Sem Coração
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Capítulo 3 3

Os convidados de Mariah se foram no sábado.

-Passamos-o maravilhosamente -a ponto de subir no táxi que os levava a aeroporto, Erica se voltou para abraçar Mariah pela última vez-. Não sei como te agradecer por nos suportar.

-Foi um prazer -lhe assegurou Mariah. E o tinha sido... até certo ponto. Ter Erica, Jeff e aos três meninos toda a semana a tinha mantido ocupada... e calma. Tinha-lhe impedido de perguntar-se o que estaria fazendo Rhys, se estaria começando a assimilar tudo, o que lhe passaria pela cabeça.

Não tinha sabido nada dele em toda a semana.

Havia imaginado que se zangaria, que inclusive podia fingir que não estava grávida, mas não que pretendesse ignorar sua existência.

Eram amigos! E os amigos não davam as costas um ao outro. Os amigos não se deixavam na mão. Os amigos não ignoravam um ao outro.

E isso era precisamente o que estava fazendo Rhys.

Não lhe tinha visto, nem tinha sabido nada dele. Tinha-lhe desculpado dizendo-se que não queria subir para sua casa enquanto que Erica e Jeff estivessem ali, e não podia lhe culpar. Além disso, tinha muito que pensar.

Não esperava que lhe fosse fácil. Não esperava, nem sequer quando tivesse conseguido pô-lo tudo em claro em sua cabeça, que ficasse louco de alegria.

Não esperava que lhe pedisse que se casasse com ele. Não em um primeiro momento. Ainda não.

Embora no fundo de seu coração, atreveu-se a esperá-lo.

Mas, ao menos, esperava voltar a vê-lo.

E não lhe tinha visto em toda a semana.

Na noite anterior a partida de Erica e Jeff, preparou um jantar para todos e convidou a Sierra, sua irmã, e a alguns amigos que seus primos tinham conhecido durante sua estadia: Finn e Izzy MacCauley, Gib e Chloe Walker e Sani e Josie Fletcher. Rhys conhecia a todos, e todos se perguntariam por que não estava ali.

Assim o convidou. Não estava em casa, de modo que lhe deixou uma mensagem na secretária eletrônica. Não estava lhe pressionando. Só estava sendo boa vizinha... estava sendo sua amiga.

À manhã seguinte, ao voltar de fazer um pouco de compra, encontrou sua mensagem na secretária eletrônica.

-Obrigado por seu convite - dizia em um tom tão distante que quase não o reconheceu-, mas não vou poder ir. Tenho outro compromisso.

Todos os outros chegaram pontualamente ao jantar, e todos perguntaram por Rhys.

-Tinha outro compromisso -repetiu, tentando não parecer sarcástica, mas Izzy e Finn a olharam arqueando as sobrancelhas, Chloe parecia atônita e Sam perguntou:

-Não está fora, não?

E Gib disse:

-Que outro compromisso pode ser melhor que este?

-Aparecerá -vaticinou Sierra com seu habitual otimismo-. Certamente teria algum rolo desses de família dos quais não se pode escapar.

Possivelmente, pensou Mariah, mas que ela soubesse, quão único fazia com seus irmãos era ir pescar.

Em qualquer caso, não apareceu.

Sentia-se vazia. Preocupada. Vagamente perdida. Tentou convencer-se de que necessitava tempo, que possivelmente não queria encontrar-se com ela enquanto estivessem ali seus primos. Quer dizer, que lhe concedeu o benefício da dúvida.

Mas naquele momento, ao dar a Erica o último abraço, viu aberta a porta da cancela que conduzia a seu apartamento e o coração lhe deu um salto.

- Voltem logo - disse a sua prima.

-É tua vez de vir para casa -respondeu Erica, tomando Ashley nos braços.

-É certo -respondeu. Rhys estava fechando a porta a suas costas.

-Olhe! É Rhys! Olá, Rhys! -exclamou Erica. Mariah se voltou para lhe ver esboçar um sorriso dirigido a sua prima.

-Vamos -disse-. Ontem à noite sentimos sua falta durante o jantar.

