Eu estava escondida dos olhares de todo mundo, agradecendo por todos estarem embriagados o suficiente para estarem dançado e esquecer a declaração pública que eu fiz mais cedo.
- A America Singer aqui sabe que depois do terceiro copo de caipiroska raramente não tem mais volta? – uma voz masculina que eu já tinha ouvido de algum lugar chegou aos meus ouvidos e em seguida ocupou o assento ao meu lado.
Observei os três copos que eu ingeri em minha frente.
Eu pensava que aquela bebida era mais fraca do que qualquer outra coisa ali. Aliás, a cachaça foi substituída pela vodca, e estava misturada a pedaços de limão espremidos, água e açúcar... Por que eu pensei isso mesmo?
Mas não foi nesse detalhe que eu foquei. Foi a maneira que aquele desconhecido se referiu a mim.
- America Singer? – eu virei para encarar aquele homem, a voz mais embargada que a minha intenção. – O quão bêbada eu estou para ter ouvido você falar isso?
Ele abriu um sorriso e eu virei a cabeça de lado para lhe olhar. Tinha um sorriso radiante. E eu sorri de volta.
Por que eu estava sorrindo para um desconhecido em vez de fugir como sempre fazia?
- Acho que está um pouco mais bêbada do que quando gritou que você não era minha querida para todo mundo. – Ele respondeu de volta, ainda sorrindo.
Merda, eu havia feito isso mesmo! E agora aquele homem veio pedir satisfação a mim. Será que ele iria me arrastar para algum lugar e me matar por ter agido de forma tão ríspida sem nem ao menos saber quem ele era?
Mas bem, ele não podia ser alguém assim. Não se ele sabia do lugar de onde aquela frase era e de quem pertencia. Ao menos que ele fosse um psicopata de mulheres inocentes apaixonadas por clichês.
Percebi que o álcool nas minhas veias começou a fazer efeito quando eu ignorei os meus medos reais e continuei a conversar com aquele estranho.
- E de onde você conhece essa citação? – foi tudo que eu perguntei. – Você me parece bem másculo para ler histórias assim, eu admito.
Ele sorriu mais uma vez e eu me odiei por não ter desviado o olhar e dessa vez, eu comecei a admirar o homem na minha frente. Ele tinha a pele bronzeada, uma barba bem desenhada, e os olhos eu não conseguia decifrar a cor porque estava acontecendo um jogo de luzes diferentes atrás dele. Notei a tatuagem em seu braço, os lábios carnudos e, não me dei conta que estava próxima demais do seu rosto.
- Qual é a cor dos seus olhos? – eu perguntei, próxima demais para finalmente notar.
- Negros. – Ele respondeu e eu falei junto com ele ainda próxima o suficiente.
Sorri e me afastei daquele cara. Voltei a beber e ele fez uma careta para mais um copo vazio que eu deixei.
- Você está aqui sozinha? – ele perguntou.
- Por que você quer saber? – eu fiz biquinho e semicerrei os olhos.
Ele sorriu mais uma vez. O que havia de tão divertido?
- É só que se você for beber mais um pouco... Precisará de ajuda. – Ele me olhou com a testa franzida.
- E quem é você mesmo para me dizer o quanto eu devo beber? – eu sorri e me levantei daquele banco, segurei na bancada do bar para não escorregar. – Eu só estou me divertindo. E eu não preciso de ninguém ao meu lado para eu me divertir. Não preciso de babá e sei a quantidade certa para beber. Não é a minha primeira vez. – Menti, e eu notei que mais uma vez, eu me aproximei dele.
- E quase que mais uma vez você dava outro discurso sobre como não precisa da opinião dos outros. – Ele respondeu e segurou minha cintura quando eu cambaleei para o lado.
- Então, você estava aqui e ouviu o meu desabafo? – eu perguntei e segurei em seu ombro, ele apenas assentiu. – Então como você e todo mundo aqui sabe que eu sou virgem, você também deve saber que eu não vou transar com você só porque eu estou bêbada. – Dei de ombros e me afastei dele.
Coloquei as mãos na cintura e olhei sua reação mais uma vez. Dessa vez, ele não sorriu. Seus olhos ficaram cravados em mim, os lábios entreabertos e ele parecia confuso.
- Não sabia que estava passando essa impressão. – Ele respondeu de volta.
Eu gargalhei. Do quê, eu não sabia.
As pessoas da pista de dança me empurraram e eu voltei para mais perto da bancada.
