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- Você esqueceu o que vivemos no carnaval do ano passado em Veneza? - questionou, magoada, sentando-se ao lado do homem.
Com olhar de incapacidade, e temor de Chloé surtar e seus planos de descobrir onde sua esposa estava irem por água abaixo, de imediato, cruzou os braços e rebateu:
- Me diga como foi!
Entristecida, baixou a cabeça. Seu peito guardava uma paixão infinita e aquela situação soava um desprezo para aquele pobre coração.
A festa de carnaval em Veneza, Itália, é celebrada todos os anos desde seu surgimento no século XI. O tempo dos festejos duram cerca de dez dias e, ao longo dos séculos, tem reunido milhares de pessoas do mundo inteiro, nos arredores da famosa e exuberante Praça São Marcos.
Os dias da festa carnavalesca, geralmente, são no final de janeiro, fevereiro ou março, e mesmo sendo um período de inverno massacrante, a magnitude e beleza do evento é a cada ano mais surpreendente.
A festividade iniciou-se no mesmo ano da consagração da Basília de São Marco, em 1094. O carnaval de Veneza, em especial, teve seu surgimento no meio da elite veneziana. O responsável pela criação da celebração foi o Doge Vitale Falier, que era de uma das famílias mais influentes da cidade. Ele sugeriu a comemoração do carnaval, antes do início da quaresma. Sua intenção era de que a população pudesse gozar de um tempo de prazeres, jogos, brincadeiras e diversão pública.
Dessa forma, é valido salientar que a ideia da nobreza daquela época, era de poder disfarçar-se com o uso de fantasias e máscaras, tornando-se irreconhecíveis, com a finalidade de juntarem-se ao povo e desfrutarem, tranquilamente, de todos os prazeres e diversões oferecidos durante o festival.
Mesmo tendo surgido em 1094, o Senado veneziano, formalizou o carnaval apenas em 1296. Naquele ano, um decreto declarou que no último dia antes da quaresma, a festa fosse realizada, sobretudo, a população dava início aos festejos em dezembro. Assim que a solenidade foi oficializada, uma infinidade de costumes e usos foram implementados, além de tornar-se um vantajoso negócio. Exemplo do "business" promissor eram as confrarias ou escolas dos "mascareri", de propriedade dos artesãos que produziam as máscaras e fantasias para os foliões.
O intuito da festa era um tempo de abandono da sua identidade. Para que isso fosse possível, era necessário o anonimato. Nos primórdios do carnaval, os homens faziam uso da "baúta", roupa com capa, que cobria todo o corpo. O rosto era mantido em segredo atrás de uma máscara branca triangular, que possuía uma pequena abertura, possibilitando que o indivíduo comesse e bebesse, entretanto, era discreta o suficiente para alterar a voz da pessoa.
Já as damas, usavam a "moretta", uma máscara de veludo, oval, na cor preta. Curiosamente, com o uso desta, elas não podiam falar, isso porque, a moretta encaixava-se no rosto através de um botão e esse ficava dentro da boca da mulher.
Nessa época, em especial, devido à liberdade acentuada e exagerada, aconteciam muitos atos imorais, golpes e crimes. Diante desses acontecimentos, durante um tempo, as máscaras foram proibidas na parte da noite, nos locais sagrados e nas casas de jogos, em contrapartida, eram de uso obrigatório nos teatros.
Em tempos atuais, no século XXI, o uso das máscaras e figurinos extravagantes e luxuosos, que tentam reproduzir o estilo dos nobres dos séculos XVII e XVIII, voltaram a protagonizar no carnaval veneziano.
Chloé, como estava de certa forma dopada e embriagada, não raciocinou direito e lembrou do dia. Sorriu e suspirou:
- Nós chegamos em Veneza na manhã do dia 14 de fevereiro. Aquela sexta- feira foi uma das mais frias que já enfrentei naquela cidade.
- Nós quem?
- Eu, meu pai, sua namorada Antonella e nossos seguranças!
- Seu pai gostava de carnaval?
- Sim! - afirmou, recordando. - Porém, ano passado ele tinha um encontro especial naquele lugar!
- Que encontro? - com olhar irritado.
- Com o Nicolai Baryshnikov! - engoliu seco.
- Quem é esse? - indagou, fingindo não saber.
- É um ex-membro da KGB, que na época liderava a Bratva!
- Uou! - zangado. - E o que o seu pai tinha para tratar com a máfia russa?
- Você não sabe? - encarou-o chateada.
- Não! - negou com a cabeça. - Me conte você! Esse babado é da sua família! - debochou, bravo.
- Ah, Marcelo! - irada, cruzou os braços. - Você matou o desgraçado na minha frente!
- O QUÊ? - gargalhou. - De onde você tirou uma coisa dessas, garota? AH! Devem ser os comprimidos e a meia garrafa de uísque...já estão te deixando ainda mais pirada - riu, balançando a cabeça.
- VAI NEGAR? TUDO? SÉRIO? VOCÊ FARÁ ISSO COMIGO? - gritou, em lágrimas, e enfurecida.
- Tudo o que, garota? Não faço a menor ideia do que você esteja falando!
Brava, sorriu e secou as lágrimas:
- Não estou acreditando que você negará que me ajudou naquela noite e que ficamos por dias em Veneza! Juntos! - enfatizou.
