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São Paulo
Dezessete de Maio de 2016
Uma nuvem cinzenta paira sobre a metrópole deixando-a ainda mais melancólica. Uma garoa fina cai banhando as ruas da cidade silenciosa.
Tudo parecia conspirar a favor para o quê iria acontecer nas horas seguintes, algo que mudaria completamente o curso da minha vida, mas nada poderia fazer. Já estava escrito, não é como poder escolher entre um copo d'água ou uma taça de vinho.
Não estava em meu domínio, eu deveria apenas aceitar o meu destino.
Fui desperto do meu devaneio ao ouvir os seus gemidos quase que inaudíveis invadir os meus ouvidos. Meu coração estava dilacerado, minha pulsação batia acelerada, a respiração ofegava, aflito, angustiado. Eu gostaria de poder transferir todo o seu sofrimento para mim.
Angel, o amor da minha vida, a mulher a quem escolhi para viver por todos os meus dias, estava ao meu lado, frágil como um cristal, se doando ao máximo para trazer a nossa pequena ao mundo em segurança.
Eu a fitei sem saber o quê dizer, ou fazer. Tudo era novo para ambos. Eu deixei a nossa casa como um louco, eu não tive cabeça para pensar em avisar a alguém, mas o quê poderiam fazer? São momentos como este que nós percebemos que não, não temos controle sobre tudo.
Nem tudo estava ao nosso alcance, e o importante era deixá-las em segurança, e quando tudo estivesse sobre controle, eu os avisaria. Eu só gostaria que isso acontecesse logo, não suportova vê-la sofrer tanto.
Eu não havia me preparado para toda aquela tensão, sentia-me sufocado com a ansiedade que me consumia. Deus, eu tinha a impressão de que estava morrendo lentamente.
Levo meu ante braço à testa, secando uma fina camada de suor que se formara ali, ignorando a noite gélida que envolvia a cidade.
Desviei minha atenção da estrada por alguns segundos e voltei para o anjo que se contorcia ao meu lado sobre o banco do passageiro, seu rosto estava banhado por partículas de águas cristalinas, seus cabelos de fios longos e dourados iguais a de um anjo, a minha Angel, estavam desgrenhados. O seu rosto e lábios estavam avermelhados, a deixando ainda mais linda. Eu era um homem de sorte por tê-la ao meu lado.
Pousei os olhos sobre sua barriga que abrigava a pequena Luna, a minha princesa. Parecia agitada, tornando o momento ainda mais difícil para ela.
O meu coração batia acelerado tomado por mistos de sensações, emocionado pelo momento, muito angustiado por presenciar todo o seu sofrimento sem que nada eu pudesse fazer.
- Luna, meu amor, não faça a mamãe sofrer tanto. - peço como se o meu pequeno anjo já pudesse me ouvir. Ede alguma forma eu creio que sim, ela podia.
Sorri para a mulher que mesmo, não estando em seu melhor estado, ainda assim, mantinha nos lábios o sorriso que eu tanto amava. Sincero e afável.
- Nós já estamos chegando, meu amor, aguenta só mais um pouco. - com uma das mãos livres, eu segurei a sua, molhada, fria e trêmula. Ela retribuia o gesto com um fraco aperto.
Eu a conheçia o suficiente para saber que ela só estava querendo me tranquilizar, e eu a deixaria que pensasse que conseguiu esse feito.
- Eu amo você! - balbuciou fazendo aquecer o meu coração. Enguli um nó que se formou em minha garganta. Tão forte e ao mesmo tempo tão frágil.
- Eu te amo mais. - minha voz soou embargada, não o suficiente para que ela percebesse. Apenas sorri, mas já o fazia sem força.
-Fique comigo, amor, nós estamos chegando.
Eu retribui o sorriso para lhe tranquilizar enquanto pisava o pé no acelerador.
Toda a angustia em ver a mulher da minha vida em sofrimento tomou o lugar da felicidade que deveria estar sentindo naquele momento.
Luna não havia sido só desejada por mim e por Angel, mas por toda nossa família.
Primeira filha, a primeira neta dos meus sogros e dos meus pais, a primeira afilhada e sobrinha. Seria amada e mimada por todos, mas a angústia que me consumia impediu que eu pensasse em todos os planos que fizemos para a sua chegada. Algo me dizia que este dia me marcaria pelo resto da minha vida e não é só pelo momento do seu nascimento.
- Ah, Gabriel! - um grito gutural saiu do fundo de sua garganta, invadindo os meus sentidos me quebrando por inteiro.
