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A Quinta Centelha: Memórias Proibidas - Livro I da Saga Crônicas de Veridia.

Milcax
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Capítulo 1 Prólogo – A Menina que Lembrou

O céu amanheceu em silêncio.

Não era o silêncio dos dias normais, quando os pássaros dormiam até mais tarde ou quando a névoa cobria as montanhas como véu. Era um silêncio estranho, espesso. Do tipo que faz os cabelos da nuca arrepiarem e o estômago embrulhar sem motivo. Evelin acordou com ele.

- Vovó? - chamou, a voz ainda rouca do sono. Nada.

A pequena casa de pedra estava estranhamente fria, apesar de o fogo ainda brilhar na lareira. Ela calçou as botas gastas e saiu para o campo. O vilarejo estava inteiro parado. Homens de cabeça baixa, mulheres ajoelhadas, olhos vidrados. Ninguém falava. Ninguém chorava. Apenas... olhavam.

Lá, no alto da colina onde as decisões do reino eram tomadas, estavam os soldados. Homens em armaduras negras, com o brasão vermelho recém-criado estampado nos peitos. O antigo símbolo da governante - uma árvore dourada com raízes longas - havia sido arrancado, queimado, esquecido.

Menos por ela.

Evelin viu quando Vermon apareceu. Alto, imponente, a capa roxa esvoaçante. Seu rosto carregava cicatrizes fundas e um sorriso de vitória. Atrás dele, o corpo da governante anterior jazia no chão. Os cabelos loiros ainda reluziam sob o sol pálido. Os olhos, abertos, vazios.

Ela tentou correr para lá, mas uma mão forte a agarrou. Seu pai. Os olhos dele estavam vazios também. O mesmo olhar que todos tinham naquele instante.

- Pai! É a rainha! Ele... ele matou ela! - gritou Evelin, esperneando, se debatendo como uma fera ferida.

- Evelin... quem é você? - ele murmurou, os olhos escurecendo.

O mundo girou.

As palavras de Vermon começaram como um sussurro, mas tomaram o ar como um trovão contido. Ele erguia os braços, e da palma de suas mãos um pó dourado esvaía, serpenteando pelo ar, envolvendo todos ao redor como um véu invisível.

- A nova era começa agora. Esqueçam os erros. Esqueçam o passado. Lembrem apenas do meu nome - Vermon. Aquele que vos libertou.

E foi quando Evelin caiu de joelhos.

Ela sentiu o feitiço tentando atingi-la. Um zunido nos ouvidos, uma dor aguda na cabeça, uma tontura repentina. Mas não funcionou. Algo dentro dela - quente, pulsante, antigo - a protegeu. Seus olhos brilharam por um instante, como se refletissem fogo. Ela viu. Lembrou. Sentiu.

E percebeu que era a única.

As pessoas ao redor começaram a sorrir. A bajular Vermon. A agradecer. Como se tivessem sido salvas. Como se aquela manhã não tivesse sido o fim... mas o início de algo bom.

Ela correu. Para a floresta. Para longe.

E naquele dia, Evelin jurou que nunca esqueceria.

            
            

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