Enquanto me olhava, deslizei os meus dedos sobre aquele vestido vermelho que estava colado à minha pele. Parecia suave e delicado. Tudo estava milimetricamente perfeito. A maquiagem discreta, o cabelo comprido dividido ao meio, o vestido com uma faixa grossa que percorria os meus ombros, um decote em coração arredondado e uma fenda lateral até a coxa, tudo estava no lugar que deveria estar.
"Estou finalmente pronta", foi o que eu sussurrei para mim mesma.
Peguei a minha bolsa preta, alisei meu cabelo mais uma vez para ter a certeza de que estava perfeito e desci as escadas.
Warner me viu quando eu fechava a porta do quarto. Ele fez uma cara surpresa, sua boca se abriu e os olhos azuis claros estavam arregalados olhando para cima e para baixo no meu corpo. "Puta merda! Você está...", ele balançou a cabeça. "Sei lá... Eu não tenho palavras."
Eu sorri. "Obrigada. Você também não está tão mal."
O terno que ele vestia lhe caía muito bem, e a gravata era linda.
"Vamos lá?" Eu perguntei.
"Sim! Meu Deus do céu, aposto que ninguém vai conseguir tirar os olhos de você esta noite..." Sorrindo, ele esticou o seu braço na minha direção e eu o segurei.
Uma vez do lado de fora, encontramos mamãe arrumando a gravata de papai enquanto ele dizia algo bem baixinho. Seu rosto de repente ficou sério, quando nos viu juntos. Depois que mamãe falou muito sobre minha aparência e o fato de estar orgulhosa por eu ter seguido os passos dela, todos nós entramos no carro.
Ela tentava sutilmente me perguntar se eu estava me sentindo bem depois que saí no meio do jantar de ontem, usando a desculpa de estar com meu fuso horário trocado. Eu sabia que no fundo ela só queria garantir se eu estava bem, não fisicamente, mas emocionalmente.
Todos evitaram ao máximo falar sobre o noivado na minha frente e adiaram o tema ao máximo que conseguiram. Eles pensaram que isso poderia me magoar de alguma forma, já que souberam alguma coisa sobre o que me havia acontecido há sete anos. Só não sabiam de tudo. Eles não sabiam exatamente o que tinha acontecido naquela noite.
O que eles também não sabiam é que eu já não era mais a mesma menina de quinze anos.
Eu iria enfrentar o homem que partiu meu coração anos atrás no dia em que ele iria anunciar o seu noivado com minha irmã diante do mundo. Mas eu estava bem. Já se passaram muitos anos desde então. Eu estava formada, tinha um namorado, segui em frente com a minha vida.
Depois de ontem à noite, eu não tinha visto mais a minha irmã. E, honestamente, eu não queria. Mesmo que eu não me importasse mais com o que aconteceu, ainda conseguia sentir a raiva e a traição que senti naquela noite. Depois de saber de tudo, como ela poderia vir anunciar seu noivado comigo como se nada tivesse acontecido?
Como é que ela foi capaz...
Eu sacudi minha cabeça, tentando esquecer o passado. Eu estava mais forte agora.
O passado já morreu e deve ser enterrado. Ela era minha irmã e no fim das contas eu deveria estar feliz por ela.
Afinal, já se passaram anos. Nós mudamos muito. Eu superei tudo isso.
Isso não me afeta mais. De jeito nenhum.
O carro parou bruscamente, e eu pude sentir o meu coração parando junto. Mamãe e papai saíram e Warner os seguiu.
Aqui vamos nós.
"Em?", Warner gritou, esperando por mim do lado de fora.
'Respire fundo, Em', era o que eu pensava enquanto minhas mãos agarraram o meu vestido. Meu coração palpitava no peito, eu podia sentir minha boca seca. Uma gota de suor escorria pela minha nuca.
Meu corpo parecia não me responder mais. Não conseguia mais me controlar.
"Querida? Vamos, Tess já está esperando por nós lá dentro", mamãe disse.
Eu consigo fazer isso. Nada aconteceu. Eu já segui em frente.
Dando a ela um aceno de cabeça, eu cerrei meus dentes e me movi ainda com os joelhos tremendo. Eu peguei o braço de Warner em um aperto firme enquanto meus olhos percorriam a enorme mansão que eu já não visitava há muito tempo.
