Capítulo 3 Vá chamar o príncipe

tropeçando na terra do campo de treinamento. Foi então que os sorrisos começaram a se dissipar do rosto dos espectadores e um silêncio terrível se fez presente. Chauvin tava Orlant, de cara vermelha e humilhado. – Você vai para a forca – disse Chauvin. – Você vai para a forca. Você não é ninguém. Eu sou da família de um conselheiro. – Vá chamar o príncipe – disse Orlant. O príncipe estava acima de Chauvin e provavelmente foi só nisso que Orlant conseguiu pensar. Jord foi retirado do pátio pela Guarda do Regente e, quando percebeu, estava dentro de uma c ela cujas dimensões eram diminutas.

Ali, ele se sentou de costas para a parede, os braços cruzados em cima dos joelhos. Conseguia enxergar o corredor do lado de fora da cela e as escadas, um pouco mais adiante, onde a luz perdia força, a tarde virando noite. Ele não conseguia enxergar mais nada, nem guardas nem nenhum rosto conhecido, nem prisioneiros nem amigos. Ele se sentia exatamente como estava: isolado, sozinho, impotente. Então acordou e deu de cara com uma pessoa parada diante das barras da cela, um menino que fora ali sozinho e agora estava prescrutando a expressão de Jord, que se colocou de pé, todo sem jeito. – Você atacou primeiro? – Não – respondeu Jord. – Então deixe que eu resolvo isso. Jord cou olhando para ele. Aos 15 anos, o príncipe só havia avançado três-quartos em sua fase de crescimento, sem nenhum sinal de barba por vir. Quando ele falou, suas palavras foram sérias. Na manhã seguinte, Jord foi liberto da cela, e os homens da Guarda do Príncipe se amontoaram ao redor dele nos alojamentos. Deram-lhe uma banqueta e uma caneca de vinho, e todos falavam ao mesmo tempo, disputando para contar sua própria versão da história. Jord a entendeu em pedaços: fora a palavra do príncipe contra a de Chauvin. Chauvin cara furioso. O príncipe pessoalmente tinha cado a favor de Jord. O conselho inteiro se reunira, o príncipe empregara palavras renadas e, ao m da ocasião, o regente declarara: "Meu querido sobrinho. Nós conaremos em seu relato. Co m uma condição: se algo semelhante tornar a acontecer, a Guarda do Príncipe será desmantelada". Naquela noite, Jord bebeu demais e falou para Orlant: – Eu não sou idiota. Eles usarão isso para derrubar a Guarda do Príncipe. Para derrubar todos eles, tanto o príncipe quanto a guarda. Orlant não disse isso. – Por acaso eu já contei da primeira vez que fui expulso da milícia da capital? Jord fez que não. – Eu chamei um aristocrata de merdinha. – E o que o príncipe disse a respeito disso? – Disse que concordava. Jord soltou um suspiro, achando graça. – O que foi que ele disse, de terno? – Disse que, se eu desse um passo que fosse fora da linha na guarda dele, iria me mandar para o tronco. – Isso me parece mais algo que ele diria. – Ele é um lho da puta de sangue frio – comentou Orlant, com orgulho. – O príncipe ainda é inexperiente – disse Jord, franzindo o cenho, porque o príncipe havia baixado a guarda e era novo demais para ter consciência disso. "Ele comprou briga com o conselho por sua causa", foi o pensamento que teve, mas o príncipe era um garoto e não sabia que não devia deixar o pescoço ao alcance do inimigo. A Guarda do Regente era poderosa, e sua rivalidade, signicativa. Pensando na f ormação da Guarda do Príncipe, Jord concluiu que se tratava do capricho impensado de um menino: eles eram um apanhado de brutamontes enjeitados que jamais seriam alguém na vida. – Apenas um tolo daria uma segunda chance para homens como nós – concordou Orlant.  