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A lua cheia pairava sobre Valmort como um olho atento. Selena não conseguia dormir. O diário da tia, o beijo de Damien, as visões... Tudo girava dentro dela, como um redemoinho de fogo.
Ao descer para a cozinha, encontrou a porta dos fundos entreaberta. Nenhum vento. Nenhum ruído. E ainda assim, uma sensação de presença. Quando fechou a porta, ele estava lá. No meio da sala.
Damien.
- Você precisa parar com isso - sussurrou ela, com raiva e medo na voz.
- E você precisa lembrar. - Ele deu um passo à frente. - Não tenho mais tempo para sutilezas.
Selena o empurrou.
- Você quer que eu aceite um passado que nem é meu!
- Mas é. E não lembrar vai te destruir. Vai nos destruir.
A palavra "nós" soou como uma lâmina afiada. Ela odiava como o peito se apertava ao ouvir aquilo.
- Prove - disse ela. - Me mostre.
Ele hesitou. Então estendeu a mão.
- Confie em mim. Por uma noite.
Contra todo o instinto, Selena aceitou. Quando tocou sua mão, o mundo escureceu.
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Acordou em outro lugar. Outra época.
Estava vestida de seda rubra, os cabelos trançados em pedras vermelhas. Estava em um castelo - o castelo. Um trono de ossos e veludo se ergueva diante dela. E nele, Damien. Mais jovem. Mais cruel. Mais rei.
Ao seu lado, um círculo de sangue no chão. O som de sinos distantes. E uma versão dela - a de séculos atrás - ajoelhando-se diante dele.
- Selena de Elyria - dizia ele, a voz ecoando. - Você aceita a marca da sombra?
- Aceito. - respondeu a antiga Selena, com um olhar de adoração sombria.
Damien a beijava na testa. Ela chorava. Não de dor. De entrega.
Selena atual cambaleou, sufocada pelas imagens.
- Isso não pode ser real - murmurou.
Damien, agora ao seu lado novamente, segurou sua cintura.
- Você foi minha rainha. Minha luz na escuridão. E também minha ruína.
A visão se dissipou como fumaça. Estavam de volta à mansão.
- Por que me trouxe isso? - ela gritou.
- Porque há um ritual que se repete. A cada quatrocentos anos. E sempre termina com sua morte.
- E você?
Ele sorriu, sombrio.
- Eu fico. Com sua dor. Com seu sangue nas mãos. Eu sou condenado a lembrar tudo. Você, a esquecer. Mas desta vez... desta vez, algo mudou.
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Nos dias seguintes, Selena começou a mudar. Sentia as mãos queimarem ao tocar o espelho da mansão. Palavras antigas vinham à sua mente. Sonhava com um círculo de mulheres encapuzadas, murmurando em línguas mortas. E via Damien em todos os lugares - em reflexos, em sombras, em suspiros.
A cidade começou a reagir. Pessoas evitavam olhar para ela. Crianças choravam ao passar por seu portão. E uma mulher idosa, coberta de medalhas religiosas, cuspiu ao vê-la.
- A Noiva voltou - disse.
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Em uma noite de tempestade, Damien apareceu novamente.
- O ciclo vai se fechar na próxima lua nova - disse ele. - E desta vez, você precisa escolher.
- Escolher o quê?
- Se morre comigo... ou se vive sem mim.
Ele se aproximou, as mãos pegando fogo de desejo. Selena queria odiá-lo. Mas o corpo, a alma, o sangue - todos o chamavam.
O beijo foi inevitável. Ardente. Marcado por séculos de saudade e fúria.
E então, Damien a levou. Não como um homem leva uma mulher. Mas como um rei toma sua rainha de volta ao trono que foi deles. Cada toque era memória. Cada sussurro, uma promessa quebrada.
Na manhã seguinte, ela sangrou. Não de dor. De transição.
Algo dentro dela havia despertado. Algo antigo. Algo sombrio.
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Selena se olhava no espelho.
Mas quem a encarava de volta... era a Selena de Elyria.
E ela estava sorrindo.
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