Quando o médico me disse que o meu filho tinha morrido, o mundo pareceu parar. O som agudo do monitor cardíaco fetal ainda ecoava na minha cabeça, um zumbido constante e doloroso.
Eu estava no hospital, sozinha.
O meu marido, Pedro, não estava aqui.
Peguei no meu telemóvel com as mãos a tremer, o ecrã a mostrar dezenas de chamadas não atendidas para ele.
Liguei novamente.
Desta vez, ele atendeu, mas não foi a voz dele que ouvi primeiro.
"Pedro, querido, podes passar-me a toalha? Esta está um pouco molhada."
Era a voz da minha irmã mais nova, Sofia. Uma voz doce e frágil que eu conhecia demasiado bem.
Seguiu-se um barulho de coisas a mexerem-se, e depois a voz impaciente de Pedro.
"Lia, o que é que queres agora? Estou ocupado."
A sua voz era fria, desprovida de qualquer preocupação.
"Pedro," a minha voz saiu rouca, quebrada. "O nosso bebé... ele..."
"O que tem o bebé?" ele interrompeu, a irritação evidente. "Não me digas que tiveste uma pequena queda e agora estás a fazer um grande alarido. A Sofia caiu das escadas, sabes? Ela podia ter-se magoado a sério. Estou a cuidar dela."
Cuidar dela.
A minha irmã, que vivia connosco desde que os nossos pais morreram. A minha irmã, a quem eu tinha prometido cuidar para sempre.
"Pedro, o nosso filho morreu."
Silêncio. Um silêncio pesado e longo que encheu o ar.
Pensei que ele talvez sentisse algo. Culpa. Tristeza. Qualquer coisa.
Mas o que veio a seguir foi raiva pura e gelada.
"Morreu? Lia, que raio de piada é essa? Estás a tentar chamar a minha atenção com este tipo de mentira? Sabes o quão assustada a Sofia está agora? Ela precisa de mim!"
"Eu não estou a mentir," sussurrei, as lágrimas a escorrerem finalmente pelo meu rosto. "Eu estou no hospital. O médico disse que o coração dele parou de bater."
"Hospital? Que hospital? Porque é que não me avisaste antes?"
"Eu liguei," disse eu, a voz a falhar. "Liguei mais de vinte vezes. Tu não atendeste."
Ele hesitou por um momento. "Eu estava a ajudar a Sofia. Ela estava em pânico. Não vi o telemóvel."
Uma desculpa. Uma desculpa tão fraca.
"Pedro, eu quero o divórcio."
As palavras saíram antes que eu pudesse detê-las. Eram a única verdade que me restava.
"Divórcio?" ele riu, um som feio e cruel. "Estás a falar a sério? Por causa disto? Lia, para de ser tão egoísta. A tua irmã precisa de nós. Tu és a única família que ela tem. E tu queres abandoná-la agora?"
Ele desligou.
Simplesmente desligou.
Olhei para o ecrã escuro do telemóvel. O meu mundo, que já estava em pedaços, partiu-se ainda mais.
O meu filho tinha-se ido. O meu marido não se importava. E a minha irmã... a minha irmã estava com ele.
A dor no meu peito era uma pressão física, tão real que me tirava o fôlego. Não era tristeza. Era um vazio. Um buraco negro onde o meu coração e o meu bebé costumavam estar.
Ele tinha razão numa coisa. A Sofia precisava de mim.
Mas agora, eu percebia que talvez eu nunca a tivesse conhecido de verdade.