Paro em frente a uma sala ampla com dois sofás e uma tela grande na parede. Está cheia de pessoas que parecem apavoradas. Todos param de falar no momento em que apareço e olham para mim com os olhos arregalados. Vejo quatro garotos sentados em um sofá, mais dois em pé do outro lado da sala. Cinco garotas estão sentadas no sofá maior.
- Acho que você é a única que faltava para se juntar a nós - diz uma das garotas, com o cabelo preto comprido e liso. A única coisa que consigo registrar é que a voz dela é irritante.
- Que lugar é esse? - Minha voz sai quase como um gemido; quanto tempo fiquei desmaiada?
- Ainda não sabemos, mas tenho certeza de que fomos sequestrados - responde um rapaz musculoso, que está em pé do outro lado da sala, com os braços cruzados.
Parece que uma garota está chorando baixinho, encolhida no canto do sofá. Alguns estão de cabeça baixa, com o rosto nas mãos. Todos parecem um pouco perdidos.
- Há quanto tempo estamos - começo, mas a mesma garota, com a voz irritante, me interrompe:
- Escuta aqui garota, não sei se você percebeu, mas todos nós estamos perdidos aqui, sabemos tanto quanto você!
- Vamos manter a calma, não há nada que possamos fazer; estamos trancados, então vamos nos conhecer e tentar agir juntos, como uma equipe, descobrir como poderemos sair daqui e talvez... - O mesmo cara começa a falar, com sua voz autoritária.
Parei de ouvir totalmente.
Também parei de respirar.
Estou total e completamente paralisada, com exceção de meu coração disparando loucamente dentro de mim. Porque bem ao meu lado, sentado no braço do sofá à minha esquerda, com os olhos verdes olhando diretamente para mim, está Harry.
Houve vezes em que me vi sonhando acordada com o sorriso dele. E agora ele está bem aqui.
Eu o inventei.
Pelo menos é isso que sempre disse a mim mesma. A mistura de todos os itens da lista de um homem perfeito. O problema é que eu estava errada. Porque agora mesmo Harry está sentado no sofá à minha esquerda, mexendo em seus dedos.
Meu Harry.
O Harry dos meus sonhos.
O Harry que não é real.
Você finalmente enlouqueceu. Ele realmente existe ou estou sonhando de novo?
Meus joelhos estão tremendo, minhas mãos estão suando, minha garganta está seca e meu coração está batendo freneticamente. Ele está aqui, do meu lado, olhando para mim.
- Ok, então! Vamos logo com isso! - A garota chata quebra o silêncio, levando-me a afastar meus olhos dele.
Sinto meu rosto esquentar e ele evita olhar para mim novamente.
Tudo bem, então não é uma miragem, acho. Mas talvez um clone. Porque não é possível que o nome dele seja na verdade...
- Harry - ouço a voz rouca dele ao se apresentar para o grupo, que espera que ele fale mais do que apenas o seu primeiro nome. Ele fica olhando fixamente para baixo, para as mãos, como se elas precisassem urgentemente da sua atenção.
- Meu nome é Kyle, tenho 19 anos. Sou de Seattle, mas eu tinha acabado de chegar em Londres, eu acho, não lembro direito, não sei se fui atacado no metrô... apaguei e acordei em um quarto daqui... - Diz o cara musculoso, franzindo a testa em pensamentos.
E o resto do grupo foi se apresentando: sete homens e seis mulheres.
O que está acontecendo? Isso é um teste?
Uma voz profunda e suave interrompe meus pensamentos:
- Hey.
Percebi que todos estão esperando que eu me apresente e Harry está olhando para mim, esperando minha resposta. Limpo a garganta e digo:
- Meu nome é Grace... Grace Heinz... tenho vinte anos e... - Paro, tentando lembrar o que aconteceu, ainda sentindo o aperto daquele homem no meu braço e o modo como tentei resistir. Mas parece uma lembrança tão distante, como se minha memória estivesse dormindo ainda. As imagens estão embaçadas.
- Vamos explorar a casa e ver se há alguma saída - sugere John. Devon aponta para a cozinha que fica à nossa direita e diz:
- Não há, já verifiquei. As janelas estão lacradas, não podemos ver o que há lá fora e além dos quartos, só há essa sala e a cozinha ali e, câmeras em todo lugar.
Ficamos em silêncio novamente, abalados e confusos com tudo isso. Ainda não entendo... por que eu? E o que querem de nós?
Alguns minutos depois, a tela na parede é ligada, nos assustando. Nela, aparece um homem mascarado, com uma voz modificada, causando arrepios pelo meu corpo. Isso não é bom.
- Ora, ora, ora o que temos aqui? Ótimos soldados, eu espero.
Todos ficam espantados com o riso assustador dele e algumas garotas começam a chorar novamente...
- O que você quer de nós?!? - Kyle grita.
- Por que estamos aqui? - Uma garota choraminga. O mascarado levanta as mãos em sinal de rendição, e ri de novo.
- Acalmem-se! É o seguinte: preciso de pessoas qualificadas para fazer o que eu quero, então resolvi criar essa base de treinamento. E vocês foram os sortudos! Parabéns!
