Sentei-me ao lado da minha mãe no sofá. Ela abriu o álbum de fotografias.
A primeira foto era eu, com dez anos, a sorrir com um dente a menos, a segurar um troféu de natação.
"Lembro-me deste dia," disse a minha mãe. "Estavas tão orgulhosa. Disseste que ias ser campeã olímpica."
Virei a página. Eu na universidade, com um grupo de amigos, a rir para a câmara. Eu parecia feliz. Despreocupada.
Continuei a virar as páginas, uma viagem no tempo pela minha própria vida. A vida antes de Pedro.
Eu era uma pessoa. Tinha sonhos, ambições. Tinha amigos.
Onde é que tudo isso foi parar?
Pedro entrou na minha vida e, lentamente, como uma maré, levou tudo.
Primeiro foram os meus amigos. Ele não gostava deles. "São uma má influência," dizia ele.
Depois foi o meu trabalho. "És demasiado boa para isso," dizia ele. "Eu cuido de ti."
Finalmente, foi a minha confiança. Cada decisão que eu tomava, ele questionava. Cada opinião que eu tinha, ele ridicularizava.
Tornei-me uma sombra de mim mesma, uma extensão dele.
"Ele isolou-te," disse a minha mãe, como se lesse os meus pensamentos. "É o que eles fazem."
"Eu deixei, mãe."
"Estavas apaixonada. E ele é bom a manipular."
O telemóvel vibrou novamente. Era um número desconhecido. Ignorei.
Tocou outra vez. E outra.
Por fim, atendi, irritada. "Estou?"
"Ana? Sou eu, a Sofia."
O meu sangue gelou.
"O que queres?"
"Eu... eu só queria dizer que lamento muito pelo vosso bebé. O Pedro contou-me. Eu não fazia ideia."
A sua voz era suave, cheia de uma falsa simpatia que me revirou o estômago.
"Guardas as tuas desculpas para ti," disse eu, fria como gelo.
"Por favor, não sejas assim," disse ela. "Eu sinto-me horrível. Se eu soubesse..."
"Mas não sabias, pois não? Estavas demasiado ocupada a ter um 'ataque de pânico' para te preocupares com mais alguém."
"Não é justo! Eu tenho um trauma real por causa do meu ex-marido! O Pedro estava só a ajudar-me!"
"Ajudar-te? Ou a reviver os velhos tempos?"
Houve um silêncio do outro lado.
"O Pedro ama-te, Ana. Ele está destroçado."
"Ele não sabe o que é o amor. E tu também não. Vocês os dois merecem-se."
Desliguei.
Olhei para a minha mãe. O seu rosto era uma máscara de fúria.
"Aquela mulher teve a coragem de te ligar?"
Assenti, sentindo-me subitamente exausta.
"Está na hora de acabar com isto de vez," disse a minha mãe, levantando-se. "Vou ligar a um advogado."