Rhys seguiu com o sorriso de cortesia, mas não respondeu. Ia vestido para ir correr e, normalmente, teria se aproximado e, lhe passando um braço pelos ombros, haveria-lhe dito:

- Anda, vá pôr o moletom. Espero-te. Mas naquela ocasião, nem sequer a olhou.

- Que tenham uma boa viagem -disse a sua prima, tentando parecer alegre-. Adeus, Ty. Adeus, Jeff.

Beliscou brandamente a bochecha de Ashley e a menina sorriu.

Pela extremidade do olho viu Rhys fechar a porta. Estava a apenas metro e meio dela. Menos, inclusive. Em seguida começou a afastar-se. Nem sequer se deteve. Nem sequer a olhou. Saiu e pôs-se a correr rua abaixo.

As portas do táxi se fecharam, e Mariah contemplou como se afastava.

- Adeus! Adeus, Mariah! -despediu-se sua família pelas janelas.

- Adeus! -respondeu, agitando a mão, e depois olhou ao homem que se afastava em direção ao parque-. Adeus -repetiu com suavidade.

Mas sabia que não era com Erica, Jeff, Tyler ou Ashley com quem estava falando.

Manteve-se afastado.

Tomou um avião para Colorado para passar uns dias com seu irmão fotógrafo, Nathan. Depois foi ao Montauk para passar um fim de semana de pesca com seu irmão executivo, Dominic.

E, ao voltar, sempre via Mariah.

Ela não fazia esforços por evitá-lo. Sorria. Inclusive lhe dizia olá. Olhava-lhe com aqueles olhos cinzas que ele recordava perfeitamente da noite que tinham feito amor... algo que, apesar de tudo, desejava voltar a fazer.

Mas o que mais desejava, por cima de tudo, era deixar de pensar nela.

Quando estava em casa, via-a todos os dias. Saía ao terraço para regar as plantas quando ele estava embaixo no jardim. Punha sua roupa para secar nesse diminuto varal no qual pendurava o que ela chamava roupa delicada.

Estava ficando louco.

Possivelmente não voltasse a falar com ela. Inclusive podia ser que não se encontrassem nunca mais cara a cara.

Mas não ficou no jardim. Não estava sendo um dia agradável para ele. Não tinha por que ficar fora se ocupando do jardim. Já teria tempo para fazê-lo mais adiante.

Quando a escandalosa roupa interior de Mariah Kelly estivesse seca e guardada em uma gaveta.

A estava evitando.

Não havia outra palavra para descrevê-lo. Era escritora, e ganhava a vida utilizando as palavras adequadas.

Evitando-a. Sim, isso era o que estava fazendo. Não só não a chamava, nem se passava por sua casa, mas sim trocava de direção se a via. Metia-se em qualquer loja que encontrasse para não cruzar-se com ela. Trocava de caminho para não ficar no seu.

Pois não lhe evitava.

Mariah sempre havia se enfrentado cara a cara com a vida, e isso era o que seguia fazendo. Seguia caminhando para onde fosse embora o visse vindo em sentido contrário, e quando o via meter-se no supermercado para evitá-la, tragava-se a dor e seguia caminhando. Não tinha deixado de regar as plantas ou de estender a roupa quando ele estava no jardim. Inclusive lhe dizia olá, ou lhe saudava com um gesto da mão. E se ele a ignorava ou fingia não ter ouvido, tentava convencer-se de que necessitava mais tempo para assimilar as coisas.

Mas estava começando a cansar-se de esperar.

Esse era o problema de trabalhar em casa: ficava ali muito tempo.

Precisava sair, afastar-se. Tinha rechaçado uns quantos trabalhos por temor ao comportamento de seu estômago. A última hora da manhã estava acostumada a encontrar-se bem, mas não podia levantar-se cedo para ir a uma entrevista porque iria dando enjôos por todo o caminho.

Não sabia quanto tempo mais Stelle, sua chefa, ia tolerar suas negativas, já que não sabia que estava grávida.

Somente Rhys sabia.

Dentro de muito pouco teria que começar a dizer a todo mundo, mas ainda não. Isso era o que se dizia todos os dias: ainda não.

O telefone soou naquela noite na hora do jantar. Tinha desistido de ter esperança de que fosse Rhys. Bom, quase. O coração seguia lhe pulsando mais forte cada vez que soava o telefone.