- Nós estamos chegando, meu amor, nós estamos chegando.
Horas depois...
Maternidade São Lucas
Eu não sei quanto tempo passou desde que Angel foi levada pelo corredor onde agora eu me encontro, sentado em um banco em madeira, duro e frio, a espera de que alguém apareçesse e me trouxesse alguma notícia sobre as minhas meninas que pudesse acalmar meu coração.
As horas se arrastavam o que me levara a acreditar que nada saiu como o planejado. Não precisou que ninguém me disesse, eu sentia, no corpo e na alma. Me impediram de estar ao lado dela, e pensar que algo de ruim pudesse acontece-las, meu Deus, não queria nem pensar.
Eu fitei em meu relógio de pulso.
Eram exatamente 06:09 da manhã. Por fim, eu decidi que era hora de ligar para meus pais. Eu precisava deles ali, da minha base, do meu tudo. Não sabia o quê fazer, estava perdido, aflito, sozinho e com um incomodo no peito sufocante.
Penetrei os meus dedos por entre os cabelos e os puxei com tamanha força em um gesto desesperado que senti o couro cabeludo arder seguido latejar.
A dor que essa fricção causou em meu couro cabeludo não chegou nem perto do aperto misturado aos batimentos cardíacos acelerados.
Eu me sentia impotente, mãos e pés atados sem poder nada fazer.
Eu deveria estar lá dentro, estar naquela sala ao lado da minha mulher, o amor da minha vida, vendo a nossa princesa chegar ao mundo para que ela soubesse que estavamos ali para ela e por ela, como nós planejamos durante todos esses meses. Mas não sei por qual razão este momento me havia sido tirado, e só o que me restava era esperar...
Algumas horas depois...
Senti alguém sentar ao meu lado.
Ergui os olhos e fitei o homem por quem eu tenho muito orgulho, o seu olhar complacente é a minha força.
Nós eramos tão parecidos tanto em personalidade quanto em aparecia física. Apaixonados por nossas famílias sempre prontos para defende-los.
- Pai! - funguei. Me joguei em seus braços. Ele não se faz de rogado e retribui o gesto, e é aqui que eu me sinto seguro, é aqui o meu abrigo.
- Oi, filho. - ele me abraçou forte.
Eu sou grato ao senhor João, meu pai, pelo homem no qual eu me tornei. Sem ele e mamãe, eu e Gio nada seríamos.
- Oi, querido. - mamãe se juntou a nós se colocando ao meu lado.
- Oi, mãe. - me afastei do abraço de papai e me virei para ela, a cumprimento com um beijo no rosto.
Ela carinhosamente deslizou suas mãos macias e de unhas bem cuidadas por sobre o meu rosto, secando as lágrimas que deslizou por ali, em seguida de me envolver em seus braços como fazia quando éramos crianças e nos sentíamos com medo de algo.
- Você tem alguma notícia?
- Nada. Levaram ela lá para dentro e eu não soube mais de nada. - digo frustrado
- Estou no escuro.
- Não se preocupe, meu bem, vai dar tudo certo. - entrelaçou os seus dedos aos meus e levou minha mão até os seus lábios, depositando um beijo carinhoso ali.
- Eu sei que vai, mamãe. - fiz sinal com a cabeça em concordância. Gostaria de estar mais confiante do que as minhas palavras proferem.
- Mano. - olhei em direção ao corredor e vi minha irmã caminhado apressadamente sem perder a sua elegancia sobre os seus saltos altos em nossa direção.
- Bom dia papai, mamãe. - ela os cumprimentou.
Em seguida, se encaminha na minha direção. Ao se aproximar, abaixa na minha frente, como quando era criança e se sentia ameaçada.
Envolveu os seus braços em volta da minha cintura, me abraçando forte. Beijo o topo de sua cabeça carinhosamente, e a envolvi em meus braços em um abraço apertado.
- Bom dia, mano - sua voz soou abafada e embargada sobre o meu peito.
- Bom dia, querida. - acariciei os seus cabelos sedosos. Gio tem muitos defeitos, mas nenhum deles encobre a mulher linda, carinhosa, gentil e humana que sempre fora.
- Porque não nos avisou que estavam na maternidade desde a madrugada? Eu teria vindo na mesma hora. - disse enquanto se afastava. Disfarçadamente seca uma lágrima solitária que escapara.
- Tudo aconteceu de repente, eu tive que sair às pressas, não deu tempo de ligar para ninguém. - suspiro ao recordar todo o meu desespero. - Estava muito aflito, não sei como consegui chegar até aqui sem provocar algum acidente.
