Livre Finalmente: O Coração Que Não Espera Mais
img img Livre Finalmente: O Coração Que Não Espera Mais img Capítulo 4
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Capítulo 4

Acordei com o som da porta a ranger.

A luz fraca da manhã entrava, cegando-me momentaneamente, a minha cabeça latejava, o meu corpo estava rígido e dorido.

Duarte estava ali, de pé, a olhar para mim, a sua silhueta recortada contra a luz.

Ele tinha um pequeno kit de primeiros socorros na mão.

Ajoelhou-se ao meu lado e, com um pano húmido, começou a limpar o sangue seco do meu rosto, o seu toque era gentil, uma memória dolorosa de um tempo que já não existia.

"Lúcia, eu sinto muito", sussurrou ele, a sua voz rouca. "Eu não queria que isto acontecesse."

"Então porque não fizeste nada?", perguntei, a minha voz fraca, mas cheia de uma acusação silenciosa.

"Não podia", disse ele, sem me olhar nos olhos. "Se eu te defendesse, o meu pai... ele teria sido ainda pior, teria tornado a tua vida num inferno ainda maior, fiz isto para te proteger."

A sua desculpa era tão frágil, tão patética.

"Protegermo-nos? Trancando-me numa adega? Deixando o teu pai bater-me?"

"Tu acreditas em mim, Duarte?", perguntei, a minha voz a tremer. "Acreditas que eu sou inocente?"

Ele ficou em silêncio, um silêncio que era mais alto do que qualquer grito, esse silêncio foi a sua resposta.

Ele não acreditava em mim.

"Porque é que tens de os provocar, Lúcia?", disse ele finalmente, a sua voz cheia de frustração. "Porque é que não podes simplesmente manter-te discreta? Estás a tornar tudo tão difícil!"

A culpa era minha, sempre minha.

As lágrimas que eu pensei terem secado voltaram a encher os meus olhos.

"Vai-te embora", solucei, a dor a rasgar-me a garganta. "Por favor, vai-te embora."

"Não, Lúcia, por favor", ele implorou, segurando a minha mão. "Dá-me só mais um pouco de tempo, vamos voltar ao que éramos, no Algarve, só tu e eu, eu prometo."

Promessas vazias, sonhos impossíveis.

O seu telemóvel tocou, interrompendo o momento, ele olhou para o ecrã e a sua expressão mudou.

"É a Sofia, tenho de ir."

Ele levantou-se, deixando-me ali, no chão frio.

"Eu volto mais tarde", prometeu ele, mas eu sabia que não voltaria.

A chuva começou a cair lá fora, uma chuva fria e persistente, como as minhas lágrimas.

Ele foi-se embora, deixando-me sozinha na minha prisão húmida, a porta entreaberta, mas eu não tinha para onde ir.

Esperei, mas ele não voltou, as horas passaram, a chuva transformou-se numa tempestade.

Tentei ligar-lhe, mas o seu telemóvel estava desligado.

Finalmente, a exaustão e a fome venceram a dor, arrastei-me para fora da adega, a chuva a encharcar-me instantaneamente.

O caminho de volta para a pequena casa de caseiros onde me tinham instalado parecia uma jornada de mil quilómetros, cada passo era uma agonia.

Quando finalmente cheguei, encharcada e a tremer, ouvi vozes vindas do interior da casa principal.

Aproximei-me da janela, o meu corpo a protestar, e espreitei.

A cena que vi quebrou o que restava do meu coração.

Sofia estava sentada numa poltrona, os seus pés no colo de Duarte, ele estava a massajá-los gentilmente, um gesto íntimo, um gesto que costumava ser nosso.

Ela ria de algo que ele dizia, o som do seu riso era como vidro a moer dentro de mim.

Aquele gesto, aquela intimidade, era a prova final, eu tinha sido completamente e irrevogavelmente substituída.

                         

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