Era Stella.

- Tenho uma entrevista para ti!

-Uma entrevista? Quando? Onde? Não sei se posso ir neste momento - anunciou com cautela.

-Poderá. Trata-se de Sloan Gallagher.

-Sloan Gallagher? Mas se não concede entrevistas -lhe recordou. Ninguém tinha conseguido uma entrevista com ele fazia anos. Nem sequer se sabia onde vivia com exatidão. Se soubesse, meio mundo estaria acampado ante sua porta.

-Sand Gap, Montana -anunciou Stella-. E quer falar contigo!

-Comigo? Mas se eu nunca lhe pedi que me concedesse uma entrevista.

-Não, mas todos outros, sim. E quer fazê-la para promocionar seu novo filme. Parece que lhe importa mais que todas as outras, assim concordou em conceder uma entrevista. E a conceder-la a ti.

-E por que a mim?

-Diz que é justa e sensível. Ao que parece leu a que fez com Gavin McCormell e lhe impressionou, assim ligou.

Gavin McConnell, outro dos astros de Hollywood mais resistentes a conceder entrevistas, tinha falado com Mariah no outono anterior. O artigo tinha saído no mês passado.

-E chamou a ti?

-Incrível, verdade? -Stella parecia alucinada-. Quer que vá a seu rancho. Quer que esteja ali quando recolherem o gado e o marcarem... para que o retrate tal e como é, e não como Hollywood acredita que é.

-Recolher o gado? Marcá-lo? De verdade Gallagher marca seu gado? De verdade trabalha em seu rancho?

Mariah tinha ouvido esses rumores, mas os tinha considerado somente isso, rumores.

-Parece ser que sim. Por isso te convidou para ficar uma semana lá.

-Uma semana?

- Foi isso que disse. E suponho que você não quererá fazê-lo em menos tempo, não?

Dava a impressão de que Stella duvidaria de sua prudência se lhe dizia o contrário.

Mariah não estava segura de querer fazê-lo. E se passasse o dia com enjôos?

Mas que bem podia fazer ficar em casa? Passaria o dia ali colocada pensando em Rhys. E uma vez ali, poderia escolher o melhor momento para entrevistá-lo.

-De acordo. Irei.

Mariah estava em qualquer lugar que olhasse.

E, de repente, um dia, deixou de estar ali.

Rhys se alegrou. Assim poderia ocupar-se do jardim, sorrindo ao não vê-la no terraço. Nada de roupa interior movendo-se ao vento. Algo mais do que alegrar-se.

Foi correr no parque e tampouco a viu. Sentou-se para ler o jornal na sala e não a viu descer nenhuma só vez pelas escadas.

Tampouco no dia seguinte.

Certamente estaria fazendo alguma entrevista fora da cidade. Saía de vez em quando um dia ou dois. Às vezes ia a Hamptons, ou a Greenwich ou a Cape, e inclusive mais longe.

A revista para a qual escrevia era de cobertura nacional, mas normalmente estava acostumado a ter trabalhos relacionados com o nordeste. Em condições normais, saberia onde estava porque ela o teria dito.

Disse-se que não lhe importava onde estivesse. Não era assunto dele. Além disso, não precisava sabê-lo para nada.

Só tinham sido amigos. E agora, eram até... menos.

Saiu sozinho para jantar a um novo restaurante tailandês que tinham aberto na Broadway. Mariah adorava a comida tailandesa, e se perguntou se ela já conheceria o lugar.

Depois fez todo o possível para não voltar a pensar nela em toda a noite.

Já lhe perguntaria no dia seguinte quando a visse. Como sem lhe dar importância. Ao fim e ao cabo, não havia razão para a afastar de sua vida por completo. Só precisava manter distância, não permitir que chegasse a depender emocionalmente dele. Nada de compromissos.

Mas Mariah não apareceu tampouco no dia seguinte.

Nem no outro.

Ao não vê-la durante cinco dias seguidos, começou a preocupar-se, o qual lhe incomodava enormemente.

-Pois então, pergunta -resmungou entre dentes.

A senhora Álvarez, uma vizinha, o diria.

-Está em East Hampton, entrevistando a esse político tão bonito -ou-: está em Newport, com esse bonito marine - diria, com a esperança de pô-lo ciumento.

