Na manhã seguinte, acordei sozinha na nossa cama.
A casa estava silenciosa. O lado dele da cama estava intocado. Ele não tinha vindo para casa.
Levantei-me e preparei-me para o trabalho, movendo-me como um autómato. O meu corpo estava a funcionar, mas a minha mente estava dormente.
Quando cheguei ao meu escritório de advocacia, a minha assistente olhou para mim com preocupação.
"Sra. Almeida, está tudo bem?"
"Estou bem, Sofia. Só preciso de um café forte."
Sentei-me à minha secretária e olhei para a pilha de processos. Eu era uma advogada de divórcios. Que irónico. Eu ajudava os outros a acabar com os seus casamentos, e agora estava a enfrentar o meu próprio fim.
Passei a manhã a tentar concentrar-me, mas a imagem do Lucas e da Lara juntos não saía da minha cabeça.
Por volta do meio-dia, o meu telemóvel tocou. Era o Lucas.
"Estás mais calma agora?", ele perguntou, sem qualquer pedido de desculpas na sua voz.
"Onde estás?"
"Ainda estou no hospital. A Lara teve uma noite difícil. A mãe teve de ir para casa, por isso eu fiquei."
Claro que ficaste.
"Lucas, eu já contratei um advogado."
Houve um silêncio do outro lado.
"O quê? Tu não estás a falar a sério."
"Estou completamente a sério. Vou enviar-te os papéis do divórcio. Podes assiná-los quando tiveres um momento livre de cuidar da minha irmã."
"Catarina, para com isto! Estás a exagerar!"
"Estou a exagerar? Lucas, há quanto tempo é que isto dura? Há quanto tempo é que me fazes de parva?"
"Eu não sei do que estás a falar. Eu amo-te. A Lara é só a tua irmã."
"Não digas isso. Não me insultes com mentiras. Se me amasses, não me terias abandonado ontem. Se me amasses, não estarias a dormir num hospital ao lado dela."
"Ela precisava de mim!"
"E eu? Eu não preciso de ti? Eu sou tua mulher!"
"Tu és forte, Catarina. Consegues aguentar-te sozinha. A Lara não."
As palavras dele atingiram-me. Então era isso. A minha força era a minha punição. Porque eu não era frágil e carente como a Lara, eu não merecia o seu cuidado, a sua atenção.
"Eu posso ser forte", disse eu, com a voz a tremer ligeiramente, "mas não sou uma idiota. Acabou, Lucas."
Desliguei o telefone antes que ele pudesse responder.
Senti um nó na garganta. Respirei fundo, recusei-me a chorar no trabalho.
Minutos depois, a minha mãe ligou. Eu já sabia o que vinha aí.
"Catarina! O que é que fizeste? O Lucas acabou de me ligar, em pânico! Divórcio? Como te atreves a fazer-lhe isto, depois de tudo o que ele fez pela nossa família?"
"Mãe, por favor, não te metas nisto."
"Não me meter? A minha filha mais nova está doente num hospital, e a minha filha mais velha está a tentar destruir o seu casamento por puro ciúme! Claro que me vou meter!"
"Ciúme? Mãe, ele está a ter um caso com a Lara!"
"Não sejas ridícula! Ele está apenas a ser bondoso! Tu é que estás a torcer tudo com a tua mente doentia. O teu pai também era assim, sempre desconfiado, sempre zangado. Parece que herdaste isso dele."
A menção ao meu pai, que nos tinha deixado há muitos anos, foi um golpe baixo.
"A Lara está a chorar aqui por tua causa! O stress está a piorar o estado dela! Queres matá-la?"
"Isso não é justo, mãe."
"A vida não é justa, Catarina! Cresce e para de ser uma criança mimada! Pede desculpa ao Lucas e resolve isto!"
Ela desligou.
Sentei-me ali, a tremer de raiva e dor. A minha própria mãe estava do lado deles. Ela via-me como a vilã.
Naquele momento, percebi que não estava apenas a divorciar-me do Lucas. Estava a divorciar-me de toda a minha família.