Acordei com o cheiro a antissético e o som suave de um monitor cardíaco. As paredes eram brancas. Hospital.
Uma enfermeira estava a ajustar o meu soro. Ela sorriu-me com tristeza.
"Como se sente?"
Eu não respondi. Levei a mão à minha barriga. Estava vazia. Plana. O peso que carreguei durante sete meses tinha desaparecido.
As lágrimas começaram a rolar silenciosamente pelo meu rosto. Eu não soluçava. Apenas sentia a humidade quente na minha pele.
O bebé tinha-se ido.
A porta abriu-se e Pedro entrou. Ele parecia cansado. Tinha trocado de roupa.
Ele sentou-se na cadeira ao lado da minha cama, evitando o meu olhar.
"O médico disse que foi por causa do stress e da queda," disse ele, como se estivesse a relatar o tempo. "Não havia nada que ninguém pudesse fazer."
Nada que ninguém pudesse fazer.
Eu continuei a olhar para o teto. O silêncio no quarto era pesado.
"Tu podias," disse eu, a minha voz rouca e vazia. "Tu podias ter feito alguma coisa. Podias ter vindo buscar-me."
Ele suspirou, um som de frustração. "Lia, não vamos começar com isto. Foi um terramoto. Pessoas morreram. Eu fiz uma escolha. A Sofia estava em pânico, sozinha."
"E eu?" perguntei, virando finalmente a cabeça para o encarar. "Eu não estava sozinha? Eu não estava em pânico? Eu estava a carregar o teu filho."
"Eu não sabia que o teu prédio ia ruir!" ele explodiu, levantando-se. "Como podia eu saber? Pensei que estavas segura no escritório! A Sofia ligou-me a chorar, a dizer que as coisas estavam a cair das prateleiras. Eu fui para onde achei que a necessidade era maior!"
A necessidade era maior. Um arranhão no cotovelo.
"Eu quero o divórcio, Pedro."
As palavras saíram antes que eu pudesse pensar nelas. Mas assim que as disse, soube que eram a única verdade que me restava.
Ele olhou para mim, chocado. "O quê? Estás a brincar? Por causa disto? Acabaste de perder um bebé, não estás a pensar com clareza."
"Eu nunca pensei com tanta clareza em toda a minha vida," respondi, a minha voz firme pela primeira vez. "Acabou."
Ele passou as mãos pelo cabelo, furioso. "Tu não podes fazer isto. Não agora. A minha família... a Sofia... ela já se sente culpada o suficiente."
Mais uma vez, a Sofia. Sempre a Sofia.
O nosso filho estava morto, e ele estava preocupado com os sentimentos da irmã adotiva dele.
"Sai," disse eu, virando-lhe as costas. "Sai do meu quarto."
Ele ficou ali por um momento, provavelmente à espera que eu mudasse de ideias. Quando não o fiz, ele saiu, batendo a porta atrás de si.
Eu fechei os olhos. A dor no meu corpo não era nada comparada ao vazio gelado que se instalara no meu peito.