Capítulo 2 - Realidade

Segundo dia...

Quando amanheceu, Catherine finalmente conseguiu um espelho. Não era dos melhores espelhos, mas ela pôde ver seu corpo por completo e isso a surpreendeu. Sua pele realmente não era mais branca como leite, seus cabelos estavam escuros. Aquele loiro que ela amava desapareceu realmente de sua vista.

Seus olhos... antes azuis, agora estavam negros como a noite.

Que trágico!

Ela odiou aquele corpo. Não é que fosse feia; pelo contrário, teve sorte de ter caído em um corpo bonito. Uma índia maravilhosa, mas Catherine nasceu loira e amava ser loira padrão.

Cabisbaixa, ela finalmente saiu da oca onde dormiu. Seus olhos novamente avistaram a tribo ou aldeia? Catherine matou a aula de história e era leiga nesse assunto.

[(⁠人⁠ •͈ᴗ•͈) O correto é aldeia, mas tribo também não está errado.]

- Ah... então você está aí... - Aiyra disse sozinha, chamando a atenção de alguns índios.

[ಡ ͜ ʖ ಡ Eu sempre estive aqui... mas você é muito dramática, preferi não me intrometer.]

- VOCÊ! - Gritou ofendida e bufou várias vezes enquanto olhava para o nada especificamente.

- O que você está fazendo?

Ela virou-se e observou Kaluanã ao lado, encarando-a como se fosse uma louca. Catherine finalmente pôde olhar calmamente para esse pajé. E sob a luz do sol, esse homem realmente é magnífico.

Ah, ela se lembrou dos méritos, de que precisa fazer amizade com ele.

- Eu... eu estava te procurando.

Kaluanã arqueou a sobrancelha e se aproximou mais um pouco, olhando para a guerreira de cima para baixo. Aiyra está muito estranha.

- O que você está planejando? Até uns dias atrás, estava me tratando como um obstáculo.

Aiyra sorriu sem jeito.

- Eu fiz isso? Você é bonito, eu não trato pessoas bonitas mal.

Kaluanã apenas a encarou confuso e ouviu um barulho alto. Aiyra levou as mãos até a barriga desnuda e demonstrou uma careta.

- Estou com fome. Não comi nada desde ontem.

- E?

- Pode me dar um pouco de comida?

- Você tá aleijada? - Foi ríspido, deixando Aiyra chocada. Que bruto!

"Mini, como esse índio tratava a Aiyra antes de ser descartado?"

Perguntou no pensamento enquanto olhava para Kaluanã.

[Ele a tratava com carinho e respeito. Sempre fazendo as vontades dela e mimando. Parece que Kaluanã está ressentido. Vai ser difícil recuperar a amizade dele novamente.]

Catherine ouviu tudo e voltou sua atenção ao pajé.

- Se eu soubesse que iria mudar, teria aceitado seus sentimentos. - Disse, surpreendendo o pajé.

- Como?

Aiyra sorriu e se aproximou do índio.

- Vamos ser amigos novamente? Você pode me arrumar comida? Por favor?

Kaluanã revirou os olhos e deu as costas, andando. Aiyra o seguiu, sem se afastar em nenhum momento. Após tanto persistir, o índio a levou para a cozinha da aldeia, onde acabou preparando algo que agradasse à menina.

Como ele terminou assim? Kaluanã realmente se sentiu furioso.

⇜⇝

Depois do café da manhã, Catherine se incomodou com uma coisa em seu novo corpo: os pelos. Ela se sentia peluda e Kathy odeia pelos, então precisava encontrar algo afiado para removê-los.

Em sua vida anterior, ela fazia sessões de laser e não tinha mais pelos. Agora, todo o pelo que lhe faltava, ela tinha em dobro. Especialmente na virilha. Com um espelho em mãos dentro de sua pequena casa, Catherine observou sua região íntima. Estava tão peluda que nem conseguia ver seu formato.

- Parece um bicho...

[╰⁠(⁠⸝⁠⸝⁠⸝⁠´⁠꒳⁠`⁠⸝⁠⸝⁠⸝⁠)⁠╯ Que exagero. Você quase não tem pelos. Os índios têm boas genéticas.]

- Meu corpo anterior não tinha nenhum pelo. Não estou acostumada. Como faço para remover?

[Os índios usam espinhas de peixe.]

- O quê? Não há cera nem laser aqui?

Novamente foi deixada no vácuo e, ao arrumar suas roupas, ela saiu rapidamente da oca, procurando por seu pajé.

Kaluanã estava rodeado de várias índias novas, com os seios à mostra e nuas. Isso chocou Catherine. Como essas garotas tinham coragem?

Ela se aproximou, encarando as índias com julgamento e as afastou dali, ficando a sós com o pajé.

- Que excentricidade...

Acusou ela. Fazendo Kaluanã arquear a sobrancelha, era uma palavra que ele não conhecia.

- O que você está fazendo?

Perguntou ele. Aiyra o encarou feio.

[Não diga... essa é a cultura deles.]

Advertiu Mini, fazendo Catherine calar a boca.

- Você está muito estranha.

Aiyra voltou sua atenção ao pajé.

- Está ocupado? Você poderia arrumar uma espinha de peixe para mim?

Kaluanã olhou de cima para baixo para a índia e notou que tudo nela tinha mudado.

- O que está olhando? Seu tarado...

Aiyra se sentiu usada. Mas Kaluanã não entendia as palavras que saíam de sua boca.

- Você acha que eu sou seu burro de carga?

Aiyra se sentiu ofendida.

