Capítulo 3 Entre risos e memes

Joana e Tarso estavam na sala dos fundos na biblioteca, aonde os veteranos iam para "estudar", mas passavam metade do tempo rindo, comendo escondido e fazendo qualquer coisa que não envolvesse livros. Era a quinta vez naquele mês que estavam lá juntos. Oficialmente, era para Tarso ajudá-la com matemática. Oficialmente. - Você vai reprovar se continuar errando regra de três - ele provocou, girando o lápis entre os dedos enquanto olhava os rabiscos tortos no caderno dela. - Você vai reprovar na vida se continuar sendo tão convencido - ela retrucou, empurrando o ombro dele com leveza. Tarso riu.

Aquele riso rouco, grave e abafado. O mesmo que fazia Joana esquecer qual era a matéria que estavam estudando. - Sabe o que é isso? - ele perguntou, aproximando o rosto - Inveja da minha genialidade. Ela se afastou instintivamente, mas não o suficiente. O rosto dele estava perto demais, O olhar também. Por um segundo, era como se estivessem sozinhos, os olhos dele caíram para a boca de Joana, o coração dela bateu mais alto, muito mais alto. Ela nunca beijou na boca e toda vez que isso acontecia, ela sentia como se estivesse queimando de antecipação, por dentro e Tarso, a ele adorava provocar ela, ele sabia que a deixava com os sentidos bagunçados só de olhar por mais tempo em seus olhos, o que sempre se perguntava era até quando conseguiria se segurar, pois a cada dia que passava era mais insuportável o desejo que ele tinha de beijar aquela boca, que sempre estava com gloss brilhante e quando ela o olhava, com toda certeza via sua alma, pois ele se sentia despido diante do olhar de Joana - Tá com medo de mim, caloura? - ele sussurrou, bem próximo do seu ouvido e ela sentiu seu pescoço arrepiar, com o halito quente dele. - Não estou com medo da sua cara de pau - ela respondeu, baixando o olhar e pegando o lápis como se aquilo fosse salvar sua dignidade. Eles voltaram a estudar - ou fingiram que sim. Mas dali em diante, o clima estava diferente, não era a primeira vez que isso acontecia. Nem seria a última. Nos corredores, a proximidade dos dois já começava a chamar atenção. - Vocês dois parecem um casal namorados - comentou Rafaela, uma amiga de Tarso, ao vê-los trocando farpas e brincando perto do bebedouro. Joana fingiu rir, mas o seu estômago deu um nó. Tarso apenas deu de ombros. - Amizade sincera incomoda? - ele respondeu, tentando parecer natural. Mas não parecia. Na aula de Educação Física, enquanto os times se organizavam para o vôlei, Joana tentou ignorar os olhos de Tarso seguindo cada passo dela. Quando ela foi para o saque, errou feio - e ele foi o primeiro a gritar "Boa, craque!" Seguido de risos. Mas quando ela virou o rosto com um sorrisinho irritado, encontrou o olhar dele. Intenso. Quase... Orgulhoso. Ela engoliu seco, quase perdeu o ar, ele estava correndo em volta do campo de bermuda e camiseta, todo suado, suas as roupas grudavam em seu corpo deixando evidente cada músculo que ela sempre sentia quando era abraçada por ele. Na saída da escola, naquele mesmo dia, ele a esperou no portão, já de banho tomado claro. - Quer que eu te leve hoje? - perguntou, com o tom leve de sempre. - Você nem vai para o mesmo lado que eu - ela respondeu, mesmo já caminhando com ele. - Só queria andar mais um pouco contigo. Ele não a olhou quando disse aquilo, mas Joana sentiu algo com o que ele disse. Eles estavam ficando bons nisso: viver em cima da linha tênue entre a amizade e algo mais. Brincavam com fogo. Tocavam, sorriam, provocavam. Mas na hora de queimar, Sempre recuavam. Talvez fosse medo ou talvez soubessem que, se passassem daquele limite, não teria mais volta. Logo chegou o final de semana, e o sol batia forte no quintal da casa de Tarso, o som da música, coversas e o risos altos das suas famílias, hoje com a presença dos seus avós, na verdade eram avós somente de Tarso, mas no período da faculdade em que suas mães moravam juntas da republica, os avós de Joana, pais de Alicia, faleceram em um acidente de carro, com isso os pais de Sophia adotaram Alicia como filha, ela amava estar junto com eles e tinham ali também os avós por parte dos pais, das duas famílias. O cheiro do churrasco no ar - tudo isso criava uma atmosfera perfeita para qualquer coisa, menos para estudar. Joana estava lá, sentada em uma mesinha com dois copos de refrigerante, alguns papéis voando com o vento e o caderno de matemática aberto na parte de equações, de novo. - A ideia era você me ajudar com os exercícios, não me distrair comendo churrasco - ela disse, semicerrando os olhos para ele, que vinha da cozinha com duas fatias de pão de alho e um sorriso largo. Ele realmente era lindo que olhos e ombros largos compunham uma bela figura. - Eu consigo fazer as duas coisas ao mesmo tempo - ele disse, sentando ao lado dela, tão perto que ela sentiu o cheiro do perfume dele. Aquele cheiro bom, amadeirado com hortelã, meio perigoso e refrescante. Joana tentou focar nos números, mas era difícil. Ainda mais com ele olhando o caderno por cima do ombro dela, encostando só um pouco mais, como quem não quer nada. Só o suficiente para fazer a pele dela esquentar. - Aqui, ó - ele apontou quase encostando o seu rosto no dela. - Você tem que multiplicar cruzado. Regra de três é tipo relacionamento: se você errar o cruzamento, dá tudo errado. - E você entende muito de relacionamento, né? - ela retrucou, sem conseguir esconder o sorriso. Tarso riu e encostou o queixo no ombro dela, rápido, como