que linda bonequinha eu encontrei lá fora. – E ele continuava cutucando Manu, fazendo- a contorcer todo seu corpinho franzino.

- Há, há, há, há! Não, tio! Há, há, há! Eu não aguento mais! – Diz minha pequena quase sem fôlego.

- Ah, não?! Mas, os dedos do tio Dom ainda estão nervosos. – Ele retrucou, movimentando no ar seus longos dedos para ela.

- Não, não, não! – Manuela balançou a cabeça freneticamente, implorando para que ele parasse, e abraçou a barriga para evitar que meu irmão continuasse com a tortura.

- Então, tudo bem. – Concordou, rendendo-se aos apelos da sobrinha.

Ainda sorrindo, Dominique beijou sua bochecha rosada e a colocou no chão. Manuela saiu correndo em disparada porta a fora, para bem longe do seu algoz.

Vendo aquela cena, todos nós não aguentamos e começamos a rir.

Levanto-me e vou até onde está meu irmão mais velho, abraçando-o pela cintura e afundando a cabeça em seu peito. O abraço de Dom foi tão forte e aconchegante, que me fez sentir completamente amparada.

Depois de me apertar mais contra o peito, Dominique beija o topo da minha cabeça e lentamente me afasta para me encarar.

- Como você está? – pergunta, preocupado.

- Vivendo a cada dia.

Ele continua me olhando firme e depois de segundos de silêncio, ele diz:

- Su, você sabe que eu considerava Téo um grande amigo, não é? - Eu faço que sim. - Aliás, mais do que isso. Téo foi como um irmão para mim, uma das melhores pessoas que eu já conheci nesse mundo.

Mais uma vez as lágrimas começam a rolar. É sempre assim quando o assunto envolve meu marido.

Dominique passa o dedo em meu rosto, limpando-as, e continua dizendo:

- Por favor, não fique assim. Não gosto de te ver sofrer.

- Vai ficar tudo bem Dom... Eu prometo. – Me esforço em dar um sorriso, para não preocupá-lo mais.

- Tenho certeza que sim. – Afirma ele, categoricamente. – Téo também gostaria que fosse assim. – E ele abriu um belo sorriso tentando me animar. - A partir de hoje, mudança de vida, está bem? Para você e para as crianças. E não se preocupe, pois com o tempo as dores e as lágrimas passarão. Eu mais do que ninguém posso afirmar isso.

Eu concordo com a cabeça e ele acrescenta, citando uma frase de um famoso escritor:

- Como disse Shakespeare uma vez: "Lamentar uma dor passada, no presente, é criar outra dor e sofrer novamente." Lembre-se disso.

Forço um sorriso.

Eu tinha certeza que meu marido sempre estaria comigo, através de tudo o que vivemos, através dos nossos filhos; mas aquela frase que Dominique me disse ficou ecoando em minha mente pelo resto do dia, e me estimulou a seguir em frente sem vacilar.

"Téo também gostaria que fosse assim."

            
            

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