Pedro finalmente apareceu, horas depois.
O seu cabelo estava molhado, as calças sujas de lama até aos joelhos. Parecia cansado.
Quando me viu, a sua expressão era de preocupação, mas não de devastação.
"Clara, meu amor. Como estás? A tua perna? O bebé?"
Ele ainda não sabia. A sua mãe não lhe tinha contado. Queria que eu o fizesse.
Olhei para ele. O homem que eu amava. O pai do meu filho morto.
"O bebé morreu, Pedro."
Disse as palavras de forma seca. Sem lágrimas. Sem emoção.
Ele ficou paralisado. O seu rosto perdeu a cor.
"O quê? Não... não pode ser. Estás a brincar, certo? É uma piada de mau gosto."
"Acharias que eu brincaria com uma coisa destas?"
Ele olhou para a mãe, que estava a chorar silenciosamente num canto. Ela confirmou com a cabeça.
A realidade atingiu-o. Ele cambaleou para trás, apoiando-se na parede.
"Não... não..."
Ele aproximou-se da cama. Tentou pegar na minha mão.
Eu puxei-a para longe.
"Não me toques."
"Clara, eu... eu não sabia. Se eu soubesse..."
"Se soubesses o quê? Terias vindo mais cedo? Ou terias terminado de secar a cave da Sofia primeiro?"
A sua culpa transformou-se em raiva. Uma defesa.
"Isso não é justo! Como é que eu podia adivinhar que isto ia acontecer? Eu estava a ajudar uma amiga em apuros! Tentei fazer a coisa certa!"
"A coisa certa? A tua mulher grávida estava presa num carro esmagado, e tu foste salvar um cão!"
A minha voz subiu de tom, ecoando no quarto silencioso do hospital.
"Não fales assim da Sofia! Ela estava sozinha e assustada!"
"E eu não estava? Eu estava sozinha e assustada! E estava a carregar o teu filho!"
As lágrimas que eu tinha segurado começaram a cair. Lágrimas de raiva, de dor, de uma traição tão profunda que me cortava a respiração.
"Ele morreu por tua causa", sussurrei, cada palavra um veneno. "Tu mataste o nosso filho."
Pedro recuou como se eu lhe tivesse batido.
"Não digas isso. Nunca digas isso."
A sua mãe interveio.
"Crianças, por favor. Agora não é a altura. Passaram por uma tragédia."
"Ele não passou por nada", disse eu, olhando diretamente para Pedro. "Ele estava demasiado ocupado a ser um herói para outra pessoa."
"Quero o divórcio, Pedro."