"Você tem certeza disso? Você parece um pouco pálida", Warner afirmou quando cruzamos a soleira da porta.
A linha que não devo cruzar.
"Está tudo bem." Minhas unhas cravaram as palmas das minhas mãos de tanto nervosismo.
"Tem certeza?"
Eu assenti a cabeça, agarrando-o com mais força. Ele ficou trêmulo, mas não perguntou mais nada. Eu me senti grata por isso.
Eu o deixei me arrastar por meio daquelas pessoas todas vestidas com roupas caríssimas e sofisticadas. O salão era enorme e engolia a multidão. A decoração da festa mostrava que era a celebração de uma família influente. Elegante e, ao mesmo tempo, absolutamente deslumbrante.
Ao passarmos pela multidão que conversava e bebia, vimos Tess parada ao lado de alguns de seus amigos. Quando nos viu, ela interrompeu a conversa e correu na nossa direção, com a cauda do seu vestido prateado brilhante que se arrastava atrás dela. Tobias também a seguiu.
Se todos os seus amigos estavam aqui, isso significava que...
Puxei a minha mão do braço de Warner delicadamente e dei um passo para trás. Meus olhos observaram ao redor. Minhas pernas me incentivavam a correr. 'Devo voltar para a segurança do meu quarto, onde ele não consegue me encontrar. Ele, que eu enterrei no fundo das minhas memórias', era o que eu pensava.
"Oh meu Deus! Olhe para minha filha, você está tão deslumbrante!" A voz da mamãe estava em êxtase quando ela olhou para o papai. "Quando a nossa filha ficou tão grande, Wilson? Olhe para ela! Está usando um anel de noivado hoje!" Mamãe estava visivelmente emocionada.
Desviei meus olhos de seu anel por um instante e peguei uma taça de vinho da bandeja de um garçom que passava. Minha mão tremia enquanto segurava o copo.
Papai acariciou as costas de mamãe enquanto Tess revirava os olhos. "Mãe, não exagere, estamos apenas anunciando a nossa data oficial de noivado. Eu ainda não vou me casar esta noite!"
"Não ligue para sua mãe, ela só ficou um pouco comovida. Enfim, onde está o seu noivo?", papai perguntou, olhando ao redor.
"Oh, ele está ali!" Ela apontou em direção ao bar. Eu congelei naquele momento.
Lentamente, eu comecei a seguir o olhar de todos. Quatro homens estavam juntos, um deles estava de costas para nós.
É... ele está ali?
Sete anos. Depois de sete anos, eu estarei com ele cara a cara. Vou ter que olhar para aqueles olhos cinzentos tempestuosos...
Soltei um suspiro trêmulo e um pouco receoso. Eu precisava de ar, eu precisava sair dali.
Quando eu estava prestes a fugir, Tess gritou por ele.
"Caleb?"
Eu parei e me virei. Como assim Caleb?
Eu olhei na direção dele quando aquele homem se virou sorrindo largamente. Aproximando-se mais, ele beijou suavemente a bochecha de Tess e cumprimentou mamãe e papai.
Seus braços dados, olhando um para o outro com muito afeto... Pisquei algumas vezes para ter a certeza de que aquela era mesmo a realidade, e um suspiro silencioso escapou dos meus lábios.
Isso significa que Caleb era o noivo de Tess? O primo de Achilles?
Agora aquele 'V' em seu anel fazia sentido. 'V' significa Valencian. Caleb Valencian.
Parece que o mundo saiu de cima das minhas costas e uma pressão no meu peito desapareceu de repente, enchendo-o de ar. Eles não estavam juntos.
"Em? Emerald? É você?", Caleb perguntou, com os olhos castanhos cheios de alegria. "Oh meu Deus! É a malvada Emerald Hutton que nunca ligou para este pobre homem abandonado durante todos esses anos?"
Ele me fez sorrir. "Ei, Caleb."
Ele me envolveu em um abraço de urso. E não pude evitar retribuir seu carinho. Eu gostava dele como se fosse um irmão mais velho. Mas, no processo de me distanciar de Ace, cortei os laços com tudo e todos que tinham relação com os Valecian.
Ele se afastou e colocou as mãos nos meus ombros. "Alguém já lhe disse que você virou uma mulher muito bonita?"
Rindo, eu balancei minha cabeça. Ele continuava me abraçando e sorrindo. Alguns momentos se passaram.
