JP correu até Isabela, o jornal amassado na mão.
Ele apontou para as fotos, para as manchetes.
Os olhos dele imploravam por uma explicação, por ajuda.
Isabela folheou o jornal com um ar entediado.
"Ah, isso", ela disse, dando de ombros. "Não se preocupe, querido. É só fofoca barata."
Indiferente. Evasiva.
JP sacudiu a cabeça, a angústia crescendo.
Ele fez sinais frenéticos.
Isso. É. Horrível. Você. Não. Vê?
Isabela suspirou, como se ele fosse uma criança birrenta.
"As pessoas são cruéis, JP. Especialmente com gente como... você."
"Ric é uma estrela em ascensão", Isabela continuou, a voz condescendente.
"Ele precisa de uma imagem impecável. Qualquer escândalo pode prejudicar a carreira dele."
Ela olhou para JP, um brilho de desprezo nos olhos.
"Você, por outro lado... O que você tem a perder? Você já é o pescador mudo, o coitado. Essas fotos só confirmam o que todos já pensam."
As palavras dela eram como tapas.
Sua origem humilde. Sua mudez.
Tudo usado para diminuí-lo, para justificar a crueldade.
"Você deveria entender, JP. O mundo não é justo com os fracos."
Injustiça. Humilhação. Raiva.
JP sentiu tudo isso queimar dentro dele.
JP começou a rir.
Um riso amargo, seco, que se transformou em soluços.
Lágrimas escorriam pelo seu rosto, misturando-se à sujeira e ao suor.
Ele aceitava.
Ele era o nada. O lixo. O peixe podre.
Isabela o olhava, surpresa com a reação.
Ele enxugou as lágrimas com as costas da mão.
Fez um sinal para ela.
Não. Vou. Pedir. Desculpas.
Não por isso. Não por ser quem ele era.
Ele se virou e saiu da sala, deixando Isabela com sua crueldade.
A dignidade era a única coisa que lhe restava.
E ele não a entregaria.
Naquela noite, a segunda dose.
Mais uma gota na bebida de Isabela.
Mais uma na de Ric.
Mais uma na sua própria.
O ritual continuava.
A vingança era um caminho escuro, solitário.
Mas JP estava determinado a percorrê-lo até o fim.
Ele não tinha mais nada a perder.
Ou talvez tivesse.
Sua alma.
Mas ele já não se importava.
Chegou o aniversário de JP.
Isabela organizou uma festa surpresa.
Surpresa para ele, claro.
Todos os amigos ricos dela estavam lá.
Rindo, bebendo, falando alto.
JP se sentia um peixe fora d'água.
Os convidados o olhavam com pena e zombaria.
"Coitadinho do mudo", ouviu alguém cochichar.
"Olha a roupa dele! Parece que pegou emprestado do Ric."
JP olhou para o terno caro que Isabela o fizera usar.
Era verdade. Ele tinha visto Ric usando um igualzinho na semana passada.
Humilhação.
Isabela? Ignorava-o. Estava ocupada demais rindo com Ric.
Ele lembrou de outro aniversário.
Logo depois que se casaram.
Isabela o levara para uma praia deserta.
Um piquenique simples, só os dois.
Ela o defendera de um comentário maldoso de um garçom num restaurante chique.
"Ele é meu marido, e você vai tratá-lo com respeito!", ela dissera, furiosa.
Naquele dia, ele se sentiu protegido, amado.
Agora, ela era a fonte da sua dor.
A indiferença dela cortava mais fundo que qualquer zombaria.
Onde estava aquela Isabela?
Teria ela existido algum dia?
Ou tudo não passara de uma ilusão?
De repente, as luzes do salão se apagaram.
Um telão desceu do teto.
Fotos apareceram.
Ric. Na cama. Com uma mulher.
Os rostos se beijando, corpos entrelaçados.
O rosto da mulher estava habilmente obscurecido nas sombras.
Mas o corpo, as joias...
JP reconheceu.
Era Isabela.
Um silêncio chocado caiu sobre a festa.
Depois, cochichos, risadinhas.
Escândalo.