Ela assentiu com a cabeça, voltando a me fitar com aqueles pequenos e expressivos olhos azuis que tanto amo.
- Foi Deus quem os guardou irmão. - diz convicta de sua fé. - Não percamos a esperança, vai ficar tudo bem. - positiva como sempre.
- Eu sei que vai. - digo tentando convencer mais a mim do que a ela mesmo. Acariciei o seu rosto delicado, alvo como a neve, parecendo uma linda boneca de porcelana.
- Dona Renata e o senhor William estão vindo. - fez um pequeno gesto com a cabeça em direção ao corredor de onde vem o som dos saltos da mulher elegante que gerou o amor da minha vida.
- Gabriel. - me levanto. Dirijo-me em direção aos meus sogros. Era visível a tensão que emanava de seus corpos.
- Oi, dona Renata. - a cumprimentei com um beijo no rosto e um breve abraço.
- Como você está, querido? Tem alguma notícia das meninas?
- Ainda nada. Estou aqui desde a hora em que a levaram para o centro cirurgico.
- Como está, Gabriel? - Sr. William me cumprimenta com um forte abraço.
- Ansioso para ver o rosto da nossa pequena.
- Vai dar tudo certo.
- Estou confiante.
- Oi, Gabi. - Amanda, irmã mais nova de Angel, que até então não havia notado a sua presença, se aproxima, me abraçando por mais tempo do que eu gostaria.
Nunca gostei da maneira em que ela me olhava ou se dirigia a mim. Um olhar com segundas intenções, palavras com duplo sentido, uma tremenda falta de respeito. Além de ser uma criança que havia acabado de completar os seus dezoito anos, era irmã da minha mulher. A mulher que eu amava, quem escolhi para ser a mãe dos meus filhos.
- Reze para que elas fiquem bem. - minha voz soa ácida. Eu a afastei deixando com uma expressão de desgosto estampada na cara.
Todos se cumprimentavam cordialmente inerte ao que acontecia a sua volta, mas Gio era astuta e conhecia bem as investidas de Amanda sobre mim. Sutilmente ela se aproximou para me livrar do importuno.
- Oi, Amanda, faz tempo que não te vejo. - ela me lançou um olhar solicito acompanhado de uma piscadela marota. Sorri com o canto da boca em agradecimento.
Gio a distraía enquanto me afastei sem que notasse, voltando a tomar meu lugar no banco. Não estava com cabeça para as chatices de Amanda.
- Bom dia, bom dia. - olhei em direção ao corredor onde alguns minutos atrás meus sogros adentraram e vi o meu amigo Ricardo se aproximar, cumprimentando a todos.
- Oi, cara! - me levantei novamente. Ele vem ao meu encontro, o abraçando forte, enquanto me dá o seu costumeiro tapa nas costas. O seu abraço é reconfortante e me trás paz.
Ricardo é o meu melhor amigo, mas euo amo como um irmão.
Lembro-me do dia que nós nos conhecemos.
Estavamos no primeiro ano da faculdade, o primeiro dia de aula.
Estava a procura do meu nome na lista da secretaria, me sentia perdido e ele também.
Trocamos algumas palavras, fizemos comentários sobre a organização do prédio e nos apresentamos. Desde então nos tornamos amigos. Ele sempre esteve presente na minha vida e da minha família.
Somos cúmplices, parceiros de longa data. Nada e ninguém pode abalar a nossa amizade e o respeito que temos um pelo outro, nem mesmo o breve relacionamento fracassado que tivera com Gio.
Eu amo minha irmã mais que a minha própria vida, é fácil ama-la, é um laço fraternal. Ela é parte minha, tem o meu sangue, eu a amaria de qualquer forma.
Mas com Ricardo é diferente, as poucos fui conhecendo mais dele e de sua triste história e isso nos aproximou ainda mais, eu tenho como o meu irmão, irmão que o coração escolheu e a vida me deu.
- Obrigado por vim, cara. - nós nos afastamos do abraço.
- Sério? Achou mesmo que eu o deixaria neste momento?
- Não. Claro que não. Eu nem sei porquê disse isso.
- Ótimo. Tem alguma notícia? - voltei a me sentar no banco, ele me acompanhou.
- Nada ainda, está foda essa espera.
- Realmente está, você está até falando palavrão. - só me dou conta do que fiz quando ele me alertar. Rimos. Ele tem esse poder de me distrair.
- Vamos pensar positivo, vai dar tudo certo.
- Sim, eu sei que vai.
Inclinei a cabeça fitando meu pai que se aproximava.