"Se você parou de flertar com minha irmã, posso abraçá-la agora?" Tess ergueu a sobrancelha para Caleb.
Sorrindo, ele deu um beijo em sua têmpora. "Você sabe que eu só tenho olhos para você, não é, meu bem?"
Revirando os olhos, ela o empurrou e me abraçou. "Você está linda!"
"Você também", eu disse. Seu olhar cruzou com o meu. Algo próximo ao arrependimento transparecia dos seus olhos, e também uma coisinha a mais que eu não conseguia decifrar.
"Emerald, eu..."
"Bem! Acho que já é hora de dançar." Caleb interrompeu. Seu olhar para Tess não passou despercebido. O que está acontecendo? "Será que devemos?"
Piscando, Tess pigarreou. Ela sorriu e colocou a mão na de Caleb e juntos pularam para a pista de dança. Mamãe e papai ficaram ocupados conversando com outro casal.
O telefone de Warner tocou, interrompendo-o bem na hora em que ele ia dizer alguma coisa. Pedindo licença, ele se afastou para atender à chamada.
Tobias percebeu meus olhares cautelosos ao redor. Minha inquietação. "Relaxe, tudo vai ficar bem."
"O quê? Porque você disse isso?" Eu fingi que não entendi.
Ele suspirou, balançando a cabeça. "Nada. Você quer outra bebida?" Ele apontou para o meu copo que já estava vazio.
Não, fica aqui comigo. Eu queria dizer, mas decidi ir contra. "Certo."
Assentindo, ele foi ao bar buscar mais bebidas para nós.
Eu não precisava de ninguém para me apoiar. Eu poderia lidar com isso sozinha. Eu não era aquela adolescente ingênua que desabou apenas com um olhar.
De repente, o cabelo da minha nuca se arrepiou. Arrepios cobriram toda a minha pele.
Virando-me, observei tudo o que estava ao meu redor. Nada parecia incomum, estava tudo na mesma.
Então por que eu sinto que alguém está me observando?
Enquanto as luzes coloridas se moviam em torno da massa de pessoas que não se calavam, meu olhar foi para o primeiro andar e ficou preso lá. No canto mais distante, uma figura estava lá; seu rosto estava na sombra. Com as mãos nos bolsos, ele ficou imóvel, com seu corpo voltado para o meu. Mesmo que eu não pudesse ver seu rosto, eu poderia dizer que ele estava olhando para mim. E, por alguma razão, isso me deixou nervosa. Mesmo assim, eu não conseguia parar de olhar.
Quem é ele?
"Em?"
Pulando com o susto, me virei.
"Uau! Uau! Relaxe, sou só eu", disse Warner, erguendo as mãos.
Soltando um suspiro de alívio, me virei novamente. E ele se foi.
"Você está bem?"
"Sim, eu estou bem. Você só me assustou", respondi, sorrindo de canto de boca.
"Ok. Dança comigo?", ele perguntou, me dando sua mão.
Procurei Tobias. E lá estava ele, rindo com algumas garotas com os dois copos ainda nas mãos. Eu balancei minha cabeça em sinal de reprovação para o meu irmão.
Dando a Warner um pequeno sorriso, peguei sua mão.
Eu não queria ficar sozinha agora.
Uma vez na pista de dança, começamos a balançar sob as luzes fracas e a música lenta. E então eu senti de novo. Aquele olhar, o olhar ardente me observando de longe, como se seguisse cada movimento meu.
Warner colocou uma mecha atrás da minha orelha, mas meu olhar só conseguia se concentrar em procurar por algo na multidão.
"Em? Tem certeza que está bem? Você parece um pouco perturbada desde a noite passada." Ele franziu a testa.
"Sim, está tudo certo. Não se preocupe com isso. É só o jet lag", menti. Eu não queria. Mas eu não podia dizer a ele por que meus nervos estavam descontrolados desde que ouvi falar desta festa.
"Bem. Se você está dizendo. Mas você sabe que pode me dizer qualquer coisa que quiser, não sabe?"
Desta vez, meu sorriso foi genuíno. Eu acenei minha cabeça. "Eu sei disso."
Seus lábios se curvaram quando ele pegou uma das minhas mãos e beijou-a.
Uma garganta pigarreou nas minhas costas. "Posso ter a oportunidade de dançar com esta linda senhora?" Uma voz profunda e dura perguntou, com um sotaque grego distante.
