Capítulo 3 O ladrão

Liam.

Eu estava no centro da cidade assim como qualquer outra pessoa que desejasse salvar a sua vida vindo para a parte mais alta. Estava praticamente sendo esmagado pelas pessoas desesperadas que gritavam e empurravam todos que se aproximassem, inclusive à mim.

Meu tamanho não estava ajudando muito, até que decidi me abaixar e tentar passar por baixo das pernas para sair dessa multidão de malucos. Se eu ia morrer de qualquer jeito, era melhor fazer isso sem está pressionado entre aqueles corpos sujos assim como o meu.

Eles estavam falando que os tremores iriam diminuir, mas ao contrário dos boatos, eles estavam aumentando gradativamente ao invés de diminuir, o que fez todas as minhas esperanças esperanças sumirem.

Depois de engatinhar feito o cachorrinho para longe da multidão (ganhando ums chutes e arranhões no processo), solto um suspiro aliviado ao finalmente sentar na rua asfaltada sem nenhuma prisão claustrofóbica de corpos ao meu redor. Tento respirar calmamente, o que descobri ser impossível quando se tem certeza que a morte se aproxima à cada instante. Mas então meus olhos focam em algo estranho.

Um garoto loiro e com roupas sujas e rasgadas está correndo através das barracas caídas da feira e roubando comida o mais rápido que consegue, o que me deixa incrédulo. QUEM PENSA EM COMER QUANDO SE TEM CERTEZA QUE VAI MORRER EM POUCOS MINUTOS?!

Mas então noto que ele não está comendo nada, está simplesmente enchendo umas sacolas com frutas e enlatados e depois colocando-as em uma pilha com várias outras sacolas já cheias. O que ele está fazendo??

Curiosidade toma conta de mim, então levanto do asfalto sujo e marcho até ele em passos rápidos (o mais rápido possível quando se é baixo como eu), enquanto seguro as alças da minha velha mochila, onde está minhas poucas roupas e tudo que eu tenho.

O garoto loiro está tão concentrado em enfiar a comida roubada dentro da sacola que mal nota que estou me aproximando silenciosamente por trás.

- oi.- digo calmamente, fazendo o garoto da um pulo felino para a trás e me olhar com espanto.

- o-oi.- ele gagueja, enquanto tenta esconder a sacola atrás das costas, com se estivesse com medo de que eu vá denucia-lo por roubo, não ligando se todas as pessoas vão morrer em pouco tempo.

- você quer ajuda?? Quatro mãos fazem um trabalho melhor que duas.- ofereço, notando pela primeira vez que ele está um pouco espantado por causa dos meus olhos, o que me faz colocar o capuz do velho casaco sobre minha cabeça. O casaco é grande demais para mim, o que faz o grande capuz ocultar quase todo o meu rosto.

- tudo bem.- ele diz, antes de se aproximar e explicar todo o seu plano, o que me dá esperanças de continuar vivo por Pelo menos mais algum tempo.

(****)

Eu sabia que estava me metendo em confusão no momento em que me ofereci para ajudar o garoto loiro que, depois de algum tempo, disse se chamar Alex. Estava ajudando ele à carregar as várias sacolas cheias de comida pelas ruas desertas, quando então encontramos mais dois garotos altos que também estavam carregando sacolas e sacos cheios de coisas.

Ambos eram altos e morenos, o que se apresentou com Jay tinha o cabelo castanho meio encaracolado e olhos da mesma cor, enquanto o outro que se chama Elliot também tinha cabelos castanhos, mas os olhos eram verdes.

Notei que eles estavam meio receosos em me aceitar no grupo, mas depois de um tempo alex finalmente os convenceu à me deixar ficar. Então nós quatro caminhamos em silêncio pelas ruas desertas, carregando os suprimentos que nos manteriam vivos por mais algum tempo, isto é, se o tal do Kyle estiver conseguido o barco, o que é meio improvável, mas não custa ter esperanças (Alex me disse que Kyle é o chefe do grupo e meio que um irmão mais velho para todos eles).

Quando uma brisa gelada tirou o capuz da minha cabeça, recebi olhares admirados e espantados de todos, mas felizmente nenhum deles fez perguntas em relação ao meus olhos, o que me fez agradecer internamente.

