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No dia após o jantar com os De Luca, minha família e eu fomos para o bairro de Chelsea para comemorar o aniversário de três anos do meu primo Matteo. A mãe dele nunca fora conhecida por sua discrição e, por isso, não era surpreendente que a festa tivesse mais de sessenta convidados. Eu estava no quintal da mansão, sentado em uma das mesas junto a Carlos, Dante e Conrad, meus outros primos.
Adorava esses momentos que nos reuníamos em família. Para mim, era a parte que mais valia a pena.
- Matteo, pare de correr! Você vai suar toda a sua camisa assim! - exclamou minha tia Ágata, irritada, indo atrás do meu primo, que brincava animado com seus amigos pelos gramados.
- Ele é uma peste - falei, sorrindo. - Ágata devia apenas desistir de pegá-lo.
- Você era pior na infância. O pior era que eu sempre acabava levando bronca quando você era o único a aprontar alguma coisa - disse Carlos, fingindo irritação.
- Não aja como se fosse um santo, Carlos - acusei-o. - Você cresceu e ficou pior do que eu.
- Você quer entrar em uma discussão sobre quem aprontou mais de nós dois? Se sim, vamos ficar nesse assunto a festa inteira - respondeu Carlos.
- Tenho algo mais interessante para você, Blake - disse Conrad. - Aquela garota não para de olhar para cá.
Olhei para onde seus olhos pousavam. Giulia, uma das filhas dos convidados, olhava-me com um sorriso malicioso a poucos metros de nós. Ela possuía cabelos loiros cacheados e olhos castanhos, lábios finos e olhos redondos. Era linda, mas...
- Eu já disse para vocês. Não saio com outras mulheres da máfia. - respondi, bebendo um gole de cerveja.
Essa era uma regra estabelecida por mim há muito tempo. Meu envolvimento com mulheres restringia-se a casos de uma noite, não por eu ser contra envolvimentos menos superficiais, mas porque, sendo quem eu era, acabou se tornando uma opção mais prática. Relacionamentos sérios com mulheres fora da máfia não eram permitidos, e casamentos arranjados eram uma prática muito comum no nosso meio, fazendo com que diversas pessoas já tivessem um parceiro para a vida antes mesmo de completarem dois anos. Consequentemente, evitar a fadiga dos dois tipos de mulheres era uma boa solução para mim.
Levantei-me e fui em direção ao buffet da festa. No meio do caminho, acabei esbarrando em Charlotte, minha irmãzinha de cinco anos. Peguei-a no colo e beijei o topo de sua cabeça, o que a fez dar uma risadinha. Minha irmã era uma garota extrovertida e muito carinhosa - tirando as birras típicas de crianças de sua idade.
- Para onde está indo? - perguntei, carinhoso. - Você já comeu?
- Eu esqueci - respondeu ela, com um sorriso envergonhado. - Não conta para a mamãe.
- Só se você comer pelo menos um docinho - falei. Ela assentiu, mesmo que a contragosto. Lottie estava numa fase em que qualquer tipo de brincadeira era mais interessante do que se alimentar. - Sabe onde Theo está?
- Eu o vi entrar em casa agorinha com uma menina. Acho que era da família Coppola. - Ela falou com o rosto confuso.
Estreitei os olhos. Filho da puta. Uma coisa era se envolver com uma mulher comprometida às escondidas - o que já era algo tremendamente idiota -, outra, totalmente diferente, era se envolver com uma mulher comprometida em uma festa onde uma boa parte da máfia estaria presente.
Coloquei Lottie no chão com cuidado, afagando seus cabelos e despedindo-me dela. Fui em direção à entrada da mansão, saudando alguns dos convidados que haviam acabado de chegar. Dentro da propriedade dos meus tios, olhei por todo o térreo, mas não localizei Theo em lugar algum.
Respirando fundo, subi as escadas de madeira que ficavam no centro da sala de estar. Ao adentrar no corredor à esquerda, comecei a abrir as portas dos cômodos. Havia cinco no total. Encontrei Theo no terceiro, deitado na cama de casal, em cima de Catarina, que, assim como minha irmã disse, era uma garota da família Coppola. Ele a beijava e segurava os seios expostos dela com força, e Catarina retribuía suas carícias com a mesma intensidade enquanto fazia esforço para retirar o paletó do meu irmão. O maldito não se deu o trabalho de nem ao menos trancar a porta.
- Theo - falei, exasperado.
Ele parou com os amassos, virando a cabeça para olhar-me.
- Ah, irmão. Ainda bem que é você.
Revirei os olhos. Ele não teve a mínima decência de parecer culpado.
- Eu não quero virar a porra da sua babá, Theo - reclamei. Desviei o olhar para Catarina. - Ajeite-se e volte para lá fora.
Ela olhou para Theo de maneira decepcionada.
- Agora - falei, irritado. - Faça o mesmo, Theo.
- Você é um estraga prazeres - murmurou Theo, ajeitando o paletó.
Apenas ignorei. Os dois começaram a se ajeitar e, quando acabaram, me virei e abri a porta lentamente, verificando se havia alguém no corredor. Felizmente, estava vazio. Abrindo-a por completo, olhei para os dois e inclinei a cabeça para o lado, indicando que eles deveriam sair. O casal de idiotas se levantou, ambos saindo de cabeça baixa.
