Na manhã seguinte, eu estava no Café Central às dez em ponto.
O lugar estava meio vazio.
Procurei um rosto que pudesse pertencer à pessoa misteriosa.
Uma mulher sentada num canto acenou para mim.
Ela parecia ter uns quarenta e poucos anos, com um rosto cansado mas olhos determinados.
Sentei-me em frente a ela.
"Você é a Ana?", perguntou ela.
"Sim. E você é?"
"O meu nome é Clara. Eu era a cozinheira na creche do Lucas."
O meu pulso acelerou.
"Você enviou a mensagem."
"Sim."
"O que quer dizer com 'não foi um acidente'?"
Clara olhou em volta, nervosa.
"A professora, a Inês, ela não gosta muito de crianças ativas. O Lucas era muito enérgico, corria por todo o lado. Ela estava sempre a ralhar com ele."
"Isso não significa que ela o tenha magoado."
"Não. Mas naquele dia, eu vi algo."
Ela fez uma pausa, a tomar coragem.
"Eu estava na cozinha, que tem uma janela para o recreio. Vi a Inês e o Lucas perto do escorrega. Eles estavam a discutir. O Lucas não queria descer. A Inês parecia zangada. Ela agarrou-o pelo braço e... empurrou-o."
O ar ficou preso nos meus pulmões.
"Ela empurrou-o?"
"Sim. Não foi com muita força, mas foi o suficiente para ele perder o equilíbrio e cair de forma estranha. Ele bateu com a cabeça no chão."
As imagens passaram pela minha mente. O meu filho, assustado. A professora, irritada. Um empurrão. Uma queda.
"Porque é que não disse isto à polícia?"
"Tenho medo. A Inês é sobrinha da diretora da creche. Se eu falar, perco o meu emprego. Tenho dois filhos para sustentar."
"O meu filho está morto!", a minha voz saiu mais alta do que eu pretendia.
"Eu sei. E sinto muito. É por isso que a contactei. Eu não disse à polícia, mas posso dizer a si. Você é a mãe dele. Você merece saber a verdade."
Ela pegou na sua mala.
"Eu tenho de ir. Mas pense nisto. A Inês disse que estava do outro lado do recreio quando ele caiu. É mentira. Ela estava mesmo ao lado dele."
Clara levantou-se e saiu do café, deixando-me sozinha com aquela informação horrível.
A minha dor transformou-se em fúria.
Uma fúria fria e calculista.
Olhei para o relógio. Eu tinha um encontro na esquadra.
Com o Pedro.
E agora, eu tinha uma arma. A verdade.