A minha sogra, a Dona Elvira, apareceu no hospital nessa tarde.
Ela trazia um cesto com comida que eu não conseguia comer.
"Sofia, querida, tens de te alimentar. Estás tão pálida."
Ela olhou para a porta da UCI, os olhos cheios de uma tristeza genuína. Ela amava o Leo.
"Onde está o Miguel? Liguei-lhe e ele não atendeu."
Eu não consegui encará-la.
"Ele está numa viagem de trabalho."
As palavras saíram amargas da minha boca.
A testa da Elvira franziu-se.
"Viagem de trabalho? Agora? Com o Leo neste estado?"
"Aparentemente, é muito importante."
O sarcasmo na minha voz era palpável.
Ela sentou-se ao meu lado, a sua mão a encontrar a minha. A sua pele era enrugada e quente.
"Sofia, o que se passa? Eu conheço o meu filho. Ele ama o Leo. Algo está muito errado."
Finalmente, olhei para ela. Os seus olhos, tão parecidos com os do Miguel, estavam cheios de preocupação.
Contei-lhe tudo. Sobre a Laura, a Clarinha, as chamadas ignoradas, o bloqueio, a viagem ao Algarve.
À medida que eu falava, o rosto dela passava da confusão à incredulidade, e depois a uma fúria silenciosa.
Quando terminei, ela ficou em silêncio por um longo momento.
"Aquele idiota," ela sussurrou, a sua voz a tremer de raiva. "Aquele idiota egoísta."
Ela levantou-se abruptamente.
"Eu vou tratar disto."
"O que vai fazer?"
"Vou trazer o meu filho de volta à realidade. Vou arrastá-lo para aqui pelas orelhas, se for preciso. Ninguém vira as costas ao seu próprio sangue."
Ela pegou no telemóvel e começou a andar de um lado para o outro no corredor.
Primeiro, ligou ao Miguel. Correio de voz.
Depois, ligou para o escritório dele e obteve a mesma informação que eu.
Finalmente, ela ligou para o seu marido, o pai do Miguel.
A sua voz era baixa e controlada, mas eu podia sentir a fúria a fervilhar por baixo.
"Fernando, temos um problema. O nosso filho abandonou o neto. Sim, abandonou. Ele está num resort de luxo enquanto o Leo está a morrer. Precisas de descobrir onde ele está. Agora."
Houve uma pausa.
"Não me interessa o que tens de fazer. Encontra-o."
Ela desligou. Olhou para mim, os seus olhos a arder.
"Não te preocupes, Sofia. Nós vamos encontrá-lo. E ele vai fazer aquele transplante."
Pela primeira vez em dias, senti um vislumbre de esperança. Não estava sozinha nisto.