Não era como se Jord não soubesse que Aimeric estava olhando em sua direção. Ele sabia. Era o fato de que Aimeric estava olhando para ele que o fez olhar para o nobre. Em uma tropa de homens que pareciam um penhasco e Orlant, que parecia um terreno colapsado, Aimeric era alguém para quem Jord podia se voltar quando, no m do dia, sentava-se com os demais ao redor da fogueira do acampamento, segurando uma caneca de lata amassada, cheia de vinho. Ele gostou do queixo teimoso de Aimeric. Gostava de seus cachos soltos, que mal cabiam no elmo. Ele gostava do terno de que, quando olhava para Aimeric, ele estava olhando em sua direção. Era um bom devaneio, ainda que sua imaginação tivesse lacunas no lugar dos detalhes, dado que Aimeric era um aristocrata. Com base em sua experiência, os aristocratas lhe diziam coisas do tipo "Posição de sentido, soldado" ou "Leve esses alforjes para lá". Jord não sabia que um aristocrata poderia se dignar a olhar para um capitão de guarda da ralé, nem que fosse por alguns in stantes. E Aimeric era tão bem-nascido que deveria ter, em Fontaine, seu próprio escravizado de estimação, alguma espécie de jovem mimado, comprado para brincar à mesa com ele durante o dia e aquecer sua cama à noite. Bem, nem todos os olhares feios do mundo teriam importância quando todos eles acabassem morrendo debaixo de um desmoronamento ou sofressem um ataque de salteadores. O único motivo de terem sobrevivido foi por causa do demônio de cabelos amarelos, que os obrigara a fazer manobras de treinamento do raiar até o pôr do sol, manobras essas que faziam até mesmo os mais empedernidos dos homens caírem no chão de terra, exaustos, cansados ​​demais até para xingar o príncipe que os obrigara a fazê-las. Aimeric estava vindo em sua direção. O toco ao lado de Jord estava vago. Aimeric sentou-se lá. Diante deles, a fogueira soltava fumaça e luz alaranjada. O capitão passou-lhe o cantil. O outro tossiu, já que o recipiente continha bebida alcoólica, não água. Ele provavelmente tossiu por causa da qualidade da bebida, não porque era forte. Aimeric enxugou a boca com a mão e tentou devolver o cantil. – Pensei que você poderia estar precisando – ofereceu Jord. – Eu me sairei melhor – disse Aimeric, depois de um bom tempo. – Eu me sairei melhor até que seja bom o bastante. Jord olhou para a postura cansada dos ombros de Aimeric, para suas olheiras e seus cachos, alisados ​​e transformados em mechas lambidas de suor por causa do elmo. Os dedos de Aimeric apertavam o cantil com força. Caso em algum momento tivesse tido as m ãos macias e bem-cuidadas de um aristocrata, elas agora estavam calejadas pelas semanas de manobras, e havia terra debaixo das unhas quebradas por conta do dia de trabalho duro. Do outro lado do acampamento, o príncipe estava desmontando do cavalo sem nenhum esforço, intocado pelas tarefas exaustivas do dia e com sua postura altiva inabalada. Dava a impressão de nem ter poeira nas botas. Típico. – Não é o que você esperava? – perguntou Jord. De início, a impressão foi de que Aimeric não responderia. – Achei que eu conseguiria uma função na corte. – Então por que se juntou à guarda? – Porque, se o regente e o príncipe estão em contenda, é melhor ser aliado do homem que vai vencer, mas, por precaução, mandar o lho descartável para lutar do outro lado. Aimeric cou corado. Essa fora a primeira coisa não cerimoniosa ou elogiosa que dissera para Jord. – Desculpe. Não foi isso... – Você não é descartável – ofereceu Jord. – Você se esforça mais que qualquer homem aqui. O príncipe o quer nesta tropa. – Não é o príncipe que estou tentando impressionar. Fez-se um silêncio, e essas palavras caram pairando no ar. O fogo crepitou e soltou faíscas, e houve a impressão de que a noite se estreitou. – Eu quero você nesta tropa – declarou Jord. – E fora dela? – Você é lho do conselheiro Guion. – Não ligo para hierarquia – retrucou Aimeric. – Pois deveria. – Por quê? O senhor liga? – Eu sou seu capitão. – Então é o senhor que está acima de mim. – Deixe disso – disse Jord, mas tinha um sorriso no rosto conforme pagava o cantil de volta e tomava um gole. – Eu penso no senhor – revelou Aimeric. Jord se engasgou

            
            

COPYRIGHT(©) 2022