- AH! JUNTOS? - gargalhou, mais uma vez. - Juntos, como? Te ajudei como e por quê?
- Eu te falei naquela noite! - entristecida relembrou. - Te contei tudo! Te contei que estava esperando a reunião deles acabar e em um determinado momento, estava enfadada da espera e quando entrei na antessala do quarto, ouvi o assunto deles. Falavam sobre mim e sobre você!
- Ah! Sobre mim? - arregalou os olhos, zangado. - O que falavam de mim? Arquitetavam a minha morte?
- Não sei se te matariam! - negou com a cabeça, com um olhar de incapacidade. - O que ouvi foi que o Nicolai falou que havia uma forma de te pegar de jeito!
- Hum! Que jeito? - em tom de deboche. Acendeu um cigarro e aguardou a história da moça.
- Nicolai contou ao meu pai que você tinha confessado a ele que queria me conhecer pessoalmente e pediu a ajuda dele para isso! - disse ela, o encarando.
- AH! - gritou rindo. - Eu queria te conhecer? - após uma baforada, olhou pela janela e riu. - Ah, garota...garota! Nem se eu fosse o maior maluco desse planeta fodido, eu pediria a ajuda de um mafioso russo, ainda mais, para me aproximar de uma Bourbons!
- Ok! Se isso era mentira, não sei - franziu a testa. - Mas ele falou isso para o meu pai e, diante dessa oportunidade, juntos, arquitetaram uma forma de me jogar na sua cama e meu pai te tomar a Gabelotti!
- Aaaah! - arregalou os olhos e deu uma tragada em seu cigarro. - O maldito do seu pai queria a Gabelotti e usaria a filha para isso?
- Sim! Ele sempre fez isso...e eu estava cansada disso - chorando. - Por esse motivo, eu fugi! Corri o máximo que pude e como aquelas ruelas são estreitas, escuras e a cidade estava lotada por causa do carnaval, eu despistei os seguranças do meu pai e da Bratva - limpou o rosto lavado do seu choro. - Fugi de tudo e de todos e acabei nos seus braços! - encarou Ricco, com olhar de mágoa e paixão. - Eu morri de medo de ser usada e ferida como tantas vezes...- sorriu. - Mas você...você me amou, Marcelo!
O silêncio imperou naquele carro. Ricco fixou seus olhos nela, deixando transparecer que estava perplexo com as mentiras da mulher. Chlóe riu e continuou:
- Você e seus seguranças me encurralaram perto do Teatro Fondamenta Nuove - sorriu nostálgica. - Eu não fazia ideia de que você era Ricco Gabelotti. Em desespero, me ajoelhei e implorei para não ser ferida!
Suspirou:
- Você aproximou-se e me levantou! - com um sorriso apaixonado. - Em seus braços, me acolheu e olhando em meus olhos, você falou: "Fica calma, minha princesa Bourbons, a partir de hoje eu te protejo!" - secou os olhos. - Você estava de máscara, mas o seu olhar penetrou no meu e eu fui impactada! - riu e o olhou fixamente. - No seu abraço eu me rendi! Não sei como e por quê...mas eu me rendi! Me senti segura! Pela primeira vez em minha vida, me senti segura! - chorou e baixou a cabeça.
Atormentado, o mafioso respirou fundo e acendeu outro cigarro. Enquanto ela chorava, pegou seu celular e mandou uma mensagem para seu melhor amigo: "Riccardo, a garota é pior do que eu pensava! Ela não fala coisa com coisa...cria histórias mirabolantes. Ela é, praticamente, obcecada por mim...preciso de ajuda! Não tenho controle emocional para ouvir tanta maluquice...você me conhece, eu darei um tiro na cabeça dela! Estou muito nervoso e irritado! Me ajuda, por favor?"
Enquanto ela chorava em demasiado, o rapaz fumava, silenciosamente, torcendo para que seu amigo e psiquiatra respondesse aquela mensagem. Em minutos, chegou a sua resposta. O homem respirou fundo e leu: "Marcelo! Não tenho como falar com certeza, mas ela me parece ser esquizofrênica, portanto, muito cuidado! Qualquer vacilo seu, já era! Só tem uma forma de encontrar a Iza e é através dessa mulher, portanto, tenta relevar essa situação, finge que acredita nela...faz um esforço, até a minha chegada! Vou ao encontro de vocês, manda alguém me buscar!"
Aliviado, Ricco suspirou e respondeu a mensagem: "Ok!" Sem demora mandou uma mensagem ao seu segurança, que morava perto do médico: "Esposito, busca o Doutor Marcelo no apê dele e leva para a Torre Scola." Em segundos, seu aparelho vibrou e a mensagem era: "Sim senhor!"
O mafioso olhou para Chloé e buscou forças dentro de si. Abriu a geladeira portátil do carro e retirou uma água mineral. Deu a ela:
- Toma, Chloé! Se acalma! Por favor!
- Como me acalmarei? - com a voz trêmula. - Você finge não lembrar de nada! Eu amo você e você agindo dessa forma! É devastador!
O homem respirou fundo e deu a água na boca dela. Precisava manter a moça calma. Marcelo tinha certeza que havia sido Chloé quem tinha sequestrado Iza. Precisava adquirir a confiança da menina Bourbons.