O meu nome é Sofia, e o meu filho, Leo, tem leucemia.
Hoje é o seu quinto aniversário.
O médico disse que ele precisa de um transplante de medula óssea o mais rápido possível.
O meu marido, Miguel, é a única pessoa compatível.
Liguei-lhe.
A chamada demorou muito tempo a ser atendida, e quando ele finalmente atendeu, a sua voz estava cheia de impaciência.
"O que foi agora, Sofia? Estou numa reunião importante."
"Miguel, o Leo... ele precisa de ti. O médico disse que a cirurgia tem de ser feita esta semana."
A minha voz tremia, mas tentei manter-me calma.
Do outro lado da linha, ouvi uma voz feminina, doce e deliberadamente baixa.
"Miguel, querido, está tudo bem? A Clarinha está a chorar, acho que quer o papá."
Era a Laura, a sua assistente. E Clarinha era a filha dela.
Uma raiva fria percorreu-me.
"Miguel, estás com elas?"
Ele não respondeu diretamente, a sua irritação aumentou.
"Isso importa? A Clarinha está com febre alta, estou a levá-la ao hospital. Não posso simplesmente ignorá-la, pois não? O Leo está estável no hospital, não está? Tem médicos e enfermeiras a cuidar dele."
"Ela tem febre, e o nosso filho está a morrer!"
A minha voz subiu, atraindo os olhares de outras pessoas no corredor do hospital. Senti o meu rosto a arder.
"Não sejas dramática, Sofia. Tu sabes que eu me preocupo com o Leo. Mas a Laura é uma mãe solteira, ela precisa de ajuda. Sê razoável. Falamos mais tarde."
Ele desligou.
Sem mais explicações, sem perguntar pelo estado do Leo.
Olhei para a porta da unidade de cuidados intensivos. O meu filho estava lá dentro, a lutar pela vida. E o seu pai, a sua única esperança de salvação, estava a cuidar da filha de outra mulher.
A ironia era esmagadora.
Mãe solteira. A Laura tinha uma vida difícil.
E eu? A minha vida era fácil? Passar dias e noites no hospital, a ver o meu filho definhar, a implorar ao homem que prometeu amar-me e proteger-nos para simplesmente aparecer?
Sentei-me no banco frio do corredor, a cabeça entre as mãos. As lágrimas que eu segurava com tanta força começaram a cair, silenciosas e quentes.
O meu telefone vibrou. Era uma mensagem do Miguel.
"Pára de fazer birra. Estarei aí assim que puder. A Clarinha precisa de mim agora."
Não respondi. Apenas apaguei a mensagem.
Naquele momento, uma decisão formou-se na minha mente, clara e dura como o chão de linóleo sob os meus pés.
Se ele não ia salvar o nosso filho, então eu já não tinha um marido.