Ao abrir, a pilha de contas atrasadas parecia me zombar. Avisos de corte de serviço, cobranças bancárias e cartas de cobrança preenchiam o pequeno espaço. Peguei tudo e voltei para dentro, jogando os papéis sobre a mesa da cozinha. Por um momento, encarei aquela bagunça, pensando se um dia conseguiria resolver aquilo. E se aceitar a proposta do Arthur fosse uma forma de finalmente organizar minha vida? Resolveria as contas, salvaria minha mãe e talvez tivesse uma chance de recomeçar. Mas, ao mesmo tempo, era um preço alto demais a pagar.
Sem saber o que fazer ou com quem desabafar, peguei meu celular e disquei para a única pessoa que podia ouvir toda aquela loucura sem me julgar: minha melhor amiga, Clara. Ela atendeu no terceiro toque, com a voz animada como sempre.
- Alice! Finalmente resolveu dar as caras. Onde você tem se metido? - Clara perguntou, em tom de brincadeira.
- Clara, é uma longa história, e eu realmente preciso de você agora. É... complicado.
O tom da minha voz deve ter chamado sua atenção, porque ela parou de brincar.
- Claro, amiga. Me conta tudo. O que aconteceu?
E eu contei. Contei sobre Arthur, sobre Aurora, sobre o casamento arranjado com um homem perigoso que estava preso e que logo seria solto. Clara não me interrompeu, mas eu conseguia ouvir a incredulidade no silêncio do outro lado da linha.
- Alice, você tem certeza de que não está ficando louca? Tipo, isso é muito... novela mexicana.
- Eu sei! - Exclamei, exasperada. - Eu também achei que fosse alguma pegadinha, mas é real, Clara. Eu vi as fotos, vi os documentos. Ele é mesmo meu pai, e Aurora existe. Eu nem sei o que pensar.
Clara ficou em silêncio por um instante, digerindo a história.
- Ok, ok. Vamos supor que tudo isso seja verdade. Você realmente vai fingir ser sua irmã? Vai se casar com esse cara?
- Não sei! Eu não quero fingir ser Aurora, muito menos me casar com o noivo dela. Isso é... é errado. E dormir com ele? Nem pensar!- Minha voz saiu mais alta do que pretendia.
Clara soltou uma risada curta.
- Ah, Alice... Virgens geralmente pensam assim.
Senti meu rosto esquentar. Era difícil admitir isso, mas Clara já sabia, como sempre sabia tudo sobre mim.
- Não é só isso, Clara. - Respondi, a voz mais baixa. - Ele é perigoso. Ele está preso, Clara! Preso! E vai ser solto em breve. Como eu posso confiar em alguém assim? E se ele for um louco insensível?
- Ok, ok, entendi. Isso realmente é assustador. Mas você não precisa decidir agora, certo?
- Arthur quer uma resposta até amanhã. Eu nem sei o que dizer. Se eu não aceitar, ele disse que as coisas podem piorar.
Clara ficou em silêncio por um momento, provavelmente tentando encontrar algo que pudesse me ajudar. Quando finalmente falou, sua voz tinha aquele tom decidido que ela usava quando tinha uma ideia.
- Olha, Alice, se você não quer trepar com o noivo da sua irmã, por que não faz isso com outra pessoa antes? Algo menos... carregado. Alguém que você escolha.
- Clara! - Exclamei, chocada. Meu rosto devia estar vermelho como um tomate.
- Sério! Vamos sair hoje à noite. Beber um pouco, olhar uns caras bonitos. Mesmo que você não faça nada, pelo menos vai esquecer essa história louca por algumas horas. O que me diz?
Eu hesitei. A ideia parecia absurda, mas talvez fosse exatamente do que eu precisava. Algo para tirar minha mente de todo aquele caos.
- Ok. - Respondi, suspirando. - Mas não prometo nada, Clara.
- Sem promessas, amiga. Apenas confie em mim.
Desliguei o telefone e olhei para as contas espalhadas na mesa. Minha vida estava um caos completo, mas talvez, por uma noite, eu pudesse fingir que tudo estava bem. Talvez, apenas talvez, eu pudesse me permitir respirar.