- Não... claro que não... Você é meu amigo. E também... você gosta de mim, não é?

Kaluanã fechou a cara e deu as costas, saindo sem dizer nada. Aiyra o seguiu, implorando pela espinha de peixe. Em dois dias, ela começou a tratá-lo como seu servo e isso o irritava.

⇜⇝

Terceiro dia...

Catherine sobreviveu nesses três dias, é claro que fez de Kaluanã seu empregado e o seguiu para todos os lugares. Se o objetivo era conquistar a confiança dele, ela estava no caminho certo.

No final, morar naquele mato não era tão ruim, tirando a comida, uma cama dura, aquela oca sem luz, roupas velhas, hábitos estranhos, uma tribo pequena, músicas estranhas e seu corpo peludo; viver como uma índia não era tão ruim. Em uma escala de cem por cento, viver no passado era cerca de dois por cento agradável. Em relação ao resto, os noventa e oito por cento, ela sentia saudade dos luxos.

- Vai, atira, ele vai fugir! - Kauã gritou em seu ouvido, deixando Aiyra nervosa. Ela foi obrigada a matar um servo, mas o problema era que ela nunca tinha feito isso e, principalmente, não queria machucar aquele pobre animal.

Os dois estavam na floresta procurando comida para o almoço, o dia estava bom, porém as mãos da garota tremiam. Usar o arco e flecha tornou-se uma tarefa difícil. Por que isso estava sendo tão complicado? Quando o elástico estava bem esticado, a índia o soltou, mas a flecha não voou, permanecendo entre seus longos dedos.

- Eu não consigo -, confessou. Kauã estava impressionado. O que estava acontecendo com Aiyra nesses dias?

Ele tentava encontrar uma explicação para a garota, que antes era uma guerreira, mas que agora se tornara inútil. Ele a encarou. Sim, ela ainda tinha a mesma aparência, até estava mais bonita, mas de alguma forma sua personalidade havia mudado, como se fosse outra pessoa parecida, porém não a mesma.

- Eu... eu, eu posso tentar... eu vou conseguir agora! - Aiyra estava nervosa, afinal, Kaluanã a encarava com desgosto, e isso não era o que ela queria. Ela tentou puxar o elástico com a flecha, mas falhou miseravelmente.

Kauã se irritou e deu as costas para se afastar daquela garota, que certamente o estava enganando. Ao dar alguns passos, seu corpo foi segurado por dois braços que o abraçaram pelas costas. Aiyra estava ultimamente com esse hábito de abraçar e isso o assustava mais a cada dia.

- Eu bati a cabeça e tive amnésia, então não me lembro de nada. Neste momento, sou uma garota da cidade grande, que sempre viveu sob as asas de pais maravilhosos, mas estou tentando... - Kauã arqueou a sobrancelha ao ouvir aquilo. Ele não entendeu nada, pois havia palavras que aquele índio nunca tinha ouvido falar. - Seria mais fácil se houvesse um açougue com as carnes todas prontinhas e pudéssemos apenas ir lá e comprá-las?

- Açougue? O que é isso? - Ele se virou para encarar a índia, que se animou para contar todas as coisas que existiam no futuro, mas ao falar, o sistema a interrompeu.

[Aviso! Não é permitido misturar o passado com o futuro. Você irá perder seus méritos conquistados.]

Aiyra fechou a boca.

- ... Só estou dizendo coisas para te impressionar - Sorriu largo, enquanto Kaluanã fechava ainda mais a cara.

- Se arrependeu do fora que me deu? Ou se esqueceu disso e, do nada, começou a gostar de mim? - Essa foi a conclusão que ele encontrou para o motivo dela ter grudado desse jeito.

Então ela sorriu.

- Você não é meu estilo. Gosto de rapazes loiros, iguais a mim.

"Pronto... ela enlouqueceu." Isso passou pelos pensamentos de Kaluanã, que a ignorou, dando as costas e se afastando. A patricinha o seguiu de volta à tribo, tentando chamar a atenção do pajé, mas foi ignorada. Três crianças entraram no caminho da garota, impedindo-a de se aproximar de seu porto seguro; elas agarraram suas coxas e chamaram várias vezes por seu nome. As crianças queriam brincar no rio, entretanto, Aiyra não sabia nadar e teve que negar.

Contudo, as crianças insistiram. Elas queriam brincar com a guerreira, que agora é boazinha, e Catherine, por gostar muito de crianças desde cedo, não resistiu. Kaluanã virou-se para observá-la e assistiu às crianças arrastarem Aiyra para longe.

A antiga Aiyra era mais fria e quase não dava bola para as crianças. Ele sentia que existia algo errado ali, só não entendia o que era.

Catherine foi arrastada pelas crianças e elas pararam em um campo aberto e verde.

- Vamos brincar de Toloi Kunhügü - disse um garotinho indígena, e Catherine não entendeu nada.

- Que brincadeira é essa?

Todas as crianças olharam para ela. Mas, por serem inocentes e crianças, elas não desconfiaram de nada e explicaram alegremente.

- É pega-pega, Aiyra será o gavião e nós os passarinhos.

- Ah... - Catherine conhecia pega-pega. Já brincou quando criança. Então, não era difícil. Nisso, todas as crianças começaram a correr, mal ela imaginou que esses índios mirins fossem tão bons de corridas, ou a moleza aqui fosse ela.

Quando ela viu, o sol se pôs e o céu começou a escurecer. A brincadeira rendeu muito, e Aiyra estava muito cansada.

            
            

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