- Gerda me contou que estaria aqui - o homem disse. Ele se aproximou. Ele parecia se manter numa escada invisível, sempre soberbo. - É um prazer conhecê-la pessoalmente. - Ele, Mack Montonni, pegou a minha mão e beijou suas costas. O toque de seus lábios quase me fez vomitar, mas engoli o nojo e o olhei.
Meus olhos pareciam arder.
Lágrimas.
Eu não devia chorar.
Não agora.
Eu o imaginei como um homem frio e velho. Ele tinha trinta e oito anos. Eu tinha dezenove. Nunca o conheci, mas meu pai me avisou que ele era um bom farejador de medo. Todas as suas presas eram frágeis e facilmente manipuláveis. Eu me sentia como uma criatura indefesa diante dele. O homem era alto, tinha uma boa aparência e mantinha sua frieza como se fosse parte de sua personalidade.
Minha mão tremia.
Ele notou o meu desconforto evidente.
- Eu não mordo. - Ele disse. - Não se não se fizer por merecer. - Sua voz era grave. Grave como um trovão. Isso me deixou um pouco assustada. Seu olhar...ele me comia com os olhos.
Uma presa fácil.
Eu era uma presa fácil para Mack Montonni.
- Espero que esteja preparada para a sua nova vida - ele disse, erguendo uma sobrancelha. O primeiro resquício do que achei ser um sorriso desenhou seus lábios, mas o brilho afiado de seus dentes brancos - como os de um lobo, afiados e letais - fez um arrepio correr por minha espinha. - Arrume-se. Quero vê-la em cinco minutos, no jantar.
Eu assenti.
- S-sim, senhor. - Eu disse.
Maldita... eu deveria ser forte. Parecer forte. Mas... mas fui traída por mim mesma.
Eu não comia direito fazia quatro dias. O buraco no meu estômago não me permitia, mas seria bom encarar meu dono nos olhos enquanto se banqueteava. Meu predador podia facilmente me devorar. Era bom que estivesse bem alimentado.
Ele se virou, afastou-se e saiu, batendo a porta com um baque firme, que ecoou e se internalizou no meu corpo.
Só então me permiti deixar o ar escapar de minhas narinas, esvaziando os meus pulmões. Um alívio se espalhou por mim.
Eu havia trazido três malas com algumas roupas - nada muito caro e extravagante - e a única jóia que havia restado da família. Era um broche em forma de borboleta de ouro cravado em rubi e diamantes; delicado, lindo e precioso. Era a única coisa que me fazia acreditar em minha força, e consequentemente, acreditar nas últimas palavras da minha mãe:
"Tenha coragem e seja forte. Você pode cair se alguém lhe derrubar, mas levantará, e mesmo que esteja fraca demais, sabe que levantou. Nenhuma luta é vazia, querida."
Eu precisava disso.
Eu precisava dela.
Eu vestia um vestido um pouco acima dos joelhos, preto, e meus cabelos estavam presos num coque. Eu geralmente os mantinha soltos, mas estavam bagunçados demais. Ri de mim mesma quando lembrei de pensar que se o sr. Montonni achasse que se eu fosse feia, não iria me querer. Na verdade, eu torci por isso. Em um mês, eu esperei, dezenas de vezes, que entrassem pela porta e me arrastassem e explodissem minha cabeça. Diziam que o Magnata era cruel e não poupava ninguém. Eu esperei e encarei a morte todos esses dias, mas o que me esperava era - talvez - algo bem pior. Acontece que o desgraçado era um sádico que achava engraçado zombar e desolar pessoas - eu - e enchê-las de medo e terror, provocando cada parte ínfima de seu ser. Talvez eu fosse fraca, sim, talvez, mas era injusto ter que enfrentar alguém como ele - indigno, até.
Eu vi meu reflexo no espelho e sequei as lágrimas.
Alguém bateu à porta.
- Srta. Watson? - Perguntou Gerda, colocando a cabeça para dentro do quarto. Quando notou que eu estava pronta - ou o que parecia ser isso -, aproximou-se e disse: - O sr. Montonni está à sua espera na sala de jantar. - Eu assenti com a cabeça.
- Me dê três minutos, por favor. - Minha voz era fraca - como toda eu - e baixa.
- É claro. Tome o tempo que achar necessário. - Ela virou-se e se afastou. Quando chegou à porta, segurou-a e disse: - avisarei ao sr. Montonni.
Eu voltei meus olhos para o espelho de corpo inteiro e fitei meu reflexo. Eu era magra, mas nem tanto, e tinha algumas curvas em meu corpo. Meus olhos eram azuis, azul-claro e olhos grandes puxados um pouco para cima. As maçãs do meu rosto eram salientes e minha boca - talvez grande demais - estava nua, sem batom. Eu não usava maquiagem. Beleza não importava quando se sabe que está prestes a pular de um precipício. Eu podia sentir o chão cedendo abaixo de mim, tão frágil... tão amedrontador. Mas talvez pular me ajudasse, mesmo que definitivamente desse um fim em tudo.
Eu tinha uma vida antes dessa. Alguém me amava. Aaron. Ele era gentil, lindo e carinhoso. Sempre muito atencioso. Não era como Mack Montonni, um homem que eu nem sabia as intenções. Não, ele era tudo o que eu tinha, mas graças a Mack, eu o perdi.
Quem poderia saber se eu sobreviveria a isso?
Fosse lá o que fosse acontecer.
Eu estava destinada a isso, e não podia escapar.
Eu tinha um dono agora. Mack Montonni.