Eu fiquei imóvel.
Warner olhou por cima da minha cabeça e seus olhos se arregalaram um pouco. Eu pude perceber que ele reconheceu alguma coisa enquanto um sorriso educado apareceu em seus lábios. "Certo." Afastando-se, ele olhou para mim. "Vou esperar por você no bar." E então ele desapareceu da pista de dança.
Não!
Eu queria dizer. Mas eu não conseguia me mexer ou dizer nada.
Eu nem sequer consegui me virar. Não ousei. Meu coração bateu acelerado quando senti aquele calor atrás de mim. Um par de mãos enormes e calejadas cobriu as minhas, colocando-as diante de mim, enquanto seus braços me envolviam. Um suspiro escapou dos meus lábios com todo aquele turbilhão de sentimentos que percorria todo o meu corpo.
Já que eu não me movia nem um milímetro, ele assumiu o controle e nos balançou de um lado para o outro com movimentos lentos. Aquela combinação inebriante da sua colônia exótica emaranhada com fumaça encheu todos os meus sentidos.
Ainda era o mesmo.
Meu cérebro simplesmente parou de responder.
O hálito quente fez cócegas no meu pescoço, e nesse momento minhas pernas ficaram bambas. Um misto de emoções veio à tona. Eu sentia algo apertar em meu peito enquanto uma respiração ofegante deixava os meus lábios.
Nós não dizíamos nada e apenas balançávamos ao som daquela música. Tudo o que eu podia ouvir era a música, minha respiração profunda e as batidas do meu coração que parecia saltar para fora do peito. Minhas mãos tremeram sob as dele.
Eu não poderia fazer isso. Eu não posso! Eu precisava sair dali!
Afastando seus braços, quando tentei me afastar, ele agarrou minha mão e me girou, puxando-me para perto de novo. Meu peito encostou completamente no corpo dele. Ofegante, quando olhei para ele...
Parecia que o ar não me chegava mais aos pulmões.
Aqueles olhos cinzentos tempestuosos.
Depois de sete anos, eu estava novamente frente a frente com eles. E era isso que eu temia. Eles ainda conseguiam me hipnotizar, assim como faziam há sete anos. Pareciam piscinas cinzentas que afogavam toda a minha alma. Seu rosto estava a poucos centímetros do meu.
Sem fôlego, observei o resto do seu rosto. E eu estava sem palavras.
Mandíbulas fortes, queixo proeminente, lindo nariz pontudo, lábios grossos e desejáveis e uma testa larga. Os cabelos pretos milimetricamente alinhados. Eram compridos, e as as pontas tocavam seu pescoço. Exatamente como um deus grego.
Desapareceu aquele olhar encantador de menino, tudo nele agora fazia lembrar um grande homem. Um homem poderoso e talvez um pouco áspero.
Eu não conseguia respirar, mas meu olhar não conseguia parar de olhar para aquele rosto. Eu não sabia que a idade deixava as pessoas tão bonitas. Não, bonito não era uma palavra suficiente. Palavras não poderiam descrever Achilles Valencian.
Ele estava...em outro nível.
Levantando a mão, ele afastou uma única mecha do meu rosto. Warner já tinha feito isso outras vezes, mas nunca conseguiu me arrepiar como Ace. Seus olhos percorreram cada centímetro do meu rosto, como se os quisesse decorar. Eles pareciam estar em algum tipo de transe. Como se ele não pudesse evitar, acariciou as minhas bochechas com as pontas dos dedos. Sussurrou alguma coisa que eu não entendi muito bem.
Inconscientemente, inclinei-me quando ele me tocava, enquanto meus olhos não deixavam de observar seu rosto. Minha pele pedia por mais, apenas aqueles braços fortes me segurando ainda não eram suficientes. Meu coração ansiava por algo enquanto se aquecia sob o seu olhar ardente.
O olhar que eu morria por desejar apenas por alguns segundos. Minha visão ficou turva com aquela carga de emoções que eu sentia.
Meu Ace...
Mas então sua voz quebrou meu transe, me trazendo de volta ao presente, ao mundo real.
"Ainda não quer falar comigo, Rosebud?" Seus olhos cinzas esbarraram com os meus turquesas.
Rosebud? Então ele ainda se lembrava de que alguém com esse nome existiu em sua vida?
Então ele também deve se lembrar da dor no coração que deu a essa menina há anos atrás.