- Olha só quantas pessoas aqui. – Eu comecei a falar e indiquei para todo mundo. – O que levaria você a vir falar comigo aqui? Eu acredito que nada. Porque eu não sou tão fácil assim.
- Eu só queria saber quem era a garota fã de literatura aqui. – Ele sorriu de lado e eu fiz uma careta.
- E por que isso lhe interessa? Qual é o seu problema? – tentei parecer sóbria o suficiente e voltei a sentar naquele banco.
- Eu sou professor de Literatura, e você citar A Seleção de maneira tão abrupta daquela forma chamou minha atenção.
Mordi o lábio e baixei a cabeça, morta de vergonha.
Era óbvio que ele seria alguém maduro. Era um dos únicos caras que não estava drogado e nem beijando todo mundo. E nem parecia bêbado, assim como eu, professora de educação infantil, estava. Mas eu não me culpava.
Eu estava bem, não estava? Não havia feito nenhuma besteira.
- E você? Quem é? – ele me perguntou enquanto eu ainda estava tentando deixar minha imaginação naquele lugar e momento.
- Eu também sou professora. E estou aqui para a conferência. E só para você saber, eu não estou bêbada. Eu sou assim, na vida real. O tempo todo. – Eu comecei a falar. – Sou uma profissional brilhante e também sou uma mulher madura, que não surta daquele jeito e...
- Meu nome é Oliver. – Ele me interrompeu e estendeu a mão para mim e eu finalmente, respirei.
- Oliver? – eu chamei de volta.
- Sim. De Oliver Twist, do romance de Charles Dickens. – Ele explicou.
- Eu iria falar Oliver Queen de Arrow. – Eu sussurrei e gargalhei em seguida.
Isso tudo era tão engraçado.
- É interessante também. – Ele me acompanhou sorrindo. – Meu pai é um grande fã de Literatura inglesa. E eu fui o alvo da homenagem. – Ele explicou e de repente, aquele assunto chamou minha atenção.
E eu desejei por um instante, estar com a minha mente cem por cento sóbria, porque aquele cara parecia ser suportável.
- Da literatura inglesa, eu prefiro Jane Austen. – Eu respondi. – Mas acho que você já deve ter notado.
Ele balançou a cabeça e sorriu de lado. Notei mais uma vez sua expressão e vi que ele parecia mais bonito agora que ele não era tão desconhecido.
- Eu já falei que uso frases de livros para quase tudo na minha vida? Por isso sou solteira. – Eu disse.
- Acho que a primeira observação eu percebi. Fui alvo. – Ele parecia se divertir, mas eu ignorei.
- Eu não consigo segurar a língua. Prefiro envenenar os outros com as palavras que eu vá me arrepender depois, do que morrer engasgada com elas. – Me levantei daquele banco outra vez.
Dessa vez, Oliver não falou nada. Continuou me encarando como se eu tivesse dito ou feito algo inacreditável. Eu não fiz, fiz? Eu só fui eu mesma. Com alguém que eu não conhecia.
O efeito do álcool não me deixou tão racional e eu fiquei preocupada com o que seria de mim no resto da noite se eu continuasse daquele jeito, destemida.
- Ei, vem dançar. – Eu puxei a mão daquele homem, o arrastando para perto.
Ele levantou com petulância e percebi o quanto ele era alto. Olhei para cima para observar sua expressão.
- E só para lembrar você, eu não faço isso com frequência. Eu não confio em quase ninguém. Então, você deve só ser sortudo por estar perto de mim enquanto eu bebia pela primeira vez. – Dei de ombros, e voltei a pegar sua mão o puxando para o centro do salão.
Percebi que a minha mão queimava e arrepios fortes estavam sobre todo meu corpo enquanto eu trazia Oliver para mais perto de mim. A sensação me causou ardência e eu adorei aquilo. Me deu a sensação de estar viva. Era isso ou era o álcool.
- Hey, você ainda não me disse o seu nome. – Oliver se abaixou e falou no meu ouvido, tremi quando seus lábios tocaram minha orelha.
- Faça isso valer a pena, e em breve você saberá. – Eu gritei sobre a música alta e voltei a dançar em sua frente.
E o sorriso estava em seu rosto mais uma vez. Dessa vez, indescritivelmente encantador.
E em meus pensamentos ecoaram as seguintes palavras: eu estou encantada em conhecê-lo, Oliver.