Capítulo 5 Amor quase impossível - Serena Alves

Foi na minha festa de quinze anos que Alex chegou ao seu limite.

Ele tinha completado vinte e um anos no mês anterior, estava no terceiro período da faculdade de Engenharia e Marcelo costumava reclamar do fato de Alex não sair à noite, nem levar uma namorada para casa.

Para mim era um alívio, pois esperava, a qualquer momento, que ele se interessasse por uma daquelas futuras engenheira, advogadas, médicas ou qualquer universitária tão mais velhas e experientes que eu.

Eu me sentia ridícula em um vestido de seda branca, no melhor estilo Cinderela, cujo príncipe lhe era proibido; provavelmente me sentia pior que as 14 colegas com vestidos iguais em tom de rosa claro.

Elas, pelo menos, não eram o centro das atenções. Odiei ver Clara, minha melhor amiga, dançar a primeira valsa com Alex; ele usava um smoking, parecendo, mais do que nunca, um príncipe encantado de contos de fadas.

- Eles formam um lindo casal. – Comentou Marcelo, ao perceber meu olhar, enquanto deslizávamos pelo salão de danças, sob o olhar orgulhoso de minha mãe.

Era tudo o que eu não precisava ouvir.

Comecei a imaginar, e que imaginação fértil se tem aos quinze anos, Alex ajeitando uma mecha dos cabelos loiros de Clara... Deslizando o polegar sobre seus lábios... Beijando-a...

Quando a valsa terminou, lancei um último olhar ao casal e, forçando um sorriso, fiz uma reverência, como fora exaustivamente ensaiado e fugi discretamente para o jardim nos fundos da casa.

Sentia as lágrimas quentes correrem pelo meu rosto, algo doía em meu coração, mas sequer me passou pela cabeça que aquela emoção sufocante, dolorosa, fosse apenas ciúmes.

Havia uma fonte iluminada no centro do jardim, mas preferi seguir até um banco de madeira, desses antigos, escondido sob um frondoso abacateiro. Aquele era meu canto favorito no quintal.

Sentei-me, secando os olhos com cuidado para não estragar ainda mais a maquiagem. Eu sabia que acabaria tendo que voltar para a festa, por mais que isso fosse doloroso.

A imagem de Alex e Clara deslizando pelo salão e dos dois sorrindo um para o outro me torturava.

"Por que não?" Tentei pensar, racionalmente. "Ela é linda, meiga, inteligente e ele... É livre..." Engoli em seco, amaldiçoando minha própria hipocrisia. "Se ele fosse meu irmão de verdade, eu seria a primeira a apoiar um namoro entre eles... Então por que dói tanto?" Mordi o lábio inferior com força, para me impedir de gritar.

Como ele podia estar se divertindo enquanto eu sofria daquela forma?! Como a vida podia ser tão injusta?! Junto com a vontade de gritar veio uma onda de raiva dolorida.

- Cristy? – Ainda que ele não tivesse usado o apelido que era só nosso, eu estremeci por reconhecer o som rouco e doce de sua voz.

- Volte para a festa, Alexandre. – Retruquei. Não olhei para ele, mas pude sentir sua surpresa diante do meu tom frio.

- Você está bem? – Ele insistiu. – Vi quando saiu e fiquei preocupado. – Levantei a cabeça e o encarei. Talvez alguém algum dia possa me explicar como se pode ser coerente e adolescente ao mesmo tempo. Eu, sinceramente, até hoje não sei.

- Antes ou depois de se assegurar que sua acompanhante estava se divertindo? – O espanto dele me irritou ainda mais. – Vá embora! Quero ficar sozinha! – Exclamei furiosa, mas ele se aproximou e parou diante de mim. Parecia incrédulo e aborrecido.

- Do que está falando? O que houve com você? – De pé eu mal chegava à altura de seus ombros e tinha que erguer a cabeça para fitá-lo, sentada, como estava, fui obrigada a me inclinar para trás, apoiando-me em um dos braços.

- Estou falando de você e da doce Clara! – Uma pontada de remorso me atingiu quando pronunciei o "doce" num tom sarcástico; eu não podia negar que o adjetivo era perfeito para minha amiga.

- Você está louca? – Sua voz continha um misto de raiva, incredulidade e mágoa; com as mãos em meus ombros, ele me forçou a levantar e me encarou com os olhos azuis reluzindo de fúria. – O que eu fiz, além de cumprir o meu papel, para você agir assim?! Vesti essa roupa incômoda, ensaiei essa porcaria de valsa, suportei cada momento para que você tivesse a festa dos seus sonhos! Por que está agindo assim?! – Senti as lágrimas voltarem e quando respondi, minha voz saiu trêmula.