Sempre o esperava, porque segundo ela, Mariah e ele pareciam feitos um para o outro.

O qual, é obvio, não era certo.

Ele não era feito para ninguém, e não conhecia o ciúmes. Mas lhe teria gostado de saber onde estava.

Não é que tivesse muita importância, porque não ia sugerir que fossem jantar nesse novo restaurante tailandês, nem a uma partida dos Yankees, nem a ver um filme no Lincoln Plaza.

Saudou timidamente à senhora Álvarez ao sair a correr naquela tarde. Estava sentada na porta, esperando ao entregador.

Não gostou de como lhe tinha olhado. Fixamente. Com curiosidade.

Mariah lhe teria falado do bebê? Se ela teria imaginado-o?

A Mariah ainda não se notava nada, mas não demoraria para começar a ter uma barriguinha. Que aspecto teria com o ventre inchado e seu filho dentro?

Imaginar-lo lhe fez tropeçar no último degrau.

-Cuidado -disse a senhora Álvarez.

Rhys não respondeu, mas sim começou a correr e tirou da cabeça aqueles negros pensamentos.

Não lhe importava. Não queria sabê-lo! Sarah estava já de quatro meses quando... Não! Apertou o passo. Não ia pensar nisso tampouco. Não queria recordar. Seguiu imprimindo velocidade a seu passo.

Não foi exercício que fez naquela noite, senão correr a tudo o que lhe davam as pernas.

A senhora Álvarez seguia sentada nas escadas quando voltou uma hora mais tarde, empapado de suor.

-Corre como alma que foge do diabo -disse.

Rhys não respondeu, mas pensou que era uma imagem muito adequada.

No oitavo dia de ausência, viu-a descendo de um táxi.

Rhys acabava de dobrar na esquina. Vinha de uma de suas corridas noturnas, que já tinham deixado de ser somente exercício. E embora tivesse dado tudo o que podia uns minutos antes, voltou a correr a toda velocidade para agarrar Mariah pelo braço antes de que chegasse à porta.

-Onde demônios estavas?

Ela o olhou. Parecia cansada. E surpreendida.

Ele também o estava. Rapidamente soltou seu braço e se afastou um passo.

-É que as pessoas perguntavam por ti -explicou. Mariah arqueou as sobrancelhas.

-Pessoas?

- Chloe.

O qual não era certo, mas poderia havê-lo sido. Chloe tinha vivido na casa de Mariah no verão passado enquanto estava de obras na sua e tinha saído com Rhys alguma vez enquanto ela estava em Hamptons. No outono passado, em lugar de voltar para sua casa de Iowa para casar-se com seu prometido, tinha-o feito com Gibson Walker, o fotógrafo com o qual trabalhava.

Agora Chloe estava grávida. Gravidíssima. Como se tivesse inquilinos vivendo em sua barriga. Rhys se tinha tropeçado com ela, literalmente, dois dias antes no Zabar.

-Sentimos a sua falta no outro dia na casa de Mariah - lhe havia dito ela, e ele tinha murmurado uma desculpa qualquer.

Na realidade, foi-se a um clube de jazz no Soho para estar fora de casa quando chegassem os convidados de Mariah.

- Bom, já nos veremos - se despediu alegremente Chloe-. Lhe convidaremos para vir em casa quando nascer o bebê. Dá um beijo a Mariah de minha parte.

-Disse-me que não tinha falado contigo desde o jantar -lhe disse naquele momento a Mariah-, e que se perguntava onde te tinha metido.

-Em Montana. Tinha trabalho ali.

Aquilo lhe surpreendeu. Não estava acostumado a afastar-se tanto de casa. Tivesse querido lhe perguntar que tal lhe tinha ido. Sempre gostava que ela lhe contasse coisas sobre os ricos e famosos, já que Mariah entendia a essa gente melhor que ninguém. Sabia encontrar pontos em comum com eles. Metia-se sob sua pele. Sabia conseguir que fossem totalmente naturais com ela.

Mas não perguntou nada.

Recolheu sua mala do chão antes de que ela pudesse fazê-lo.

-Eu levarei isso -disse isso com brutalidade.

