Capítulo 4 Capitulo 4

- Estamos reunidos hoje para uma despedida improvisada do nosso querido Túlio. - Meus olhos voam para o canalha ao meu lado, que em momento nenhum se dignou a mencionar essa notícia bombástica. - Nosso menino voará ainda mais longe e assumirá o controle de toda empresa a partir de São Paulo. Desejamos muito sucesso nessa nova caminhada e estamos muito orgulhosos de você, filho. - complementa com a voz embargada.

Tia Carmem, mãe de Túlio, chora emocionada e é amparada por Tia Célia, sua irmã, enquanto eu olho de tio Milton para Túlio mais de uma vez.

- Parabéns, Túlio! - minha mãe o cumprimenta animadamente. - Muito sucesso em sua caminhada!

- Obrigado! - agradece e volta seus olhos escuros e analíticos ao tio. - Tio, eu vou precisar de ajuda lá. Existe uma vaga e gostaria que Milena fosse comigo. Ela é mais do que qualificada e...

- De forma alguma - tio Milton o interrompe e volta seus olhos bondosos para mim. - Mimi gatinha ficará perto de mim. Tenho planos grandes para ela.

Ah, tem. Vou me aposentar fazendo as previsões astrológicas de gerações a fio. Ou salvando o casamento de alguém.

Deus me ajude!

Só agora reparo que Fred continua ali e parece analisar a cena com bastante atenção. Somos um bando de doidos, corra enquanto ainda é tempo! Tia Célia sorri orgulhosa para mim e mamãe só falta explodir.

Eu sou a responsável pelo horóscopo, pelo amor de Deus!

- Tio... - Túlio tenta mais uma vez, mas é ignorado totalmente.

- Viva o Túlio! - tia Carmem, que não é realmente minha tia, puxa o brinde, e logo todos nós brindamos, felizes pela realização do garoto prodígio.

- Como é mesmo a palavra para comer? - tio Milton pergunta à Fred, que murmura baixo perto dele e sorri ao ouvi-lo gritar empolgado - Mangiare! Mangiare!

O prato estava maravilhoso e fui obrigada a repeti-lo pelo menos umas duas vezes antes que o buffet retirasse os pratos para servir a sobremesa. Sou uma garota que come, tenham isso em mente. Dieta é tortura para alguém como eu. Feliz e bastante agradecida à minha mãe que sugeriu que eu vestisse um vestido hoje, relaxo enquanto aguardo ansiosa à sobremesa, ignorando totalmente o tratante ao meu lado.

Salafrário! Safado e cachorro!

Em defesa dele, Tulio realmente havia avisado que tinha vários assuntos para conversar comigo, mas depois de falar sobre o retorno do Isaac, enfiar a mão em minha blusa e fazermos coisas bastante sacanas no sofá de seu escritório, essas informações podem realmente ter sido esquecidas momentaneamente. Mas nada justifica ele não ter dito agora a noite depois que chegamos aqui.

De repente, noto pela minha visão periférica uma garota do buffet servindo um pedaço bastante generoso de tiramisú - um dos meus doces preferidos. Eu poderia abraçá-la naquele momento, mas não consegui fazer nada antes que ela declarasse para a mesa inteira ouvir:

- Para o casal, com os cumprimentos do Chef.

- Casal? - Meus olhos já saltando das órbitas. - Não, moça. Ele é um amigo.

- O bastardo é esperto - Túlio resmunga entredentes.

- Não, querida! São praticamente primos! - Tia Carmem declara e logo todos os integrantes mais velhos da mesa concordam imediatamente.

- Não somos primos! - negamos quase que ao mesmo tempo.

Se eles soubessem das coisas que já fizemos, jamais repetiriam essas bobagens.

A moça nos encara um pouco confusa e noto que ela parece cogitar a possibilidade de levar

minha sobremesa tamanho GG de volta, e uma insanidade dessas eu jamais poderia permitir. Por isso, pego minha colherzinha e já encho a boca de doce, que quase me faz explodir de tão gostoso que está. Gemo alto, degustando o manjar dos deuses banhado em café e sorrio para a moça que parece se divertir com a minha reação.

- Vou avisar ao chef sobre a confusão - ela diz, se afastando.

- Agradeça a ele por mim - digo com a boca cheia. Deselegante, eu sei. Mas esse doce está maravilhoso e eu quero aproveitar cada pedaço, principalmente agora que Túlio parece bastante disposto a acabar com ele. - Está delicioso!

- Vou avisá-lo - ela diz, praticamente correndo de volta para a cozinha.

- Definitivamente, ele está interessado em você, priminha - provoca.

- Depois desse doce, devo dizer que estou totalmente interessada, priminho - devolvo a provocação.

