Enquanto eu falava, o Pedro ouvia atentamente, tomando notas num bloco amarelo.
Ele não me interrompeu uma única vez.
Quando terminei, ele pousou a caneta.
"Ok, Sofia. Isto é mais do que apenas um divórcio. Há vários elementos aqui. O acidente, a lesão, a difamação por parte da prima e da tua sogra, e a negligência emocional do teu marido."
"Difamação?" perguntei.
"Sim. A Clara mentiu sobre as circunstâncias do acidente, culpando-te. Isso é difamação, especialmente porque a tua reputação como condutora pode ser questionada e a tua lesão foi grave."
Aquilo deu-me uma nova perspetiva.
"E o que podemos fazer?"
"Temos várias opções," disse o Pedro, inclinando-se para a frente. "Primeiro, o divórcio. Vocês casaram com comunhão de adquiridos?"
"Sim."
"Ok. Isso significa que tudo o que foi adquirido durante o casamento é dividido. Mas podemos argumentar que a conduta dele justifica uma divisão desigual, especialmente considerando o impacto na tua carreira."
"Ele disse que eu podia arranjar outro hobby," murmurei, o ressentimento a ferver de novo.
Os olhos do Pedro endureceram.
"Isso é inaceitável. A tua carreira como ilustradora é uma fonte de rendimento, presente e futura. A lesão no teu pulso representa uma perda de capacidade de ganho. Podemos e vamos pedir uma indemnização por isso."
Senti uma pontada de esperança. Não se tratava do dinheiro, mas do reconhecimento.
"E quanto ao acidente?"
"Precisamos do relatório da polícia. Se o outro condutor foi de facto o culpado, podemos processá-lo a ele e à sua seguradora. Mas também podemos usar a mentira da Clara contra ela."
"Como?"
"Uma testemunha que mente deliberadamente perde toda a credibilidade. Se conseguirmos provar que ela estava no carro no momento do impacto, a sua história desmorona-se. E a tua sogra, por espalhar essa mentira, também pode ser responsabilizada."
A ideia de os confrontar com as suas próprias mentiras era incrivelmente satisfatória.
"Como podemos provar que ela estava no carro?"
"Havia câmaras de vigilância na zona? Testemunhas? O relatório dos paramédicos pode mencionar dois passageiros no teu veículo antes de a transportarem."
Uma ideia surgiu na minha mente.
"O meu carro! Tinha uma dashcam. Eu instalei-a há alguns meses."
Os olhos do Pedro iluminaram-se.
"Sofia, isso é ouro. Onde está o carro agora?"
"Deve estar num pátio de reboques da polícia ou da seguradora."
"Excelente. A primeira coisa que vou fazer é uma intimação para obter esse vídeo. Isso vai mudar o jogo completamente."
Ele levantou-se e começou a andar pelo escritório, energizado.
"Ok, este é o plano. Eu vou tratar de toda a papelada do divórcio. Vou contactar o Miguel através de uma carta oficial, informando-o de que o estás a processar. Isso vai apanhá-lo de surpresa."
"Ele vai ficar furioso," disse eu.
"Que fique. A fúria dele não muda os factos. Segundo, vou obter o relatório da polícia e o vídeo da dashcam. Terceiro, vamos enviar uma carta de cessar e desistir à Clara e à Elvira, avisando-as para pararem de espalhar mentiras sobre ti, sob pena de ação legal por difamação."
Senti-me sobrecarregada, mas de uma forma boa.
Pela primeira vez, senti que tinha o controlo.
"Pedro, quanto é que tudo isto vai custar? Eu... não tenho muito dinheiro agora."
Ele sorriu gentilmente.
"Não te preocupes com isso por agora, Sofia. Podemos trabalhar com uma taxa de contingência para o caso da lesão, o que significa que só recebo uma percentagem se ganharmos. Para o divórcio, podemos pedir ao tribunal que ordene ao Miguel o pagamento das tuas custas judiciais, dada a situação."
"Obrigada, Pedro. De verdade."
"Não agradeças. Apenas te prepara. Eles não vão facilitar as coisas."
"Eu sei," disse eu, a minha voz firme. "Mas eu também não."
Saí do escritório do Pedro a sentir-me como uma guerreira a preparar-se para a batalha.
A Laura estava à minha espera no café do outro lado da rua.
"Então?" ela perguntou, ansiosa.
"Temos um plano," disse eu, com um sorriso. "E eles não vão saber o que os atingiu."