No hospital, o cheiro a antisséptico enchia o ar. As luzes brancas do teto eram demasiado brilhantes.
Uma enfermeira entrou no quarto, o seu rosto era uma máscara de profissionalismo.
"Sra. Almeida, fizemos tudo o que podíamos."
Ela fez uma pausa, e eu prendi a respiração.
"Lamento imenso. Perdemos o bebé."
As palavras dela não pareciam reais. Flutuavam no ar, sem sentido. Eu toquei na minha barriga. Estava mole e vazia. O movimento constante a que me tinha habituado nos últimos meses tinha desaparecido.
Não havia mais pontapés. Não havia mais vida.
Fiquei em silêncio. Não chorei. Não gritei. Senti apenas um vazio imenso, um buraco negro onde o meu filho costumava estar.
A minha sogra, a Sra. Almeida, chegou uma hora depois. Os seus olhos estavam vermelhos e inchados. Ela correu para a minha cama e agarrou na minha mão.
"Sofia, minha querida, eu soube agora mesmo. Eu sinto muito, tanto."
As suas lágrimas caíam na minha mão. Ela era a única pessoa daquela família que alguma vez me tinha mostrado alguma bondade genuína.
"Onde está o Tiago?" perguntei, a minha voz soava estranha, distante.
Ela hesitou, o seu olhar desviou-se. "Ele... ele está a caminho. O pai dele ligou-lhe. Eles estavam preocupados com a Lara."
Preocupados com a Lara. Claro que estavam. Uma febre era, aparentemente, mais grave do que uma hemorragia de gravidez.
"Ele não atendeu as minhas chamadas," disse eu, sem emoção. "Nem o pai dele. Disseram-me para não os incomodar."
A Sra. Almeida soluçou. "Eu sei. Eu não sei o que dizer, Sofia. Eles... eles são obcecados pela Lara desde que a mãe dela morreu. É como se mais nada importasse."
Ela apertou a minha mão com força. "Descansa, por favor. Eu fico aqui contigo."
Fechei os olhos. O rosto do Tiago a dizer "É só a Sofia a fazer drama" repetia-se na minha mente.
O meu bebé tinha morrido. E a única razão era porque o pai dele estava demasiado ocupado a consolar a irmã por causa de uma febre.
O amor que eu sentia pelo Tiago, que já estava frágil, partiu-se nesse momento. Desfez-se em pó.