Demônios... deveria havê-la deixado subir sozinha, mas é que aquela mala parecia muito pesada. Certamente não deveria levar pesos. Não em seu... estado. Tentou não lhe olhar a barriga.

Ela pôs-se a andar, e ele a seguiu.

Abriu a porta em silêncio e começou a subir as escadas. Então começou a falar, a lhe contar como lhe tinha ido a entrevista. Quando mencionou o nome de Sloan Gallagher, arqueou as sobrancelhas. Inclusive ele sabia que Gallagher não concedia entrevistas e sentiu curiosidade por saber como ela tinha arrumado para que a estrela mais procurada e mais resistente de Hollywood tivesse concordado em falar com ela.

Mas não perguntou.

Apertou os dentes e subiu atrás dela.

Resultou ser uma vista memorável.

De fato, ver o traseiro de Mariah usando umas calças de linho à altura de seus olhos esteve a ponto de ganhar a partida. Esgotado depois da corrida e incomodo consigo mesmo por aquela reação, quando chegou à porta lhe faltava oxigênio.

Mariah se voltou para olhá-lo.

- Não estás em forma? -perguntou-lhe, mas ele não respondeu. Não podia fazê-lo sem ofegar, assim esperou que ela abrisse a porta de seu apartamento e entrou atrás dela para deixar a mala.

-Obrigado - sorriu Mariah-. Quer água? Parecia alegre, contente de vê-lo, como se nada tivesse mudado.

Mas não era assim.

-Não -deu a volta-. Tenho que ir.

Ela piscou várias vezes e seu sorriso empalideceu antes de morrer por completo.

-Já nos veremos -disse ele, e desceu as escadas de dois em dois.

Suas esperanças tinham acabado em água.

Ela havia partido dizendo-se que não estar ali, esperando saber dele a cada instante ajudaria... ajudaria a ambos. Que ele assim teria tempo suficiente para assimilar a nova situação.

Tinha voltado para casa acreditando que assim seria, disposta a lhe abrir os braços, a alegrar-se com ele, a convir com ele que, apesar de que aquele não era o melhor modo de iniciar uma família, tudo ia sair bem; que podiam consegui-lo... os três.

E quando lhe tinha recolhido a mala, tinha tido que conter-se para não lhe abraçar naquele mesmo instante. Menos mal que não o tinha feito porque, ao que parecia, Rhys não estava mais preparado do que quando se foi para aceitar sua paternidade. Não estava preparado para formar parte do milagre da nova vida que tinham criado entre ambos.

E podia ser que nunca o estivesse.

Era a primeira vez que se permitia formular aquele pensamento.

Sua mente e seu coração o rechaçaram quase imediatamente. Queria Rhys, e não estava disposta a acreditar que ele ia dar as costas a esse amor... ou a seu filho.

Ainda seguia tendo náuseas, mas não tão intensas nem tão seguidas como antes. Além disso, agora era necessário que algo as desencadeasse, como por exemplo aquela ocasião em que Sloan Gallagher lhe ofereceu para provar algo que ele chamava ostras das montanhas Rochosas para tomar no café da manhã.

Ela o tinha olhado com desconfiança.

-O que é?

- Testículos. Testículo.

E tinha tido que sair correndo ao banheiro.

Mais tarde, para recuperar sua credibilidade e que ele não acreditasse que era uma questão de melindres femininos, tinha-lhe explicado que se devia a seu estado.

A confissão lhe tinha feito sentir-se sobressaltada e vulnerável, mas surpreendentemente ele se mostrou pormenorizado e desejoso de apoiá-la. Por ter reputação de estirado e insensível, Sloan Gallagher a tinha surpreendido gratamente, algo que pretendia refletir claramente em seu artigo. Stella ia se encantar.

O qual, por outro lado, estava muito bem, já que ao que parecia ia ser mãe solteira.

Rhys lhe havia dito que a ajudaria economicamente. E certamente o faria. Mas a economia doméstica não era o maior de seus problemas. Não é que fosse rica, mas ganhava o suficiente dinheiro para viver.

Não era nessa área em que queria o apoio de Rhys.

Era em sua vida, e na vida de seu bebê.

Mas não estava disposta a lhe rogar.

