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Na manhã seguinte, Clara sentou no mesmo lugar de sempre. E a menina também estava lá. Capuz cinza, cabelo bagunçado, olhar distante. Mas havia algo diferente entre elas agora. Um fio invisível, criado no dia anterior, quando Clara empurrou o estojo e a menina sorriu.
Durante a aula de literatura, a professora propôs um exercício: - Quero que cada um escreva um texto livre sobre o tema "Quem sou eu?". Não precisa ser entregue, é só pra vocês. Podem usar a criatividade, o coração, o silêncio. Só escrevam.
A sala ficou em silêncio. Alguns bufaram, outros riram. Mas Clara pegou o lápis. E pela primeira vez em muito tempo, ela escreveu sem parar. Não frases curtas como as anteriores, mas parágrafos. Palavras que pareciam saltar do peito.
Do lado, a menina do capuz também escrevia. Rápido. Intenso.
No final da aula, quando todos se levantaram para sair, a menina se virou para Clara e disse: - Você escreve bem. Eu vi ontem... quando você deixou o caderno meio aberto.
Clara sentiu o rosto esquentar. - Você leu? - Só a última frase... sobre querer ser vista.
Um silêncio.
- Eu me senti assim também - continuou a menina. - Me chamo Alice.
Clara hesitou, mas respondeu: - Clara.
As duas sorriram. Não o sorriso treinado. Mas um tímido, sincero, quebrado. E foi o bastante.
Alice então tirou do bolso um papel dobrado e entregou a Clara.
- Amanhã, depois da aula, vem aqui - apontou para o papel. - É meio secreto, mas acho que você vai gostar.
Clara abriu o papel e leu: Clube das Palavras Não Ditas. Sala 12, Prédio Antigo.
Clara não sabia exatamente o que era aquilo. Mas pela primeira vez em meses, sentiu uma curiosidade genuína. Um desejo estranho de descobrir, de sair do automático, de talvez encontrar mais pessoas que sentiam o mesmo que ela.
Naquela noite, ela escreveu:
"Existe um lugar onde palavras não ditas se escondem. Talvez, amanhã, eu as encontre."