Acordei com o cheiro a antissético e o som suave de um monitor cardíaco. Uma enfermeira estava a ajustar o meu soro.
"Onde está o meu bebé?" perguntei, a minha voz fraca. A minha barriga sentia-se estranhamente vazia. Plana.
A enfermeira olhou para mim com pena.
"A doutora virá falar consigo em breve, querida."
Mas eu já sabia. O vazio dentro de mim era mais do que físico. Era uma ausência que gritava.
Quando a médica entrou, as suas palavras foram gentis, mas diretas. A perda de sangue, o trauma do acidente, o atraso no socorro. O meu filho não sobreviveu.
Eu não chorei. Fiquei apenas a olhar para a parede branca, sentindo-me completamente oca.
Horas mais tarde, Miguel entrou no quarto. Ele parecia cansado, mas ileso.
"Laura, como te sentes?"
Não respondi.
Ele suspirou, passando a mão pelo cabelo.
"Olha, foi um acidente terrível. A Sofia partiu o braço e está em choque. A minha mãe está com ela agora."
Ele falou da Sofia primeiro. Claro que sim.
"O nosso filho morreu, Miguel."
As palavras saíram sem emoção, factos frios e duros.
Ele vacilou.
"Eu sei. Eu... sinto muito. A médica disse-me. Foi... foi inevitável."
"Inevitável?" A minha voz finalmente ganhou força. "Tu deixaste-me lá. Eu estava a sangrar, a implorar por ajuda, e tu foste ter com ela."
"A Sofia estava em pânico!" ele defendeu-se, a sua voz a subir. "Ela não tem mais ninguém! Tu és forte, Laura, eu pensei que aguentarias até a ajuda chegar."
Pensei que eu aguentaria. Ele não se importou, ele apenas assumiu.
"Eu era a tua esposa. Grávida do teu filho."
"E por isso devias entender!" ele retorquiu. "A minha responsabilidade pela Sofia é enorme. Os pais dela confiaram-ma a mim antes de morrerem!"
A porta abriu-se e a minha sogra, Helena, entrou. Ela ignorou-me completamente e foi direta ao Miguel, a afagar-lhe o braço.
"Meu filho, como estás? A pobre Sofia não para de chorar. Ela está tão assustada."
Depois, ela finalmente olhou para mim, os seus olhos frios como gelo.
"Espero que estejas satisfeita, Laura. Sempre a distrair o meu filho. Por tua causa, a Sofia podia ter morrido."