A mulher, que descobri se chamar Ana, não quis me dizer o nome e nem mostrar a foto do rapaz, tudo o que eu tenho é um pedaço de papel com o sobrenome dele: "senhor Duarte", e uma instrução simples: dirigir-me à recepção. Com o coração palpitante, agarro-me à coragem e adentro o estabelecimento.
O piso de mármore sob meus pés ressoa cada passo meu pelo luxuoso hall de entrada, e luto para camuflar minha ansiedade. Aproximando-me do balcão, a recepcionista muito elegante usando um terninho cinza me atende muito educada. Pergunto pela reserva no nome do meu "cliente" -acho melhor tratá-lo assim, não quero apegar-me a ele-, o senhor Duarte.
- Por aqui, senhorita - ela diz com uma voz serena, conduzindo-me por entre mesas meticulosamente arranjadas até uma localização privilegiada ao lado de uma ampla janela.
A cada passo, meu coração acelera, minha respiração se torna mais ofegante e gotículas de suor começam a escorrer por minha nuca. O homem está com o rosto virado para a janela, sem notar nossa aproximação.
- Senhor Duarte? - A recepcionista o chama.
O homem vira o rosto em nossa direção e ao pousar os seus olhos -de uma tonalidade de azul tão profundo e gélido- em mim, sinto um calafrio percorrer a minha espinha tensionando todos os meus músculos.
Essa não, essa não! Que merda! O meu cliente tinha que ser logo ele, o ogro.
A surpresa me golpeia com a força de um trovão, misturando temor e incredulidade, enquanto me vejo diante da última pessoa que esperaria encontrar -reencontrar- no mundo.
Não, não, não, mas que droga! Entre tantos homens neste mundo, por que tinha que ser justamente ele? Desde o primeiro momento em que nos conhecemos, eu o chamo de ogro. Seu nome? Não sei, mas agora sei o seu sobrenome, ótimo.
- O que está fazendo aqui? - Ele questiona, sua expressão de poucos amigos, os olhos penetrantes azuis como gelo.
Sento meu estômago revirar e meu coração acelerar. Não posso acreditar que, entre todas as pessoas possíveis, é ele quem estava ali.
- O ogro continua de mau humor - falo e revirei os olhos. Merda, escapuliu. A frustração era evidente na minha voz.
- Sua fedelha... - Ele começa, mas não espero para ouvir o resto. Viro-me de costas e começo a me afasta da mesa, meu corpo inteiro tremendo com um misto de emoções que eu não sei descrever nesse momento.
Antes que eu consiga chegar à porta, uma mão grande e firme segura meu antebraço, me fazendo parar. O toque é quente, mas a intenção claramente não era amigável, mediante a hostilidade de seu aperto.
- Você é a senhorita Martins? - Ele indaga, sua voz baixa e ameaçadora. Puxo meu braço para fora do seu aperto, sentindo uma onda de adrenalina misturada com raiva se espalhar em meu corpo.
- Para que quer saber, seu troglodita? - Retruco, tentando manter a compostura enquanto meu coração golpeia descontroladamente em meu peito.
- Como conseguiu marcar um encontro comigo? - Ele pergunta, seus olhos agora fixos nos meus, como se tentasse desvendar meus segredos.
- Eu não sabia que era você - respondo, minha voz carregada de desdém. - Jamais iria querer um encontro às cegas com um ogro feio como você - provoco.
Seus olhos se estreitam, e ele dá um passo à frente, a raiva pulsando em seu olhar.
- Não pensei que passaria de mendiga para rameira em tão pouco tempo...
O calo com um tapa estalado na cara, o som ecoando pela restaurante. Minha mão arde, fecho-a em punho para conter um pouco do ardor, a raiva me ajudando a ignorar.
- Não vou aceitar nem mais um insulto seu - declaro, minha voz firme. - Lave a sua boca antes de falar comigo.
Sinto todos os olhares sobre mim, mas não me importo. Sei que fui alugada para "amar" esse cara, mas não vou permitir que ele me desrespeite assim.
Mais uma vez, viro-me de costas e retorno para o caminho de saída. Cada passo parece uma eternidade, e meu corpo está tenso. No entanto, antes que eu alcançasse a porta, uma tontura me atinge. Minhas vistas escurecem, e todo o meu corpo fia leve, como se eu estivesse caindo lentamente.
Antes que eu perca todos os sentindo, sinto o meu corpo ser amparado por braços fortes, que erguem o meu corpo; minhas pálpebras estão quase fechadas, mas tento ver quem me salvou. Seus olhos azuis encontram-se com os meus, e diferente de segundos atrás, não estão frios e vários.
Sem forças para me manter desperta, meus olhos se fecham, mas as lembranças do dia que conheci esse homem dançam em minha mente, com imagem e detalhes vividos. E aquele dia de segunda-feira começou assim.