Capítulo 5 Zeus

Zeus Narrando

Wesley chegou com o Mistoca. Ninguém sabe que o Mistoca é meu chegado. Quando quero saber de alguma coisa do Morro Santa Vitória, é ele quem me passa. Vi pelas câmeras, botei a máscara, primeira vez que Wesley fica de frente pra mim. Darlan já veio aqui algumas vezes, mas eu não sou de falar com sub, vapor, essas paradas não. Tem que estar diante de mim o responsável, quem tá à frente da minha quebrada.

Bateram na porta e entraram. Cruzei as mãos, debrucei na mesa e só observei. Analisei até o jeito dele andar. Revirei os olhos. Babaca, metido a esperto. Não foi difícil fazer a leitura corporal dele, bem previsível.

- Chefe, aqui tá o Homem - Mistoca falou, jogando o corpo na cadeira como se já soubesse o desfecho.

Olhei pros dois e fiz o sinal pra ele se sentar também. Wesley se jogou na cadeira meio travado, tentando parecer firme, mas eu via no olhar dele que tava calculando tudo.

- Sabe por que tá aqui? - perguntei direto.

Ele esfregou as mãos na calça, desviou o olhar, pensou um pouco antes de responder.

- Acho que é por causa do meu irmão, que saiu da jaula.

Concordei com a cabeça.

- Exatamente. E eu tenho uma proposta pra te fazer.

Os olhos dele brilharam. Interesseiro. Se ele fosse um pouco mais discreto, talvez enganasse alguém, mas não a mim.

- Pode falar, chefe. Tô ouvindo.

Tomei um gole do uísque, fiz suspense.

- Teu irmão vai te procurar. Certeza. E cê sabe que eu não perdoo traidor. Ele me desobedeceu, consecutivamente me traiu.

Wesley engoliu seco, mas manteve a pose.

- Tá interessado na proposta? - perguntei, analisando cada reação dele.

Ele balançou a cabeça que sim.

- Fala.

- Tô sim, chefe.

Soltei um sorriso de canto. Sabia que ele ia querer ouvir.

- O plano é simples. Tu vai dar abrigo a ele onde ele quiser. Vai se mostrar do lado dele, ganhar confiança, entender o que ele tá tramando. E no momento certo, tu me entrega. Liga pra mim ou manda mensagem com as coordenadas certinhas. O resto é comigo.

Ele ficou em silêncio por um instante. Podia ser medo ou só processamento da informação, mas eu já sabia que ele ia aceitar. Só precisava saber o que vinha depois.

- E o que eu ganho? - Ele inclinou o corpo pra frente, mostrando mais interesse no benefício do que no risco.

Bem ambicioso. Nem sequer hesitou em entregar o próprio irmão.

- Tu assume o lugar dele de vez. Se torna o responsável pelo morro e só responde diretamente a mim.

Ele umedeceu os lábios, pensou um pouco e depois estendeu a mão.

- Trato feito.

Apertei a mão dele, sentindo a firmeza do aperto. Sorri por baixo da máscara.

Sabia que ele ia aceitar.

Entreguei o cartão pra ele. Aquele número era só pro comando, não pra gracinha ou conversa fiada.

- Só use esse número pra falar comigo sobre o que interessa. Mais nada.

Wesley pegou o cartão, analisou por um segundo e guardou no bolso. Fiz um sinal com a cabeça.

- Agora some. Os dois.

Eles levantaram rápido, saíram sem olhar pra trás. Assim que cruzaram a porta, puxei o celular e digitei uma mensagem pro Mistoca.

- Fica de olho nesse cara. Não confio nele.

Eu já conheço o tipo. Ambicioso demais, rápido demais pra aceitar uma proposta suja. Se vendeu o próprio irmão sem piscar, não pensaria duas vezes antes de tentar me virar.

Como eu previa, o irmão dele apareceu. Procurou o Wesley no dia seguinte, e agora já faz dois dias que o traíra tava na sombra e água fresca no meu morro. Isso já era tempo demais.

Peguei o celular e mandei mensagem pro Wesley.

- É hoje.

Guardei o aparelho e já comecei a me preparar. O Morro do Santa Vitória era minha próxima parada, e Darlan era só mais um Otario deslumbrado, que se achou demais e rodou na própria quebrada.

Mandei outra mensagem pro Mistoca.

- Se apronta. Vou subir.

O sol rachava o asfalto quando cheguei no ponto combinado, perto da entrada do morro. Meio-dia. O calor tava infernal.

Mistoca já tava lá, encostado numa moto, camisa aberta, óculos escuros. Quando me viu, largou o celular e deu um sorrisinho.

Parei do lado dele, puxei o isqueiro, acendi um cigarro devagar.

- Então hoje é o dia, chefe?

- Hoje é o dia.

Soltei a fumaça e olhei pra cima, pro caminho que levava ao esconderijo do Wesley e do irmão.

- Bora resolver essa parada.

Mistoca entrou no carro, eu botei a máscara e seguimos. Quando chegamos na contenção, ele abaixou o vidro e deu o papo.

- Tô com o chefe.

Os moleques olharam, mas só viram a máscara. Como confiam nele, liberaram a entrada sem questionar. Seguimos morro acima, devagar.

A quebrada tava movimentada, gente na rua, criança brincando, aquele calor desgraçado do meio-dia. Foi aí que eu vi.

Uma morena.

Bundona, cabelão solto, pele brilhando no sol.

Mano... que deusa do caralho.

Toda cavalona, de costas, empurrando um daqueles carrinhos de criança.

Passei devagarinho do lado dela, os olhos já analisando tudo em segundos. Corpo violento, pernas torneadas, cintura fina. O vestido colado marcava cada curva.

Deu até vontade de parar o carro. A boca encheu d'água e o pau já acordou dentro da Calça.

- Quem é aquela Morena, Místoca? - Pergunto me deliciando com a Cena, a morena mais gostosa que meus olhos já viram.

- É a mulher do Wesley, Chefe.

Não acredito que uma mulher tão linda possa ser daquele Merda, Wesley não passa de um fodido, igual o irmão dele.

- Fica de olho nessa mulher, Mistoca. Quero saber tudo da vida dela.

Mistoca riu baixo, balançando a cabeça.

- Já sei umas paradas, depois a gente troca essa ideia.

Ajeitei a máscara no rosto e olhei pelo retrovisor, vendo a morena se afastando devagar, empurrando o carrinho.

- E a criança? É filho dela?

Mistoca suspirou, cruzando os braços.

- Sim. O moleque é especial. Filho dela e Wesley.

Virei o rosto rápido.

- Interessante!

- É, chefe. Mas aquele merda não merece o filho que tem.

Fiquei em silêncio por um momento. A parada ficou mais interessante do que eu imaginava.

- Depois a gente desenrola isso. Já tô curioso.

Mistoca riu de novo, mas eu já voltei o foco pro que interessava.

- Agora é hora de cuidar do que eu vim fazer. Dessa morena, eu fico sabendo depois.

Acelerei o carro, subindo mais fundo no morro. O que vai rolar agora é bagulho sério.