Caminhamos até o balcão. Tyler pede algo com frango grelhado, muita salada e um suco natural, enquanto eu opto por muito cheddar, bacon, batatas fritas e uma Coca-Cola Zero, para dar o equilíbrio. Tyler é o típico americano que vive para a academia e não abre mão de seu físico por nada. Alto, de pele clara, olhos azuis e cabelo cortado em estilo militar, sua boa aparência é nítida; é óbvio que ele veio de uma boa família. E, se há algo que me perturba, é o fato de ele continuar trabalhando comigo, mesmo com todas as bombas estourando sobre nós. Ele nem era tão amigo de Liam assim... Pelo contrário, Liam sempre reclamou dele.
- Por que continua trabalhando para mim? - Eu não consigo mais me conter.
Não consigo confiar nele. É como se ele fosse forçado a estar ali, como se a desconfiança do meu marido ainda respingasse em mim. Apesar de o homem não aparentar ser uma ameaça.
- Como assim? - Ele me encara com o cenho franzido, e a confusão é evidente em seu rosto.
- Você é rico e seu pai é dono dos maiores escritórios de advocacia de Manhattan. O que você quer para a sua carreira se continuar envolvido nesse caso do Liam?
- Eu achei ridículo o que ele fez contigo. - Ele revela e faz uma pausa ao ver a atendente se aproximar com nossos pedidos. - Obrigado. - Ele diz à jovem, que o admira descaradamente, mas logo volta sua atenção para mim. - Eu sei que era o seu marido, que você está sofrendo com o luto e desconfiando de tudo e de todos, mas se existe uma única pessoa para você desconfiar, essa pessoa é o Liam.
Engulo em seco. Ele tem razão.
- Você muito mal vai ganhar o seu salário com isso, Tyler. - Insisto, pegando uma batata e provando-a em seguida.
- Como você disse: eu não preciso do dinheiro, Diana. - Ele retruca, tomando um pouco de seu suco de laranja. - Nem todo mundo precisa de algo em troca. Às vezes, a gente só quer ajudar. Você e a Liana...
- Ayla. - Corrijo, referindo-me ao nome da minha filha.
Liana era uma homenagem ao pai dela. Depois de tudo, com tantas desconfianças, não quero arriscar dar ao meu mais sincero amor o nome de alguém que, supostamente, seria indigno.
- Você e a Ayla merecem ter alguém por perto, alguém que as ajude não só na empresa, mas... - Ele leva a mão até a minha, que está sobre a mesa.
Seu toque me arrepia estranhamente. Definitivamente não é um toque que me traz conforto, como as borboletas no estômago que senti ao toque de Liam um dia. O toque de Tyler faz com que uma corrente elétrica e gélida percorra toda a minha espinha.
Afasto-me do seu toque e foco em desembrulhar o hambúrguer, comendo-o, enquanto me concentro em não olhar nos olhos azuis dele.
- Digo, Liam era filho único, os pais dele morreram cedo, e você...
- Meus pais detestavam meu marido e pararam de falar comigo antes mesmo do casamento. - Eu tomo a palavra, antes que ele tenha o prazer de declarar isso para eu ouvir.
- O que levou seus pais a não gostarem dele? - Tyler questiona, ainda curioso.
- Isso tem algo a ver com as investigações? - Rebato.
- Talvez... - Dá de ombros, levando um pouco da salada à boca.
- Não sei. - Sou sincera. - Acho que simplesmente não gostaram dele. Eles tinham isso. - Recordo-me de papai e mamãe e de como julgaram Liam.
Eles simplesmente não gostaram. No final, nos excluíram de suas vidas, restando apenas eu e Liam contra o mundo.
- Pensa em ir atrás deles agora que Liam não está mais contigo?
Eu não tinha pensado nisso.
- No momento, eu só quero organizar minha vida e a minha empresa. - Dou um corte na conversa.
- Desculpe se estou sendo invasivo. Eu só quero ajudar. - Ele me olha nos olhos. Seu olhar é intenso, como se quisesse ler minha alma ou, na hipótese mais simples, meus pensamentos.
- Você pode deixar que eu me concentro nas coisas da empresa. Quero que se concentre com o detetive sobre as dívidas de Liam e se ele realmente se suicidou, ou se o mataram. O que o levou a perder a empresa, ou se ele realmente vendeu.
- Acha que podem ter matado ele?
- Não sabemos a quem ele devia, o que ele fazia. Ele me deixou uma carta, digitada, nem era a letra dele. A carta não tinha pé nem cabeça, muito menos... - Fecho os olhos e respiro fundo. - Ser encontrado no fundo de um rio, dentro do próprio carro e com um tiro na cara. Na cara, Tyler. - Declaro com a voz embargada. - Caixão fechado, eu só reconheci o corpo pelas tatuagens.
- Perfeito e milimétricamente pensado para um suicídio. - Tyler parece entender minha linha de raciocínio.
- A polícia da cidade já deu o caso como resolvido. Esse detetive que você encontrou é tudo o que tenho como esperança...
Às vezes eu tenho raiva de Liam, às vezes eu apenas sinto que fomos interrompidos de algo lindo. A verdade é que, na maioria das vezes, nas últimas semanas, estou confusa. Liam costumava me contar tudo, mas dias antes de sua morte, coisas começaram a acontecer. Um Liam diferente estava dividindo a cama comigo. Ele recebia ligações que o faziam se afastar de mim para falar. Parecia distante na maioria das vezes, chegava tarde em casa ou mal dormia pelas madrugadas, zanzando pela casa.
Descobri nossa falência lendo a carta que deixou, o que nos fez acreditar no suicídio.
Mas, ao mesmo tempo, eu sinto que algumas coisas não encaixam.
O meu Liam amava a vida, jamais teria coragem de tirar a própria.
Contudo, o Liam que estava convivendo comigo nos últimos dias não parecia ser o mesmo.