- Se fosse a festa dos meus sonhos... Eu teria dançado com você! – Ele entreabriu os lábios para dizer algo, mas um brilho de compreensão iluminou seus olhos.

- Você está com ciúmes! – Concluiu, com um misto de culpa e júbilo. Estremeci ao concordar intimamente e Alex tocou meu rosto. Uma sombra escurecendo seu olhar.

- Alex, eu sei que não tenho direito... – Seus dedos tocaram meus lábios.

- Não, você não sabe... Cristy... Minha adorada Cristy... Não há motivo para isso... Você não sabe que não suporto a ideia de ter outra garota em meus braços? – Ele envolveu minha cintura e meus braços contornaram seu pescoço. – Não sabe que também me tortura o medo de que conheça outro cara e...

- Nunca! – Afirmei, cheia de convicção.

- Você não sabe, não é minha feiticeirinha?

- O que, Alex? O que é que eu não sei? – Ele colou seu corpo ao meu e um arrepio percorreu minha coluna.

- Não sabe que eu te amo desesperadamente? – Meu pobre coração vibrou com aquelas palavras e, pela primeira vez, tomei a iniciativa e beijei-o com uma paixão até então desconhecida em mim.

Foi minha língua que procurou a dele, foram meus dedos que se embrenharam em seus cabelos, foi a pressão da minha mão que manteve sua boca contra a minha e foi meu corpo que se pressionou contra o dele com ânsia.

Dessa vez o gemido veio de sua garganta e foi Alex quem estremeceu. Eu me sentia linda e poderosa ao perceber que podia deixá-lo dominado pela paixão.

- Eu amo você. – Sussurrei deslizando os lábios pelo rosto bem barbeado, até sua orelha. – Eu amo você. - Repeti baixinho e Alex estremeceu mais uma vez, antes de me enlaçar pela cintura puxando meu corpo contra o seu e me beijar intensamente.

- Alex o que pensa... – A voz de Ricardo foi como uma ducha fria sobre ambos, nos afastamos assustados. – Cris? – O choque pareceu deixá-lo sem fala por um momento, antes que ele se voltasse para o irmão. – Você está louco?! – Exclamou, indignado, fitando a ambos com fúria.

- Rick... A gente se ama. – Declarei meio destemida, meio receosa.

- Então, "vocês" estão loucos! Alex, como pode fazer isso com papai? O que acha que Vivian diria se os pegassem em flagrante? Devem saber que eles os veem como irmãos, que esperam que sejamos como irmãos! – Eu podia sentir as palavras de Ricardo como golpes físicos e doía ainda mais ver como elas atingiam Alex.

- Rick... – Ele ameaçou falar, mas o irmão levantou a mão, interrompendo.

- Droga, somos uma família agora! Vocês não podem achar que o casamento deles vá sobreviver a um golpe desses! – Os olhos de Ricardo brilhavam intensamente com as lágrimas contidas; ele inspirou profundamente e encarou Alex. – Ela só tem quinze anos, seu filho de uma...! – Gritou, num tom acusatório e Alex se afastou ainda mais de mim.

- Alex... – Chamei, mas ele balançou a cabeça de um lado para o outro, como se acordasse de um pesadelo. Quando finalmente olhou para mim, seus olhos estavam turvos de dor.

- Sinto muito, Cristy, muito mais do que pode imaginar. – Com essas palavras deu as costas e se afastou. Os ombros caídos, a cabeça baixa, ele era a própria imagem da derrota.

Lembro-me de ter coberto minha boca com a mão para me impedir de gritar; parecia que alguém rasgava meu coração em pedaços e a dor era tão física quanto emocional.

- Cris... – Senti a mão de Ricardo sobre meus ombros e me afastei bruscamente, a dor se transformou em uma raiva cega.

- Não me toque! – Exclamei, me afastando dele. - Eu odeio você. – Declarei, num tom baixo, mas algo em minha voz ou em meus olhos o fez empalidecer.

- Cris, me escuta...

- Nunca vou perdoá-lo por isso, Ricardo. Nunca vou perdoá-lo por qualquer coisa que aconteça daqui para frente. Nunca. – A dor dentro de mim se cristalizou, como uma farpa de gelo que ficaria ali por muito tempo, ferindo meu coração a cada momento.

Ricardo não disse nada, apenas se afastou, me deixando sozinha.

                         

COPYRIGHT(©) 2022