Miguel aproximou-se da cama, o desejo a toldar-lhe o discernimento.
A escuridão do quarto, o álcool, a silhueta feminina.
"Beatriz, minha querida," sussurrou ele, a voz rouca. "Estás tão bonita esta noite."
As suas mãos percorreram o corpo de Sofia, deslizando pelo tecido fino do vestido que ela usava.
Ele despiu-a lentamente, os seus lábios a encontrarem o pescoço dela, a clavícula.
Sofia prendeu a respiração, o seu corpo a reagir ao toque dele, mas a sua mente fria e calculista.
Ele pressionou-a contra si, a paixão a consumi-lo.
No momento crucial, quando ele estava prestes a possuí-la, Sofia virou o rosto.
"Sr. Miguel?"
A sua voz, clara e formal, cortou a névoa de desejo dele.
Miguel parou, confuso.
Acendeu a luz da mesa de cabeceira.
E viu-a.
Sofia, nua, a cobrir-se apressadamente com o lençol, o rosto uma máscara de choque e vergonha.
Ele recuou como se tivesse sido queimado.
"Sofia! O que... o que raio estás a fazer aqui?"
A sua voz era um misto de raiva e constrangimento.
Sofia encolheu-se, as lágrimas a brotarem-lhe nos olhos.
"Eu... eu não sei, Sr. Miguel. A D. Beatriz pediu-me para esperar por ela aqui. Disse que tinha algo para mim. Eu adormeci à espera..."
Uma mentira plausível.
Miguel olhou para ela, depois para a cama, para si mesmo.
A fúria dominou-o.
Sentiu-se um idiota, manipulado.
Saiu do quarto abruptamente, batendo a porta atrás de si.
Sofia ficou sozinha, o sorriso a espalhar-se-lhe lentamente pelos lábios.
Ele estava interessado.
Mais do que interessado.
Agora, era altura de jogar o jogo do gato e do rato.
Começou a evitá-lo.
No escritório, mantinha-se estritamente profissional.
Se ele se aproximava, ela encontrava uma desculpa para se afastar.
A sua curiosidade, a sua intriga, cresciam a cada dia.
Ele não conseguia tirá-la da cabeça.
Beatriz, por outro lado, sentia a mudança.
Sentia o distanciamento de Miguel, a sua crescente irritação com ela.
E culpava Sofia.
Um dia, chamou Sofia a uma sala de reuniões vazia.
"Sua vadiazinha," sibilou Beatriz, assim que a porta se fechou. "Pensas que não sei o que andas a fazer?"
Sofia manteve a calma, a expressão neutra.
"Não sei do que fala, D. Beatriz."
Beatriz riu, um som desagradável.
"Achaste mesmo que podias roubar o meu noivo e sair impune?"
Agarrou um pesado agrafador da mesa e atirou-lho.
Sofia desviou-se a tempo, o objeto a embater na parede com um estrondo.
Beatriz avançou, o rosto vermelho de ódio.
Começou a agredi-la, bofetadas, arranhões.
Sofia não reagiu, não se defendeu.
Apenas suportou, o seu corpo a absorver os golpes, a sua mente a registar cada detalhe.
Quando Beatriz se cansou, exausta e ofegante, Sofia apenas se recompôs.
A blusa rasgada, o cabelo despenteado, marcas vermelhas a surgirem-lhe no rosto e nos braços.
Saiu da sala em silêncio, sem uma palavra de queixa.
Deixando Beatriz a ferver na sua própria raiva impotente.