- Filho, eu vou pegar um café, quer alguma coisa? - em um gesto reconfortante, pousa uma de suas mãos sobre as minhas costas e a outra sobre o meu braço, que descansava sobre os joelhos.
- Não pai, obrigado. - franzi os lábios, numa tentativa falha de sorri.
- Você precisa comer alguma coisa, ficar sem se alimentar não irá lhe ajudar em nada, você precisa estar forte para a sua família, filho.
- O seu pai tem razão, Gabi. - insistiu a
minha sogra que se juntou a nós.
- Você precisa comer, sabe como Angel fica toda preocupada quando você não se alimenta. Ela não vai gostar nada de saber que ficou todo esse tempo aqui sem se alimentar - ela respira fundo visivelmente cansada. - Beba um suco pelo menos.
- O seu pai tem razão, querido. - mamãe se aproxima sobre seus saltos elegantes e se senta no banco livre ao meu lado.
Desliza sua mão por entre as minhas tranquilizando-me.
- Vamos lá, cara, seu pai tem razão.
- Eu agradeço a todos pela preocupação, mas só irei conseguir comer ou beber alguma coisa após vê-las e constatar que está tudo bem com minhas pequenas. - minha voz soa embargada.
- Mas...
- Por favor, mãe, não insista.
- Como quiser, filho. - papai diz e respira fundo. Se dá por vencido e não mais insiste. Beija o meu rosto, e em seguida se levanta pronto para seguir seu caminho.
- Ricardo, filho, você quer alguma coisa?
- Não, obrigado, senhor João. Quando eu convencer o cabeça dura a sair para comer alguma coisa, eu o acompanho.
- Faça isso.
- O doutor está vindo. - alguém diz.
Num sobressalto me coloquei de pé.
- Onde está o doutor Geraldo? - minha sogra questiona.
- Liguei para ele lhe avisando do nascimento da Luna, mas ele está fora da cidade, ela nasceu antes da data prevista.
- Oh! Que Deus guarde a nossa filha, William. - abraçou ao marido que a confortou.
O homem negro, de baixa estatura, cabelos grisalhos, vestido em seu jaleco branco com o seu nome bordado acima do bolso esquerdo, Dr. Camillo Bacci, caminha em nossa direção.
Fui ao seu encontro.
- Então, doutor? Como elas estão? Eu já posso vê-las? - digo ao me aproximar.
- Bom dia, pai. - estende a mão em em um cumprimento breve e gentil.
- Boa tarde, doutor, desculpe minha falta de educação, sou Gabriel Barreto e...
Um sorriso simpático dançou em seus lábios.
- É compreensível. Eu sei o quanto estão ansiosos por notícias.
- Nós queremos saber como está a nossa filha e a nossa neta doutor. - Renata pergunta. É visível o seu nervosismo.
Todos nós estamos.
- O bebê nasceu saudável, forte e passa bem, está sendo preparada para ser levada ao berçário, logo todos vocês poderão vê-la. - ele volta sua atenção para mim. - Parabéns, pai, é uma linda menina. -o meu coração fica parcialmente aliviado. Ainda me faltava receber notícias de Angel.
- Que ótima notícia. - meu sogro comemora.
- Graças a Deus. - minha mãe diz aliviada.
- Parabéns, cara! - Ricardo me dá um forte abraço. Em seguida sou parabenizado por todos e não demora para que a sala de espera se torne uma grande festa. Eu não poderia estar mais feliz.
Nós sonhamos durante muito tempo com este momento. E hoje, meu Deus, hoje, Luna, a prova do nosso amor, está aqui. E eu não posso só senti-la, mas eu também posso tocá-la. Pareço estar vivendo em um sonho.
Mas nada havia me preparado para o quê viria a seguir. Eu poderia esperar tudo, menos que o meu mundo desmoronasse sobre minha cabeça.
- Doutor, e como está a minha esposa? Ela está bem? Quando eu poderei vê-la? - volto a lhe dedicar a minha atenção.
Um minuto do seu silêncio fora o bastante para meu peito ser acometido pela mesma angústia que me acompanhou desde o momento em que Angel entrara em trabalho de parto.
- Doutor?
- Pai, eu sinto muito. - um silêncio sepulcral se instalou na sala tornando o lugar ainda mais frio.
- Sente o quê? - pergunto confuso.
- Gabriel, sinto muito. Nós todos fomos pegos de surpresa.
- Poderia ser mais específico, doutor? - digo entre dentes.
