/0/14532/coverbig.jpg?v=a6aa3cdc7d294371bb5d60eabc07c3df)
Capítulo 3 - "Primeiro Encontro"
(Narrado por Sienna)
A paisagem diante de mim era tão diferente de tudo o que eu conhecia que, por um momento, achei que havia cruzado para outro mundo. Montanhas cobertas de neve erguiam-se como sentinelas silenciosas, suas formas imponentes destacadas contra o céu cinzento. O ar era gelado, cortante, e cada lufada parecia apagar um pouco do fogo que queimava dentro de mim.
Eu estava envolta em camadas de tecido, incluindo meu manto vermelho bordado com fios dourados, uma peça que simbolizava minha posição como Luna do Reino do Fogo. No entanto, nem mesmo o peso e o calor da lã eram suficientes para me proteger daquele frio implacável. Cada passo na neve parecia um desafio, e o som do gelo rangendo sob as patas dos cavalos, ecoava pelo deserto branco ao nosso redor.
Atrás de mim, minha pequena comitiva seguia em silêncio. Eram quatro pessoas no total, dois guardas de elite escolhidos a dedo por minha irmã, Lyria, um mensageiro dos anciãos, e Mirra, minha dama de companhia e conselheira leal. Apesar de sua origem humilde, Mirra tinha uma sabedoria que frequentemente ultrapassava a de muitos nobres que conheci. Era ela quem agora ajustava o capuz do meu manto, preocupada com meu rosto exposto ao frio.
- Milady, estamos quase lá - disse Mirra, sua voz baixa mas firme.
Eu assenti, incapaz de responder de imediato. Meus lábios estavam ressecados, e cada palavra parecia roubar o pouco calor que eu ainda conseguia guardar.
O Reino do Gelo, Aurelion, não era como imaginei. Nas histórias que ouvira na infância, era descrito como um lugar cruel e inóspito, onde até o ar podia matar. Embora a realidade não estivesse muito distante dessas descrições, havia uma beleza austera aqui. As montanhas, o céu pálido, a vastidão infinita de branco, tudo parecia intocado, imortal.
Mas, ao mesmo tempo, essa beleza escondia algo. Um pressentimento incômodo crescia em meu peito, uma sensação de que havia forças aqui que não compreendíamos, que talvez nunca compreenderíamos.
- Milady? - chamou um dos guardas, interrompendo meus pensamentos.
Levantei o olhar e vi, ao longe, a Fortaleza de Ébano Branco.
Era... colossal.
Torres de gelo se erguiam como lâminas contra o céu, brilhando sob a luz fraca do sol. As paredes pareciam esculpidas à mão, perfeitas e impenetráveis, e uma aura de magia quase palpável emanava da construção. Mesmo a distância, senti um peso nos ombros, como se a própria fortaleza estivesse me observando.
- É maior do que eu imaginei - murmurei, mais para mim mesma.
- E mais fria também, pelo que parece - comentou Mirra, tentando aliviar a tensão.
Eu sorri levemente, mas o desconforto em meu peito não desapareceu.
À medida que nos aproximávamos, o portão principal começou a se abrir com um rangido profundo. Parecia pesar toneladas, e o som reverberou pelas montanhas ao redor, como um aviso. Do outro lado, vi figuras alinhadas, aguardando nossa chegada.
Descemos de nossos cavalos e fizemos o curto trajeto a pé.
- Este é o momento, milady - disse Mirra, apertando meu braço levemente. - Lembre-se de que você carrega o fogo do nosso povo.
Assenti, reunindo minha coragem. Eu não era apenas Sienna. Eu era a Luna do Fogo, a representante de meu reino, e precisava me portar como tal.
Caminhei à frente, mantendo a postura ereta e o olhar firme, enquanto cruzávamos os portões da Fortaleza de Ébano Branco.
O salão principal da fortaleza era tão impressionante quanto o exterior. Paredes de gelo refletiam a luz das tochas, criando um brilho pálido que parecia dançar ao nosso redor. O teto era alto, tão alto que me perguntei se alcançava as nuvens. No centro da sala, uma longa mesa esculpida em cristal de gelo ocupava o espaço, ladeada por cadeiras que mais pareciam tronos.
E, no final do salão, estava ele.
Caelum.
O Alfa do Gelo.
Minha respiração ficou presa por um momento quando nossos olhares se encontraram. Ele estava sentado em um trono elevado, o manto branco caindo sobre seus ombros como uma cascata. Seus olhos eram de um azul profundo, tão frios quanto o gelo ao nosso redor, mas havia algo neles que me fez estremecer. Era como se ele pudesse enxergar através de mim, como se já soubesse cada segredo que eu escondia.
Ele se levantou lentamente, e o movimento foi gracioso, quase predatório.
- Lady Sienna, Luna do Fogo. - Sua voz era baixa, mas preenchia o salão como um trovão.
Dei um passo à frente e inclinei levemente a cabeça, um gesto de respeito, mas não de submissão.
- Alfa Caelum, é uma honra estar aqui.
Ele desceu os degraus de seu trono e caminhou em minha direção, seus passos ecoando pelo salão, seus olhos fixos nos meus. Quando parou diante de mim, pude sentir o frio que emanava dele, como uma barreira invisível.
- Espero que a viagem não tenha sido muito... desconfortável.
Havia um tom de provocação em sua voz que me fez apertar os punhos sob o manto.
- O frio é... revigorante - respondi, permitindo que um leve sorriso surgisse em meus lábios.
Ele arqueou uma sobrancelha, como se surpreso com minha resposta, mas não disse nada. Em vez disso, deu um passo para o lado e gesticulou em direção à mesa.
- Por favor, sente-se. Temos muito a discutir.
Sentada à mesa, a conversa entre nós foi um jogo de palavras cuidadosamente escolhidas. Caelum era direto, incisivo, e suas perguntas frequentemente me desafiavam a defender minha posição. Mas eu não era ingênua. Sabia que ele estava me testando, buscando fraquezas.
Em um momento, ele inclinou-se ligeiramente na minha direção, os olhos brilhando com uma intensidade quase hipnótica.
- Você não parece temer este lugar, Luna Sienna.
Ergui o queixo, mantendo meu olhar firme.
- O medo não é algo que cultivamos no Reino do Fogo, Alpha Caelum.
Um canto de seus lábios se curvou em um sorriso, mas não havia calor ali.
- Interessante. Aqui, o medo é uma ferramenta. Uma arma.
Nossas palavras eram como lâminas se chocando, cada uma buscando encontrar a outra desprevenida.
Quando a reunião finalmente terminou, senti como se tivesse travado uma batalha. Levantei-me da mesa, pronta para sair, mas antes que pudesse dar o primeiro passo, Caelum falou novamente.
- Lady Sienna.
Virei-me para ele, esperando mais uma provocação.
- Bem-vinda ao Reino do Gelo.
Seus olhos fixaram-se nos meus, e por um momento senti algo frio tocar meu pulso. Olhei para baixo, mas não havia nada ali. Ainda assim, a sensação persistia, como se ele tivesse deixado uma marca invisível.
Enquanto caminhava para os aposentos destinados a mim durante a minha visita, o silêncio da fortaleza parecia mais pesado. As sombras nas paredes pareciam se mover, e uma inquietação tomou conta de mim.
O que exatamente Caelum estava escondendo?
E, mais importante, por que eu sentia que o Reino do Gelo não era apenas um lugar... mas uma força viva, que me observava, esperando por algo?