No dia seguinte, coloquei a casa à venda.
O agente imobiliário, um homem baixo e com um bigode demasiado grande, percorreu a casa com um olhar crítico.
"É uma boa casa," ele admitiu, "localização excelente. Mas precisa de algumas reparações. A pintura está a descascar, a canalização é antiga."
"Eu sei," respondi, "mas não tenho dinheiro para arranjar nada. O preço tem de refletir isso."
Ele deu de ombros. "Como quiser. Mas vai demorar mais tempo a vender."
Eu não tinha tempo. Precisava do dinheiro o mais rápido possível.
Poucas horas depois de o anúncio ir para o ar, recebi uma chamada. Um número desconhecido.
"Estou a ligar por causa do anúncio da casa na Rua das Flores," disse uma voz masculina, profunda e calma. "Gostaria de a ver."
Fiquei surpreendida. "Claro. Quando?"
"Agora. Estou aqui perto."
Hesitei por um momento. Era estranho, mas eu estava desesperada.
"Está bem. Dê-me dez minutos."
Desliguei e corri pela casa, tentando arrumar a desordem que refletia o caos na minha vida. Não adiantou muito.
A campainha tocou exatamente dez minutos depois.
Abri a porta e deparei-me com um homem que não se parecia em nada com um comprador de casa típico.
Ele era alto, vestia um fato caro que parecia feito à medida, e tinha um ar de poder silencioso. Os seus olhos, de um cinzento penetrante, avaliaram-me de cima a baixo antes de se focarem na casa atrás de mim.
"Sou o Miguel Costa," disse ele, estendendo a mão. A sua mão era quente e firme.
"Lia. Entre, por favor."
Ele entrou e o seu olhar percorreu a sala de estar. Não se focou na tinta a descascar ou nos móveis velhos. Em vez disso, olhou para as fotografias na prateleira. Uma foto minha e da minha mãe, a sorrir num dia de sol.
"Conhecia a sua mãe," disse ele, sem desviar o olhar da fotografia. "Ela era uma mulher boa."
Fiquei paralisada. "Conhecia-a? Como?"
"Negócios," ele respondeu vagamente. "Ela mencionou que tinha uma filha. E que esta casa era tudo o que ela tinha para lhe deixar."
O seu tom não era de pena. Era uma constatação.
"Ela falou de si?" perguntei, confusa. A minha mãe nunca mencionou um homem como este.
"Ela pediu-me um favor uma vez," disse ele, finalmente virando-se para mim. "Pediu-me que, se alguma vez lhe acontecesse alguma coisa, eu garantisse que a filha dela ficava bem."
Um nó formou-se na minha garganta. A minha mãe, sempre a pensar em mim, mesmo quando eu não sabia.
"Eu não preciso de ajuda," disse eu, a minha voz mais dura do que eu pretendia.
Miguel Costa ergueu uma sobrancelha. "Toda a gente precisa de ajuda, Lia. A questão é se a aceita ou não."
Ele caminhou pela casa, em silêncio. Não fez comentários sobre o estado dela. Apenas observou, como se estivesse a memorizar cada detalhe.
Quando voltou para a sala de estar, parou à minha frente.
"Eu compro a casa," disse ele.
Fiquei boquiaberta. "Assim? Sem negociar? O agente disse que..."
"Eu não me importo com o que o agente disse. Eu pago o valor que pediu. Na totalidade. Amanhã."
Aquilo era demasiado bom para ser verdade.
"Porquê?" perguntei, desconfiada. "Porquê está a fazer isto?"
"Porque eu fiz uma promessa à sua mãe," disse ele. "E eu cumpro sempre as minhas promessas."
O seu olhar era intenso, quase avassalador. Havia algo nele, uma profundidade que me assustava e ao mesmo tempo me atraía.
"Não há nenhuma condição?"
"Apenas uma," disse ele, e um leve sorriso surgiu nos seus lábios. "Jante comigo amanhã à noite. Para celebrar o acordo."