Tinha-lhe sorrido ao vê-lo. Tinha falado com ele ao encontrar-lhe nas escadas. Esperava alguma sinal que indicasse que estava repensando.

E seguiu esperando.

-Uma festa para um bebê que ainda não nasceu? -Rhys esteve a ponto de tragar a língua e olhou aturdido o telefone que tinha na mão-. De que bebê?

-Pois o de Chloe, é obvio -respondeu alegremente Izzy MacCauley-. A quem mais conhece que vai ter uma criança?

Rhys respirou um pouco mais tranqüilo.

-Essas coisas são para mulheres.

-Que tolice. Gib e Finn estarão lá. E Sam e Fletcher. Conhece a todos.

Izzy não aceitava um não por resposta com facilidade.

-Está bem -respondeu Rhys-. Irei.

-Estupendo. Por que não vem com Mariah?

-Não posso!

-Por que não?

-Eu... fiquei de ir pescar com meu irmão nesse dia. Não sei quando voltaremos.

-Ora. Enfim, nós gostaríamos que viesse. Sentimos sua falta na festa de Mariah.

-Já...

Desligaram pouco depois.

Rhys cometeu o engano de falar com seu irmão Dominic da festa para o bebê enquanto pescavam.

-É uma tolice. Não importa se chegarmos tarde e não posso ir.

-Uma festa para um bebê? Grande vida social a tua - exclamou, sorrindo-. Seria imperdoável que perdesse isso.

E se assegurou de que voltassem a tempo. Assim não teve mais remédio do que ir.

-Que passe bem -se despediu seu irmão.

- Sim. Genial.

Todo mundo estava ali quando chegou.

- Entra -Tansy e Pansy, sobrinhas de Izzy e Finn, convidaram-lhe a entrar-. Estão todos no terraço.

E lhe conduziram através de uma espaçosa sala de teto alto para o terraço no conversavam e riam uma dúzia de pessoas.

Mas ele somente viu uma: Mariah.

Na realidade, viu dois. Mariah estava sentada no balanço com Crash, o menino de dez meses de Finn e Izzy, no colo. Balançando-se brandamente, Mariah segurava as mãos do pequeno enquanto este dançava sobre seus joelhos. Os dois riam e ela parecia... parecia uma mãe.

E naquele momento, seguiu olhando-a.... até que ela reparou nele e afastou rapidamente os olhos.

-Quer tomar algo? -ofereceu-lhe Finn-. Cerveja? Chá gelado?

-Cerveja -murmurei Rhys, embora o que de verdade tivesse querido era um uísque. Só.

Bebeu a cerveja sem aproximar-se de Mariah. Estava claro que não tinha falado a ninguém de sua gravidez. Todo mundo revoava ao redor de Chloe, lhe tocando a barriga e recordando quando Izzy estava tão gorda como ela.

Dentro de uns meses, Mariah estaria igual.

De um gole, bebeu a cerveja.

-Quer outra? -ofereceu-lhe Finn.

-Claro.

Esteve conversando com ele e Gibb sobre os dias que tinha passado no Colorado com Nathan.

Conversou também com Sam Fletcher e Damon Alexakis, ambos os importadores e amigos de Izzy e Finn. Sam acabava de chegar de Singapura, e Damon, da Grécia. Rhys tinha estado em ambos os lugares no ano interior.

Falou também com Tansy, Pansy e Izzy, e não deixou de observar Mariah em toda a noite.

Estava preciosa. Resplandecente. Tinha-o notado assim que havia entrado. Sentia-se cômoda com Crash, e o pequeno respondia a suas atenções com entusiasmo, o qual estava muito bem, já que ia necessitar desses dotes dentro de poucos meses.

Então Finn se aproximou para levar ao pequeno.

-Chegou a hora do recreio -lhe disse-. Já o agüentaste o suficiente.

-Não me importa -respondeu Mariah.

-Importaria-te se tivesse que fazê-lo continuamente.

E tinha razão. Finn e Izzy trabalhavam em equipe para ocupar-se das gêmeas, de Crash e de seu irmão maior, Rip. Sam e Josie Fletcher faziam o mesmo com seu filho, Jake. E a Chloe, Gib a atendia constantemente.