- acham que ele conseguiu??- Alex pergunta para os outros, enquanto coloca as sacolas pesadas no chão e descansa por alguns segundos.

- ele sempre consegue.- Jay responde, sem parar de caminhar pela rua, tomando cuidado para não escorregar por causa dos tremores.

Nós dobramos mais uma esquina, dando de cara com uma rua alagada e com um barco ancorado à uns cem metros de distância. Todos os três garotos ao meu lado soltam suspiros de alívio ao ver a embarcação de ferro madeira desgastada, então começam à andar apressadamente na direção da água, com sorrisos vitoriosos nos rostos.

Sigo-os silêncio, observando o nervosismo que se espalha pelos seus rostos à medida que entramos na água fria, que vai aumentando de profundidade à cada passo dado.

Puro terror toma conta de mim ao ver o garoto enorme sentado na proa do barco, observando nós quarto nos aproximarmos com uma expressão de raiva. Eu reconheceria aquela pele pálida, o cabelo preto e os olhos azuis frios em qualquer lugar. É O INFELIZ QUE ROUBOU O MEU COLAR!!! Fico meio desesperado ao saber que minha vida está nas mãos desse otário, mas mesmo assim, continuo andando com as sacolas pesadas e cruzo os pouco metros que separam o barco de mim.

- QUEM DIABOS É ELE?!- o garoto enorme grita para os amigos, enquanto aponta para mim com uma expressão de superioridade.

- e-eu sou o lia...- começo, amaldiçoando-me internamente por gaguejar, mas ele me impede de terminar a frase quando sua voz grave e alta sobrepõe a minha.

- EU FUI BEM CLARO NÃO FUI?! MANDEI VOCÊS PROCURAREM E TRAZEREM SUPRIMENTOS!! NÃO LEMBRO DE TER PEDIDO PARA QUE TROUXESSEM UM PIRRALHO TAMBÉM!!- a voz dele faz os amigos se encolherem e olharem para baixo, como se pedissem desculpas.

- eu não sou um pirral...

- É CLARO QUE VOCÊ É!! COM ESSA ALTURA DEVE TER UNS O QUE?! 13 ANOS!?- a voz dele vai ficando mais alta e estressada à cada segundo (se é que isso é possível) enquanto os outros apenas alternam um olhar entre mim e o "chefe". Noto que eles estão esperando eu responder a pergunta, e curiosidade nos rostos deles indica que eles também querem saber minha idade.

- eu tenho quase 16 anos...- não me preocupo em esconder a irritação em minha voz. Quem esse otário acha que é para falar assim comigo e com os amigos?! O rei do mundo??

- VOCÊS TROUXERAM UM PIRRALHO DE 15 ANOS PARA O MEU BARCO?!

- eu disse quase 16...

- NÃO INTERESSA!! EU NÃO ESTOU FALANDO COM VOCÊ SEU MERDINHA!!- me corta com puro ódio no rosto, ele parece estar usando todo o autocontrole para não pular do barco e me estrangular.

- ele nós ajudou com as sacolas durante todo o trajeto ky, e esse barco é grande o suficiente para cinco pessoas, e se não for, a gente dá um jeito.- Alex murmura um pouco nervoso, sem fazer contato visual com kyle, que tenta respirar calmamente como se quisesse se livrar da raiva junto com o ar que exala das suas narinas.

- EU NÃO QUERO SABER! E QUANTO A VOCÊ!! SEU PIRRALHO IDIOTA, EU QUERO QUE VOCÊ DÊ MEIA VOLTA E VOLTE PARA O BURACO DE ONDE SAIU. A-G-O-R-A!!!- o garoto do barco dirige cada palavra fria, assim como seus olhos para mim. Olho para os três garotos ao meu lado como se estivesse esperando que algum deles me ajudassem, mas pelo visto nenhum deles está disposto à brigar com o chefe idiota por minha causa.

Faço que sim levemente com a cabeça dentro do capuz, antes de colocar as sacolas de comida que estavam em minhas mãos sobre a proa do barco e dar meia volta, começando à andar rapidamente em direção à rua sem dizer nenhuma palavra. Eu posso até ser pequeno, mas tenho um orgulho que nunca me deixaria implorar para aquele filho da puta lá atrás. se é para morrer, vou morrer com minha dignidade intacta.

