Capítulo 4 Sala 12

Clara chegou na sala 12 com o coração acelerado. O prédio antigo da escola parecia respirar um ar diferente - mais úmido, mais silencioso. As paredes eram cobertas por cartazes rasgados de eventos que ninguém mais lembrava. A porta da sala estava entreaberta.

Ela respirou fundo antes de empurrá-la.

Lá dentro, a luz era baixa. Algumas cadeiras formavam um círculo no centro. Quatro pessoas já estavam ali. Alice, com o capuz agora no colo. Um garoto alto, de expressão fechada, roendo as unhas. Uma menina com cabelo rosa que desenhava num caderno. E um outro garoto magro, sentado no chão com fones de ouvido - olhos vermelhos, mas não parecia ter chorado só hoje.

Alice acenou para Clara, e ela se aproximou devagar.

- Esse é o Clube das Palavras Não Ditas - disse Alice com um meio sorriso. - A gente não tem regras, nem professores. Só escuta, se quiser falar. E escreve, quando as palavras pesam.

Clara sentou. O silêncio não era desconfortável. Era... respeitoso.

- Todo mundo aqui tem alguma coisa presa - disse a menina do cabelo rosa, sem tirar os olhos do caderno. - E tudo bem se demorar pra sair.

O garoto de fones tirou um dos lados e disse: - Às vezes a gente só precisa saber que não tá sozinho.

Clara ficou quieta. Mas dentro dela, algo se mexia. Um pedaço da solidão que sempre achou que era só dela começou a se dissolver, lentamente.

Alice entregou a ela um pedaço de papel com uma pergunta escrita:

"Se você pudesse dizer qualquer coisa, sem medo, o que diria?"

Clara pegou o lápis. E começou a escrever.

Clara não pensou. Apenas escreveu.

"Eu sinto falta de mim. Da versão que ria com facilidade, que acreditava que o futuro seria bom. Mas agora, tudo parece distante. Como se eu estivesse presa atrás de um vidro. Vejo o mundo, mas não consigo tocá-lo. E às vezes, sinto que se eu desaparecesse, ninguém notaria. Ou notariam por um tempo... e depois esqueceriam. Eu queria voltar a ser leve. Só isso."

Quando terminou, não leu em voz alta. Apenas dobrou o papel e o colocou numa caixa que estava no centro do círculo. Alice sorriu e fez o mesmo.

Era isso. Cada um podia escrever o que quisesse e depositar ali. Palavras não ditas. Palavras que doíam.

- Um dia, se quiser, pode ler em voz alta - disse Alice. - Mas só quando parecer certo.

Clara assentiu. Pela primeira vez, ninguém estava forçando ela a falar. E isso fez com que ela quisesse.

O garoto dos fones se apresentou: - Rafael. Dezessete. Meu pai acha que depressão é frescura. Então eu venho aqui pra lembrar que não é.

A menina do cabelo rosa levantou os olhos do caderno: - Isa. Faço terapia, tomo remédio, e ainda tenho dias ruins. E isso não me faz fraca.

O garoto calado roendo as unhas falou baixo: - Davi. Eu... só queria conseguir dormir sem pesadelos.

Alice não falou nada. Apenas olhou para Clara. E Clara, ainda sem dizer muito, sentiu que fazia parte de algo. Que havia ali um tipo de cura que não vinha de palavras bonitas ou soluções rápidas, mas de presenças silenciosas.

Quando a reunião terminou, Clara saiu da sala e olhou para o céu já escuro. Pela primeira vez em muito tempo, o peso no peito parecia ter afrouxado. Não sumido. Mas dado uma trégua.

E naquela noite, ela escreveu:

"Talvez exista um tipo de amor que nasce no silêncio - quando alguém simplesmente fica do seu lado, mesmo quando você não consegue dizer nada."

            
            

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