O médico entregou-me o atestado de óbito, o papel branco parecia anormalmente pesado na minha mão.
"Senhora, lamento a sua perda. O seu filho... não sobreviveu."
A voz dele era calma, profissional, mas cada palavra era como um martelo a bater no meu peito.
O meu filho, nascido prematuro com apenas sete meses, viveu apenas três dias.
Três dias.
Eu nem sequer tive a oportunidade de o abraçar.
Peguei no meu telemóvel, os meus dedos a tremer tanto que mal conseguia desbloquear o ecrã.
Liguei ao meu marido, Leo.
A chamada demorou uma eternidade a ser atendida. Quando ele finalmente atendeu, o barulho do outro lado era ensurdecedor. Música, risos, o som de copos a tilintar.
"O que foi, Ana? Estou ocupado."
A voz dele estava arrastada, claramente bêbado.
Respirei fundo, tentando manter a minha voz firme.
"Leo, o nosso filho... ele morreu."
Houve uma pausa. Por um segundo, pensei que ele não tinha ouvido.
Depois, ouvi a voz da minha sogra, Sofia, ao fundo, estridente e irritada.
"Morreu? Então morreu. É o destino dele ser de curta duração! Não estragues a celebração do aniversário da Inês por causa de um assunto tão trivial!"
A celebração do aniversário da Inês.
A minha cunhada.
Eles estavam a celebrar enquanto o meu filho, o neto deles, dava o seu último suspiro sozinho numa incubadora.
A minha garganta apertou-se.
"Leo, preciso de ti aqui."
"Ana, não sejas tão insensível", a voz do Leo soou irritada. "A Inês só faz dezoito anos uma vez. Além disso, o que posso fazer se for aí? Não o posso trazer de volta à vida, pois não? Pára de criar problemas."
"Problemas? O nosso filho morreu, e tu chamas a isso criar problemas?"
"Já chega!", ele gritou, a sua voz a cortar o barulho da festa. "A mãe está certa. Algumas pessoas simplesmente não têm sorte. Não arruínes a noite de toda a gente. Falamos sobre isto quando eu chegar a casa."
Ele desligou.
Olhei para o ecrã do telemóvel, para a chamada terminada.
O mundo à minha volta parecia ter ficado em silêncio.
Senti-me vazia. Completamente oca.
O bebé pelo qual esperei, o bebé que senti a mexer-se dentro de mim, o bebé cujos pequenos dedos se agarraram aos meus por um breve momento... desapareceu.
E a família dele estava a celebrar.
A dor era tão avassaladora que eu não conseguia respirar. Curvei-me, a segurar o meu estômago agora vazio, e um soluço seco escapou dos meus lábios.
Não havia lágrimas. Apenas um vazio profundo e frio.
A porta da sala de espera abriu-se e o meu irmão, Tiago, entrou a correr, com o rosto pálido e os olhos cheios de pânico.
"Ana! Eu vim assim que soube. Onde está ele? Onde está o meu sobrinho?"
Olhei para ele, incapaz de formar palavras. Apenas abanei a cabeça lentamente.
O rosto do Tiago desfez-se. Ele correu até mim e abraçou-me com força.
"Oh, Ana. Eu sinto muito. Sinto tanto, tanto."
Naquele momento, no abraço do meu irmão, as lágrimas finalmente vieram. Chorei pelo meu filho, que nunca conheceria o mundo. Chorei por mim mesma, por ter escolhido um homem que me deixou sozinha no momento mais sombrio da minha vida.
E chorei porque sabia, com uma certeza arrepiante, que o meu casamento tinha morrido juntamente com o meu filho.