Liguei-lhe. Foi direto para o correio de voz.
"Claro que vai, meu amor. Ele deve estar preso no trânsito."
Era uma mentira fraca, e eu sabia disso.
O Pedro nunca se atrasava para coisas que lhe importavam.
Finalmente, quando a última mãe veio buscar o seu filho, o Pedro entrou pela porta.
Ele não trazia bolo.
Trazia a sua irmã, Sofia, que chorava histericamente.
"O que aconteceu?" perguntei, a minha voz tensa.
Leo correu para ele. "Papá!"
O Pedro ignorou-o. Ele guiou a Sofia até ao sofá, a sua mão protetora nas costas dela.
"O Tiago deixou-a," disse o Pedro, a sua voz baixa e cheia de raiva. "Aquele desgraçado deixou-a."
A Sofia soluçou mais alto. "Ele disse que eu sou demasiado carente! Que ele precisa de espaço!"
O meu coração apertou-se. Não pela Sofia, mas pelo meu filho, que agora estava parado no meio da sala, completamente esquecido.
Ele olhou do pai para a tia, depois para mim. Os seus lábios tremiam.
"Pedro," comecei eu, a tentar manter a calma. "E o aniversário do Leo? E o bolo?"
O Pedro finalmente olhou para mim. A sua expressão era de pura irritação.
"A sério, Ana? A minha irmã está a passar pelo pior dia da vida dela, e tu estás preocupada com um bolo?"
"Não é sobre o bolo," respondi, a minha própria voz a começar a tremer. "É sobre o teu filho. Tu prometeste."
"As coisas acontecem! A família vem primeiro!" ele rosnou. "A Sofia precisava de mim. Tive de ir buscá-la a casa do Tiago, ajudá-la a fazer as malas. Achas que tive tempo para pensar num bolo estúpido?"
Senti o meu rosto a aquecer. "A tua família não inclui o teu filho de cinco anos no dia do aniversário dele?"
"Não sejas dramática," ele disse, virando-se para confortar a Sofia novamente. "Ele vai superar. É só uma festa."
O Leo começou a chorar. Um choro silencioso, com grandes lágrimas a escorrerem-lhe pela cara.
Aquele som partiu algo dentro de mim.
Ajoelhei-me e abracei-o com força. "Está tudo bem, meu amor. A mamã está aqui."
Naquela noite, depois de pôr um Leo de coração partido na cama, encontrei o Pedro na cozinha.
Ele estava ao telemóvel, a falar em voz baixa. "Sim, mãe. Claro que ela pode ficar aqui o tempo que precisar. Não te preocupes."
Ele desligou e suspirou, passando a mão pelo cabelo.
"Precisamos de conversar," eu disse, a minha voz fria.
"Agora não, Ana. Estou exausto."
"Sim, agora," insisti. "O que fizeste hoje foi inaceitável."
Ele riu-se, um som amargo. "Inaceitável? Salvar a minha irmã de um idiota abusivo é inaceitável? Devias ouvir-te."
"Ele não é abusivo, Pedro. Eles apenas terminaram. E tu abandonaste o teu filho no aniversário dele."
"Ele tem quatro anos, vai ter muitos mais aniversários!"
"Ele fez cinco hoje," corrigi-o, a minha voz cortante. "E tu não estavas lá. Tu nem sequer te lembraste."
Ele ficou em silêncio por um momento, a sua raiva a vacilar.
"Olha, eu lamento," ele disse finalmente, mas não soava a isso. "Foi um dia louco. Vou compensá-lo."
"Não, não vais," eu disse, a decisão a formar-se clara e dura na minha mente. "Isto acaba aqui. Eu quero o divórcio."
O Pedro olhou para mim, chocado. Depois, a sua expressão endureceu.
"Divórcio? Por causa disto? Estás a ser ridícula. Estás a exagerar, como sempre."
"Não," eu disse calmamente. "Estou a ser realista. O Leo merece um pai que o coloque em primeiro lugar. Não em segundo, depois da tua irmã, da tua mãe, de todos os outros."
"Tu não te vais divorciar de mim," ele disse, a sua voz a baixar para um aviso. "Pensa no Leo. Queres que ele venha de um lar desfeito?"
"Ele já vive num," respondi. "Um onde o pai dele não aparece para o seu próprio aniversário. Prefiro que ele tenha dois pais felizes separados do que dois pais miseráveis juntos."
Ele deu um passo em minha direção, o seu rosto uma máscara de fúria. "Tu vais arrepender-te disto, Ana."
Virei-lhe as costas e saí da cozinha.
A decisão estava tomada. Não havia volta a dar.