- Theo, vamos sair juntos primeiro - falei quando fechei a porta. - Você, Catarina, descerá alguns minutos depois, certo?
Ela assentiu.
Assim, eles voltaram para a festa como se nada tivesse acontecido. Fui até a cozinha para tomar uma água.
As atitudes de Theo estavam começando a me irritar ao extremo. Eu teria que ter uma conversa urgente sobre isso, mesmo que ele não gostasse, pois estava se tornando insustentável. Alguma hora esse tipo de atitude acabaria trazendo uma consequência indesejada. Sinceramente, eu não conseguia entender o motivo de meu irmão achar que valia a pena ter esse tipo de atitude. Ele seria o Don algum dia; será que ele não tinha noção das responsabilidades que esse título possuía?
Estressado, eu estava pegando um copo na estante quando alguém me chamou.
- Blake!
Virei-me, reconhecendo aquela voz de imediato. Minha carranca desapareceu, substituída por um sorriso de orelha a orelha ao ver Julien, minha amiga de infância. Seu rosto era redondo e amável, a pele era negra retinta, os cabelos, lisos, longos e escuros; os olhos, que transmitiam um ar vivaz e doce ao mesmo tempo, eram amendoados e castanhos. Ela usava um longo vestido vermelho, e sorria de boca fechada para mim naquele momento, o que destacava seus lábios.
- Eu não sabia que você vinha hoje - falei, me aproximando dela e dando um abraço rápido.
- Para ser sincera, eu também não sabia. Meus pais resolveram vir de última hora. Sua mãe ficou animada ao me ver e me pediu para pegar um vinho para bebermos juntas - explicou ela. - Agora... Você parece um pouco irritado. Aconteceu alguma coisa?
Suspirei.
- Problemas familiares, Jules. Nada que valha o seu tempo. De verdade.
Ela me deu um sorriso conhecedor.
- Eu sei sobre o que podem ser esses problemas familiares, mas não irei perturbá-lo com isso - falou Julien. - Quer jogar Rummy* em vez disso? Talvez te acalme.
Sorri. Eu, ela e um antigo amigo nosso jogamos Rummy incontáveis vezes durante a infância. Incapaz de recusar, falei que jogaria uma partida daqui a pouco.
Felizmente, durante a festa, Theo não tomou mais nenhuma atitude irresponsável. Diverti-me bastante jogando Rummy com Julien e meu pai, que era incomparável nesse jogo, esquecendo-me das idiotices do meu irmão por um bom tempo.
- Claro, meu pai vai ganhar de novo - Falei, emburrado. - Quanto está a pontuação?
- Eu tenho 40, você tem 60 e o Sr. Rossi tem 95 - Julien respondeu. - Não vamos desistir, Blake. Com certeza vamos conseguir alcançá-lo até a hora do bolo.
Eu sorri para ela.
- É claro que sim. Devíamos fazer uma aposta. Eu te dou dois mil euros se você conseguir ganhar essa partida. E você?
- O dobro - Julien falou. Após isso, ela pegou uma carta no baralho de compras. Quando viu a carta que pegara, uma clara expressão de desapontamento apareceu em seu rosto. - Acho que não é o meu dia de sorte.
- Vamos jogar cribbage da próxima vez. - Falei para Julien. Meu pai não era tão bom nesse jogo.
- Concordo - Ela disse.
- Parem de ser maus perdedores - Don Rossi disse.
- Ei! Você é igual a nós - Eu retruquei. - Na verdade, odeia perder mais do que a gente.
Meu pai deu de ombros, incapaz de negar.
Poucas horas depois, a hora de partir o bolo havia chegado. Os convidados começaram a se servir, enquanto um Matteo muito animado abria seus presentes. A festa acabou pouco tempo depois, e os convidados começaram a ir embora.
Minha família foi uma das últimas a sair, pois meu pai e meu tio Michael eram grandes amigos. Eles passariam ainda mais horas bebendo e conversando se pudessem - ou seja, se minha mãe e minha tia não os tivessem obrigado a parar.
- Boa noite! - dissemos pela última vez aos anfitriões da festa, enquanto acenávamos para eles. Eles retribuíram amorosamente, não demorando muito para entrarem na mansão após isso.
Fomos para a entrada da mansão, com o intuito de esperar que o chofer trouxesse nosso carro. Ele chegou poucos minutos depois com um sorriso amigável. Minha mãe e minha irmã foram as primeiras a entrar, enquanto meu irmão foi o próximo. Quando eu estava perto de entrar, no entanto, o o som seco de um disparo cortou o ar.
Meu coração parou por um instante. Charlotte soltou um grito estridente, de puro terror. Olhei ao redor, tentando localizar o atirador, mas o segundo tiro veio antes que eu pudesse reagir.
- Abaixem-se! - exclamei para minha família. - Pai, o que...
Ao virar-me para encará-lo, no entanto, encontrei-o caído no chão, com uma poça de sangue ao redor.
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*Rummy: um jogo de cartas para duas ou mais pessoas. Muito comum na Inglaterra.