Capítulo 2 Proposta

AMANDA

Às vezes, eu me pergunto como teria sido a minha vida se não tivesse perdido os meus pais tão cedo. Certamente, eu seria feliz de uma forma como não sou agora.

Lembro como se fosse hoje do dia em que saíram de casa e me deixaram na casa da irmã da minha mãe, a tia Juvena. Eu fiquei feliz por dormir fora, porque teria mais tempo para brincar com a minha prima. Mas a minha felicidade durou muito pouco.

A minha tia recebeu uma ligação da polícia avisando que os meus pais haviam sofrido um acidente de carro. A batida em uma carreta foi tão forte que não tiveram nem uma chance de sobrevivência. Depois que enterrei o meu pai, eu me vi com medo e completamente sozinha.

Órfã de pai e de mãe, corri o risco de ser levada para um lar de adoção, mas a minha tia Marta, irmã mais velha do meu pai, ficou com a minha guarda. No começo, não entendi o porquê de terem ficado comigo, já que não gostavam de criança, muito menos de mim. Apenas aos dezesseis anos entendi que os dois só queriam a casa dos meus pais.

Os meus pais eram professores e não deixaram nada além da casa, que pareceu ser o suficiente para pessoas que queriam tudo na vida do jeito fácil e sem muito esforço.

Eu teria sido muito infeliz se não tivesse feito amizades na escola que me impediram de ser totalmente solitária. Ter pessoas por perto me ajudou, embora não tenham fechado o buraco aberto no meu peito.

Eu conheci a Luana no último ano do colegial e foi ela quem me ensinou o significado da palavra diversão ao me levar em lugares onde nem mesmo deveríamos estar. Com as suas identidades falsas, entrei em casas de shows para adultos que me apresentaram ao mundo das bebidas alcoólicas e do sexo.

Um dia, uma amiga da Luana me contou sobre como era feliz com a sua independência financeira depois de ter feito a melhor e a pior escolha da sua vida. Obviamente, eu quis saber mais e acabei sendo apresentada a um mundo de prostituição de onde nunca mais sai.

Mas foi graças a isso que saí da casa dos meus tios. Eu não gosto deles, guardo mágoa o suficiente para não querer vê-los nunca mais. Também não quis lutar pela casa, pois sinto que não sou digna de nenhum presente dos meus pais, depois de ter vendido o meu corpo tantas vezes que perdi as contas.

Embora tenha sentido prazer com o sexo antes, deixei de sentir depois que o meu corpo se tornou um instrumento de trabalho. Simplesmente não sinto, e foram raríssimas as vezes que o meu orgasmo não foi fingido.

Não importa quão gentil alguém seja comigo, não é o suficiente para derreter o gelo em volta do meu coração. A minha conta está recheada com uma quantia considerável de dinheiro e tenho o meu próprio apartamento, mas me sinto oca por dentro.

- Você foi incrível hoje, querida - João fala quando terminamos.

Por ser o meu cliente mais antigo e o que mais me procura, João acabou se tornando especial de alguma forma e me fez o enxergar como um amigo.

Muito bonito para a idade que tem, o homem não tenta esconder que é rico, assim como não finge que a sua vida é um livro fechado. A verdade é que João é tão solitário quanto eu e, algumas vezes, me liga apenas para conversarmos. Procura-me para aplacar sua solidão durante algumas horas.

Ele gosta muito de falar a respeito do filho que está há anos trabalhando fora do país como advogado. Sei tanto a respeito do homem que tenho vontade de o conhecer em alguns momentos. Não seria possível, pois mesmo que o João e eu tivéssemos outro tipo de relação, ele não iria nos apresentar, pois está claro pela forma como fala que não se dão bem.

Meu cliente tem ciência de que não foi um bom pai, porque estava mais preocupado em ganhar dinheiro enquanto o filho crescia do que em dar a atenção que ele precisava.

- Obrigada - digo.

- Eu sinto a sua falta quando a gente se separa - confesso. Sento-me com as costas contra a cabeceira da cama do quarto de hotel e ele faz o mesmo.

Será que ouvi bem? Tudo bem que gosto da sua companhia, mas João é um cliente. Não poderia ficar com ele de qualquer forma, afinal, tem trinta anos a mais do que eu.

Não é que eu não tenha a mente aberta, se não tivesse, não aceitaria clientes da sua idade, mas ninguém levaria um casal como nós dois a sério. Ainda bem que o fato de estar fazendo essa revelação não significa nada.

É só um comentário, não é?

Então, por que o meu coração está disparado?

- Não precisa sentir a minha falta, você é um cliente e pode me ligar todas as vezes que sentir vontade de me ver - falo de uma forma carinhosa, mas também sendo profissional como seria com qualquer um.

- Eu me sinto só - declara pela primeira vez em voz alta o que eu já tinha notado nesses dois anos em que nos encontramos.

- Também me sinto em alguns momentos, mas acho que isso é normal para qualquer pessoa.

Eu tenho certeza de que a minha solidão não pode ser considerada normal. A prova disso é o fato de estar tendo essa conversa com um homem que deveria ser apenas um cliente atraente fisicamente e na forma como fala comigo.

- Nós poderíamos juntar as nossas solidões - sugere. Não faço ideia do que esse homem realmente quer dizer, mas o meu coração bate tão acelerado que eu poderia desfalecer aqui e agora de tanta preocupação.

- Estou com medo de perguntar o que você está querendo dizer, João.

- Por que não ser corajosa e simplesmente perguntar, menina? Tenho certeza de que uma dose de coragem te fará bem.

Ele está certo, não é?

- Como pensa em unir as nossas solidões?

- Casando-me com você.

- O quê?!

- Case-se comigo, menina.

            
            

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