Coloco mais força nas pernas para andar mais rápido dentro da água fria que já está acima do meu umbigo, então sigo meu caminho sem olhar para trás.

(****)

Kyle.

- qual é, ky, ele ajudou a gente.- Alex murmura para mim assim que entra dentro do barco. Lanço-lhe um olhar mortal antes de responder.

- eu não tô nem aí.- minha voz ainda soa zangada, mas não como antes. Me abaixo na borda do barco e ajudo Elliot e Jay a subir no barco, puxando-os pelos braços.

- você não vai mesmo mudar de ideia, não é??- o seu semblante é de tristeza enquanto ele olha para os próprios sapatos molhados e sujos.

- não.- digo simplesmente, antes de começar à levar as sacolas com os suprimentos para dentro da cabine, onde ficarão protegidos.

- mas ele era tão legal...

- não. Interessa.- o corto, já sentindo a irritação crescer dentro de mim. Affs, o que Alex viu naquele pirralho?!

- eu só queria que mais alguém além da gente sobrevivesse.- o seu sussurro é quase inaudível, então ele marcha até onde está a pilha de suprimentos e começa à carrega-los para dentro da cabine, assim como eu. Isso é tão a cara dele, Alex sempre procura alguma coisa para ocupar a cabeça quando está irritado/frustado, geralmente um trabalho.

Não é que eu simplesmente não queira aquele garoto no meu barco só por maldade. Só quatro vidas interessam para mim, e ter mais alguém aqui significa mais uma boca para alimentar e dar água, o que vai fazer os suprimentos acabarem mais depressa e consequentemente diminuir a nossa expectativa de vida em 20%. O que? Porcentagem é uma das únicas coisas de Matemática que eu também sei fazer.

- sabe, eu também queria que o garoto dos olhos de cores diferentes também sobrevivesse, ele parecia legal.- Jay sussurra para Alex, como se quisesse alegra-lo. Travo no lugar ao ouvir as palavras "olhos diferentes".

- o que??- pergunto para ele, sentindo o colar no bolso da minha calça pesar uma tonelada com a lembrança que volta para minha mente.

- o garoto... O Liam, ele tem um olho verde e outro azul, eu fiquei curioso, mas tive vergonha de perguntar sobre isso.- Elliot responde para mim, me deixando meio atônito. Isso é uma coincidência do caralho!! Como pode ser o mesmo garoto?!

Eu não havia percebido antes porque o pirralho estava com o rosto coberto, mas como não reconheci a voz chorosa?!

Merda, incerteza toma conta de mim. Então solto um longo suspiro e faço algo que provavelmente vai gerar muito arrependimento depois.

- okay, Vocês ganharam. Alex, você pode ir chamar o pirral... O garoto.- digo olhando para o garoto loiro e magrelo. Alex me encara com os olhos castanhos arregalados como se não acreditasse no que acabei de dizer (acredite, nem eu mesmo estou acreditando), antes de fazer levemente que sim com a cabeça e pular do barco, antes de começar a andar apressadamente na direção da ilha que afunda cada vez mais.

(****)

Uns dez minutos depois, Alex aparece ao lado do garoto baixo e igualmente magrelo, que caminha um tanto nervoso enquanto segura as alças da mochila velha. A água está quase em seu peito magrelo agora, enquanto bate no umbigo de Alex.

Meu amigo ajuda o menor à subir desajeitadamente no barco, então também sobe na prós de madeira. Antes mesmo do pirralho se por de pé, caminho até ele e o pego pela camisa molhada.

- escuta aqui seu otário, Esse barco é meu. Você pode ficar, mas no momento em que desobedecer minhas ordens, eu vou ter o maior prazer em te afogar. Entendido??- sussurro friamente, de modo com que apenas ele escute.

- okay.- ele murmura, antes de me encarar com seus olhos exóticos de cores distintas. Noto que não há um pingo de medo ou nervosismo no seu pequeno rosto, o que me faz querer afoga-lo nesse exato momento.

Solto um grunhido de irritação, antes de solta-lo bruscamente sem me importar se vai machucar ou não. Então caminho em passos largos para a cabine, ainda fervendo de raiva.

            
            

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