Nossa, como ele é debochado.
- Vocês foram escolhidos com base nas suas aptidões: temos vigiado cada um que está aqui hoje. Antes que perguntem, amanhã terão um instrutor para treiná-los com lutas e armas. Só saberão o motivo disso quando passarem em todos os testes e verei se vocês são capacitados ou não...
- E se não? - pergunta um cara que ainda não sei o nome.
- Se não querem morrer, se esforcem.
Há suspiros e soluços na sala.
Meus olhos ardem, mas me recuso a chorar.
Observei Harry. Ele ficou em silêncio o tempo todo, com sobrancelhas franzidas e mordendo os lábios. Percebi que eu estava assim também, e suando de nervosismo.
Não basta ser sequestrada por um psicopata maníaco, eu tenho que estar ao lado de Harry!
- O que vamos fazer agora? - pergunta a garota ruiva. Sei que o nome dela é Hirma, e ela é da Irlanda.
- Não sei, acho que devemos tentar dormir, ou descansar... ele disse que amanhã de manhã vamos ser treinados, então devemos obedecer para não morrer... - Kyle responde.
Todos concordam com a cabeça e se levantam para ir, mas não consigo sair do meu lugar, parece que estou congelada. Ajeito uma mecha do meu cabelo atrás da orelha enquanto tento organizar meus pensamentos e lembrar que fui raptada e que provavelmente serei morta, mas... não consigo.
Não seja esquisita, não seja esquisita, repito para mim mesma ao mover meus pés e parar na frente dele.
Há milhares de possíveis frases passando pela minha cabeça. Harry vai sorrir e me puxar para um abraço e me beijar. Um beijo real com ele.
Mas na verdade, tudo o que consigo falar, olhando fixamente para ele, é:
- Oi.
Parece que cada nervo do meu corpo está gritando, e tenho vontade de fugir e correr para muito longe agora. Harry não se apressa em levantar a cabeça e olhar para mim.
- Oi - ele responde, enfim me olhando diretamente e pousando as mãos no colo.
Tem alguma coisa por trás do seu olhar que não consigo decifrar e que nunca vi antes. Tem uma formalidade nele. Harry é tão familiar que é quase assustador. Esse não é um rosto que copiei da internet e colei na minha mente. Esse é o homem que conheço e amo. O meu cara. Ele é meu e eu...
- Você precisa de alguma coisa? - Harry inclina a cabeça para o lado. Engulo em seco e, quando enfim respondo, minha voz sai fraca:
- Você... você se lembra de mim?
E, enquanto procuro em seu rosto algum sinal de reconhecimento - algo como o que eu pensei ter visto no seu olhar quando o vi pela primeira vez há alguns minutos antes - a sensação é de que meu coração afundou até o estômago, e as laterais do estômago estão se dobrando em torno dele.
É neste momento que Cornélia, a garota da voz irritante, se inclina sobre Harry e o beija no rosto.
- Oi Harry, sou Cornélia - ela olha para mim. - E quem é você?
Quem é você?
Quero gritar. Sinto as lágrimas se formando em meus olhos novamente, e estou fazendo todo o possível para mantê-las ali. Olho para Harry e, por um momento, seu olhar exibe um pequeno sinal de compaixão, que é substituído rapidamente pela mesma expressão calma.
- É Grace, não é? - Harry pergunta.
A garota-da-voz-irritante ainda está pairando sobre ele, seu belo rosto próximo ao dele, o cabelo longo, liso, sedoso e brilhante dela está sobre o ombro dele.
- É - consigo falar.
- Vocês se conhecem? - Cornélia pergunta.
Nem Harry nem eu falamos. Não aguento olhar para ela tão próxima dele assim e ver que ele não fez nada para afastá-la, então encaro o chão, esperando pela resposta dele. E, quando a resposta vem, só fecho os meus olhos por completo.
- Não, nós não nos conhecemos - Harry responde, calmamente.
Meu cérebro sabe que é completamente idiota me sentir rejeitada por alguém que não tenho certeza se conheço, mas meu coração não parece ter captado a mensagem ainda.
Saio do meu torpor e balanço a cabeça, entendendo. Viro-me para o corredor, tentando voltar para aquele quarto que estava antes, que deve ser o meu de agora em diante.
Harry me segue pelo corredor. Quando chego à porta do quarto que provavelmente é o meu, ele para em frente da porta do outro lado, me olha mais uma vez e, com um aceno, entra no seu quarto, que agora sei que é em frente ao meu.
Quando entro, paro com as costas na porta fechada, ofegante. Tremendo de medo e ansiedade. Em menos de 24 horas, fui agredida, sequestrada e me deparei com a personificação dos meus sonhos! Fiquei mais preocupada e ansiosa com o homem dos meus sonhos do que com o sequestro.
Meu coração parece estar dominando meu corpo, e minha mente está perdendo essa batalha.
Tranco a porta e caio na cama, coloco minha cabeça no colchão, choro e tento silenciar meus soluços colocando a boca no travesseiro.