uma brincadeira. Mas ficou um segundo a mais do que devia. Joana nem respirou fundo, ele percebeu. - E se eu entendesse? - ele murmurou perto demais. - Você me deixaria te ensinar? O coração dela disparou. Ela fingiu procurar uma caneta dentro da mochila só pra quebrar o momento. Mas o clima... Já estava feito. No quintal, alguém aumentou o som. Uma música romântica e brega começou a tocar, daquelas que a mãe do Tarso adorava colocar nesses churrascos, ele riam e dançavam, sempre bebendo alguma coisa para se refrescar. - A gente pode ir lá dentro, se quiser - ele sugeriu, quase num sussurro. - Tem menos barulho... E ar-condicionado. Ela hesitou. Olhou para o caderno, para a letra dela toda torta no meio da equação inacabada. E então olhou para ele. - Você só quer fugir da parte difícil da matéria - ela disse. - Não é a matéria que tá difícil - ele respondeu. - É você. Joana segurou o lápis com força. Sentiu o rosto queimar até as orelhas. Tarso se levantou e estendeu a mão para ela, como quem convida para dançar. Mas ela sabia: não era só uma dança. Nem só um estudo. Era mais um passo naquela corda bamba que os dois caminhavam juntos, sem saber até quando conseguiriam se equilibrar. Ela pegou na mão dele e foram. Tarso falou já no caminho sem olhar para trás, pois seus pais estavam dançando de um jeito intimo, as avós organizando as coisas e os avôs, bom tinha um avô na piscina com Jamal e os outros dois tomando conta da churrasqueira que foi deixada de lado por Leandro e Oliver tirarem suas mulheres para dançar agarradinhos, isso nunca mudava, eles eram eternos namorados. Quando chegaram ao andar de cima, no quarto dele, fecharam todas as janelas e portas e Tarso ligou o ar condicionado. Joana percebeu que o quarto estava arrumado e perguntou se estava tudo bem com ele, pois isso era um milagre, ele riu de lado e disse que arrumou porque sabia que eles iriam estudar ali. O quarto do Tarso estava arrumado do jeito mais charmoso possível: livros organizados nas prateleiras, tênis enfileirados na sapateira, uma guitarra encostada na parede e uma parede de fotos e troféus e medalhas dele estava preenchida, realmente ele era bom. Joana olhou em volta com um sorrisinho no canto da boca. - Então agora o gênio da matemática é organizado - ela comentou, largando a mochila no chão e sentando na beira da cama. - Gênio modesto, por favor - ele respondeu, puxando ela para escrivaninha, colocando o caderno na frente dela e sentando ao lado. - Agora, sem distrações. Você me prometeu que hoje a gente ia estudar de verdade, se ele a deixasse ficar na cama, não responderia por si, e poderia não ter volta. - Eu prometi tentar. Por um bom tempo, conseguiram manter o foco. Resolveram dois exercícios completos, Joana entendeu finalmente a tal da maldita equação, e Tarso até parecia concentrado. Só parecia. Porque em algum momento, entre uma explicação e outra, ele se inclinou para mostrar a conta na folha dela - e ficou ali, perto demais. Joana virou o rosto, e quando percebeu, os dois estavam a centímetros de distância, de novo, isso estava virando rotina. Os olhos dele escorregaram para os lábios dela. Os dela vacilaram, sem coragem de encarar os dele por muito tempo. - você entendeu agora? - ele perguntou, mas a voz saiu mais baixa, quase um sussurro, parecia que o ar estava rarefeito. Ela assentiu, sem dizer nada. Estava olhando a boca dele. E ele a dela. O mundo ao redor pareceu sumir - de novo. O silêncio ficou pesado, denso. E justo quando Tarso começou a inclinar o rosto devagar - devagar demais -, uma batida na porta interrompeu o feitiço. - Filhão! - era a voz do pai dele, alta, vinda do corredor. - A Joana ainda tá aí? Já são quase dez da noite, ela precisa ir agora Oliver já está no carro, vocês não vão dormir? Tem aula amanhã, hein! Joana deu um pulo, arregalando os olhos. - O quê? - ela correu até o celular. - Meu Deus, eu achei que ainda eram, sei lá, sete horas! Tarso coçou a cabeça, sem graça. Olhou o relógio no canto da tela do computador. - A gente... Meio que perdeu a noção do tempo. Ela começou a juntar os materiais, tropeçando na própria mochila, rindo de tudo aquilo. - Preciso ir, se meus pais não tivessem te visto nascer, acho que eles não teriam me deixado ficar tanto tempo. Ele a acompanhou até a porta descendo as escadas atrás dela, ainda com aquele meio sorriso no rosto. O quase beijo ainda pairava no ar, não dito, não esquecido. - Eles confiam em mim, sabem que eu nunca desrespeitaria você! - ele disse, pensando que estava quase fazendo exatamente o contrário do que disse. - Melhor não falarmos do que aconteceu hoje, o dia foi estranho. Tarso sorriu triste e recostou no batente da porta, como se estivesse tentando guardar a imagem dela ali por mais um segundo. - Boa sorte na prova amanhã, caloura. - Boa sorte para você também, gênio. Ela saiu da casa com o coração batendo forte no peito. e ele ficou ali, parado, com a sensação de que se tivessem mais cinco minutos... tudo teria sido diferente. Quando entrou no carro, seu irmão já estava dormindo e os seus pais falaram que já iam esquecendo que ela estava ali, se não fosse por Leandro lembrar que eles ficaram muito tempo estudando dentro de casa. Ela respondeu - verdade nós também perdemos a hora, de tão concentrados que estávamos. Eles seguiram para casa conversando sobre como o dia foi bom. Sempre amavam os dias que ficavam juntos

                         

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