Ele não precisa saber que o interesse existe desde que aquelas mãos firmes impediram que eu caísse aquele dia. E que me encantei totalmente com aqueles olhos verdes e brilhantes. Sem mencionar o sorriso.

- Não sei se essa é uma boa ideia - Tulio resmunga em meu ouvido. - A última vez que te vi com essa cara, as coisas não deram muito certo.

- O que estão cochichando? - tia Célia nos pergunta, interessada.

- Não faço a menor ideia - respondo.

- Chef, que vexame! - Vivi vocifera. - Eles não são um casal!

- Não? - faço-me de bobo. - Mas eles ficaram juntos a noite inteira e eu pensei...

- São primos ou algo assim - Vivi responde. - Quase morro de vergonha! Mas a garota do cabelo cor-de-rosa pediu para agradecer ao Chef e pareceu realmente gostar do doce. Avançou nele antes que eu pudesse trazê-lo de volta.

Uma garota que gosta de comer é tudo o que um Chef pode querer, sorrio comigo mesmo. Essa garota cheia de atitude, com seu cabelo cor-de-rosa e seu piercing no nariz que se prepare. Fred Piazzi vai colocar seu time para jogo e ele não costuma perder. Seu "primo" ciumento que aprenda a lidar com isso.

Não quero parecer com a minha mãe e seus sinais, mas se isso não for sinal do universo, eu não sei o que é. Assim que manobro o carro para fora do condomínio de luxo, nos deparamos com ninguém menos que a garota de vestido preto e cabelos cor-de-rosa na altura dos ombros e uma mulher baixa e elegante com o carro popular parado no acostamento.

Paro o carro e peço aos funcionários que aguardem um momento e saio do carro, puxando as mangas longas da camisa social branca até os cotovelos, embora eu saiba que não vai dar para salvar a peça caso eu tenha que me deitar no chão. Os olhos castanhos se arregalam ao notar minha proximidade, mas em pouco tempo ela sorri, cumprimentando-me.

- Senhoras - cumprimento-as. A mulher mais velha parece um tanto ressabiada com a minha aproximação, então mantenho distância. Calma, sogrinha. - Precisam de ajuda?

A senhora de cabelos escuros como a raiz da filha nega com aceno fraco, mas Milena revira os olhos antes de sorrir para mim.

- Oi, Fred - ela cumprimenta com um sorriso que derreteria uma calota polar. - Mãe, relaxa! O Fred é o chef responsável pelo jantar na casa do tio Milton hoje. Lembra? - A postura da mulher muda abruptamente e ela sorri, um sorriso lindo como o da filha, embora seus olhos sejam claros. Desvio meus olhos dela e volto minha atenção para a garota que aponta para o carro num gesto desanimado. - Meu carro faleceu.

Não consigo segurar o riso. Embora ela me encare com os olhos estreitados, é impossível não rir de sua expressão triste e sua voz chorosa ao se referir ao carro. Ela, claro, não parece gostar nada disso, e cruza os braços diante do peito, seus lábios formando um biquinho teimoso.

Não me tente, moça.

- Tudo bem, vamos ver o que consigo fazer - digo, ajustando as mangas mais uma vez. Só que agora percebo seus olhos acompanhando cada movimento com atenção exagerada. Mimi gatinha gosta do que está vendo.

Demoro mais que o necessário na manobra, apenas para observá-la assistindo cada um dos meus movimentos.

Você vai ser minha, gatinha. Em breve.

Quando a mãe dela coça a garganta, abro o capô do carro e noto que uma mangueira está desconectada do motor. Emendo-a e peço à Milena que ligue o carro. Nesse momento, devo deixar claro que não sou mecânico. E isso explica todas as cinco tentativas falhas em tentar ressuscitar o veículo.

Com a camisa totalmente arruinada pelo banho de óleo após a quinta tentativa, ofereço carona às duas e assim que elas aceitam, pelo menos a mãe dela aceita, e entra na van do buffet é que penso que deveria ter feito isso desde o começo. Meneio a cabeça em recriminação à minha burrice e é quando a vejo caminhando em minha direção, o rosa realçado pelos faróis de um carro que passa por nós.

- Já liguei para o seguro - declara. - Vou ter que ficar. Mas, obrigada mesmo por se dispor a levar a minha mãe.

- Posso esperar com você - ofereço rapidamente e ela percebe, porque ergue uma sobrancelha e sua expressão se torna divertida. Ela gosta do jogo, noto. - Um dos rapazes pode levar o pessoal e...

- Não será necessário, cozinheiro - alguém declara às minhas costas. O folgado dá a volta em mim e apoia o braço nos ombros de Milena, que revira os olhos e dá um passo para o lado, afastando-se sutilmente. - Pode ir, eu fico com a Mi.

            
            

COPYRIGHT(©) 2022