- O parto de Angel teve complicações. - ouve-se um clamor geral. - A sua pressão arterial subiu e a sua esposa teve uma eclâmpsia durante o parto, e não resistiu. Nós fizemos tudo o quê podíamos, mas ela...
Dali por diante não ouvi mais nada do que ele disse.
Tudo a minha volta era inaudível.
Meus pais, minha irmã, o meu melhor amigo, todos não passavam de um borrão diante das minhas vistas marejadas.
Meu mundo havia ruído, eu senti o chão se abrindo debaixo dos meus pés, e eu em queda livre caí dentro de um poço sem fundo, escuro, como uma noite sem luar.
Eu não acreditava que a minha Angel havia me deixado. Um vazio tomou lugar de um coração que batia cheio de alegria, minha vida não fazia mais sentido.
Descontrolado, bato com a minha cabeça de contra a parede, como se uma caixa se rompesse dentro dela e um filme de toda a nossa vida juntos se passava diante dos meus olhos.
As lágrimas de felicidade foram substituídas pelas as de tristeza e tudo dentro de mim, sufocava, a dor é amarga como fel.
- Ah! - grito para desatar o nó que se forma em minha garganta.
Me abaixo ali mesmo sem forças para me mover para qualquer lugar que fosse. Eu sinto alguém se aproximar.
O meu amigo. O reconheço pelo seu perfume, e antes que se coloque ao meu lado, me levanto, chorando compulsivamente. Tudo o quê havíamos planejado fora por água abaixo. Difícil acreditar que nada mais existiria.
A raiva percorre nas minhas veias e faz com que eu perca a cabeça e dou um soco na parede a minha frente.
- Eu vou deixa-los a sós, logo uma enfermeira vem para levá-los até o berçário e precisamos que alguém seja responsáveis pelos trâmites legais do corpo.
- Claro, doutor. - ouço Gio se pronunciar.
- O quê fizeram com ela! Vocês a mataram, vocês mataram minha mulher, eu a quero de volta! - meu peito doía de uma maneira que eu nunca sentira antes. O ar me faltava.
- Sinto muito pela sua dor, mas nós fizemos tudo o quê podemos.
Vou deixa-los a sós, quando quiser podemos conversar. Com licença. - ele sai deixando o meu mundo ruído.
Sentei no banco, Gio se colocando ao meu lado. Nada se ouve além de murmúrios e choramingos.
Eu estava perdido, não sabia o que fazer. Uma criança para cuidar. Tantas perguntas sem respostas.
Eu não sei por quanto tempo fiquei inerte em meus pensamentos.
- Gabi, precisamos reconhecer o corpo. - a voz da minha irmã me resgatou do meu mundo sombrio.
Eu a fitei, e a expressão em seu rosto é uma só: dor. Ao lado do meu melhor amigo que lhe consolava dentro do seu abraço, ela me encorajou com um breve aceno de cabeça.
- Claro! - minha voz soa firme quando a verdade era que eu gostaria de fugir dali.
Me trancar dentro de um quarto escuro e nunca mais sair. Mas eu não poderia me acovardar, tinha um pequeno ser que dependia de mim, e que não tinha culpa alguma pelo que havia acontecido. Assim como ela precisava de mim, eu também precisa dela como força para seguir.
- Onde estão todos? - olho em volta.
- Foram ver Luna. - sua voz soa falha, funga.
- Meu Deus, a minha filha. - saí apressado pelo corredor por onde o médico havia levado sem saber que caminho tomar. Gio e Ricardo vem no meu encalço.
- Gabriel, onde você vai?
- Eu quero ver a minha filha. - paro bruscamente ofegante.
- Vamos, eu vou te levar até ela.
(...)
Ao sairmos do elevador, em poucos passos estávamos ali em frente ao berçário grande e muito bonito.
Fito aos meus pais e aos pais de Angel que apenas me olhavam.
Eu caminho até me aproximar
da vidraça que nos separava.
Haviam três bebês com ela, todos tão pequenos e frágeis. Não demorou a minha busca por ela, eu a conheceria em meio a dezenas de bebês: loirinha, gordinha, dormia tranquila.
O meu coração encheu de esperança - de novo, olhar Luna ali só me mostrou que eu iria conhecer um amor diferente. Mas era o amor mais lindo que eu poderia sentir.
Minha Luna.
Linda como a mãe.
Eu me senti sendo puxado de volta do poço que minutos atrás eu havia caído. Ela me salvou, Luna me salvou.
Meu raio de sol, eu prometo te amar, cuidar de você e te proteger por todos os dias da minha vida e enquanto eu viver.