Tudo aquilo fez Rhys pensar.

Mariah não deveria ter que passar por tudo aquilo sozinha. Ia necessitar de apoio, e não bastaria com um cheque mensal.

Não lhe havia dito nenhuma só palavra em toda a noite. Tinha falado com todos outros, com todos os homens e mulheres, exceto com Chloe e ela.

Tentou não irritar-se por isso, que não lhe importasse, mas não era fácil, sobretudo quando, ao vê-la partir, Izzy perguntou a Rhys:

-Você também parte?

-Não. Vou ficar mais um pouco.

Izzy pareceu surpreender-se muito, mas Mariah tentou dissimular.

-Não necessito de guarda-costas -disse com um sorriso, e depois de despedir-se de todos, saiu sem olhá-lo.

Foi para casa e se meteu na cama, mas não conseguiu dormir. Não podia deixar de dar voltas, de preocupar-se, de perguntar-se. Em pouco mais de um ano, teria um bebê do tamanho de Crash.

Saberia lhe dar o que necessitasse? Seria capaz?

É obvio que sim.

Mas em plena noite era difícil sentir a mesma confiança que a pleno sol do verão.

Felizmente, a tarde estava alagada de sol e estava trabalhando em um artigo quando soou a campainha da porta.

Esperava que fosse a senhora Álvarez, que ia levar-lhe um cartão de leite do supermercado.

Mas quando abriu a porta se encontrou frente a Rhys.

-Olá.

Ela sorriu com cautela. Ele também sorriu um pouco. Sentiu que suas esperanças ressurgiam. Possivelmente tivesse estado refletindo sobre a paternidade depois da festa do dia anterior. Possivelmente tivesse sido o despertador que necessitava. Possivelmente não disse nada na noite anterior para esperar que estivessem sozinhos.

Rhys se cocçou a nuca e trocou de pé seu peso.

-Vim para falar contigo. Posso entrar?

Ela assentiu e abriu a porta.

-Quer te sentar? Posso preparar um chá gelado.

-Não, obrigado -respondeu. Atravessou a sala e se voltou a olhá-la-. Estive pensando... em ti. Em você... grávida.

Fez uma pausa e ela assentiu para animá-lo.

-A festa de ontem à noite me tem feito pensar. Ver Gib com Chloe, Finn com Izzy e Sam com Josie... tem-me feito pensar.

Mariah voltou a assentir.

-Fazem falta dois -disse.

- Sim -disse Mariah-. Estou de acordo.

- Vais necessitar de apoio emocional. Não só econômico.

«Graças a Deus», pensou Mariah.

-Isso é o que estive pensando. Eu posso me ocupar do econômico, mas do outro... sei que é muito importante.

Mariah não entendia o que pretendia dizer.

-Sim -repetiu-. O que tenta me dizer, Rhys?

-Bom... como já hei dito, acredito que é importante que um menino tenha pai e mãe. Duas pessoas que dele se ocupem. E você também vais necessitar de alguém, assim acredito... que vais ter que buscar a alguém. Um homem, quero dizer.

Mariah sentiu que ficava de boca aberta.

- E queria que soubesse que não me importaria que... que encontrasse a alguém. E que tivesse uma relação. Que se casasse contigo.

Olhou-a como se esperasse que lhe agradecesse, mas ela não podia dizer uma só palavra. Estava atônita. Não podia acreditar no que estava ouvindo.

-É uma mulher fantástica, Mariah. Bonita. Inteligente. Sensível. Poderia ter ao homem que quisesse, até estando grávida. Sei que para alguns não faz graça criar os filhos de outro, mas quando escolher a alguém... poderá lhe dizer que não terá que preocupar-se com o dinheiro. Disso me ocuparei eu, assim não terá que... que arcar com o menino. Com seus gastos.

Parecia um pouco desesperado, como se estivesse brigando com as palavras, como se não estivesse seguro de que o que estava dizendo tivesse algum sentido mas precisasse dizer algo.

Mariah conseguiu por fim fechar a boca.

-E bem? -perguntou ele-. O que achas?

Ela abriu de novo a porta, escancarou-a.

-Pois acho que podes ir ao diabo, Rhys Wolfe. Fora de minha casa!

            
            

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