"Acho que a investigação no poço está concluída," diz Zé para a câmera. "Mas a noite ainda não acabou. Vamos entrar na mansão. Dizem que o quarto de Luana é o cômodo mais assombrado da casa."
Eles entram na casa, o clima pesado e carregado de acusações. A poeira dança nos feixes de luz das lanternas.
Eles sobem a escadaria principal, cujos degraus rangem sob seus pés.
"Este era o quarto dela," diz Tiago, apontando para uma porta no fim do corredor. A porta está entreaberta.
Zé Coragem a empurra. O quarto está um caos. Roupas jogadas pelo chão, garrafas de bebida vazias em cima da cômoda, cinzeiros cheios de bitucas de cigarro.
"Nossa..." diz Zé, filmando a bagunça. "Parece que alguém deu uma festa aqui."
Meu pai, Ricardo, entra no quarto, o rosto uma máscara de desgosto.
"Era assim que ela vivia," ele diz, com amargura. "Nós tentávamos controlar, mas ela sempre dava um jeito. Trazia gente estranha para cá, fazia festas escondidas enquanto estávamos viajando."
"As garrafas são a prova!" exclama Tiago, pegando uma garrafa de vodca vazia. "Ela bebia, fumava... sabe-se lá o que mais ela fazia aqui."
Minha mãe cobre o rosto com as mãos. "Que vergonha... que vergonha. Nós sempre tentamos manter as aparências, proteger o nome da família. Dizíamos que ela era apenas... incompreendida. Mas a verdade é essa."
Ela aponta para o quarto, para a bagunça que eles mesmos criaram para aquela noite. A bagunça que eles plantaram para as câmeras.
Eu me lembro daquele quarto. Eu o mantinha impecavelmente limpo. As únicas "decorações" eram meus livros e uma coleção de bonecas de pano que eu mesma fazia.
"Nós a amávamos," continua minha mãe, seu discurso ensaiado fluindo perfeitamente. "Mas o amor não foi suficiente para salvá-la de si mesma. Agora, não vamos mais esconder a verdade. O mundo precisa saber o alívio que foi quando ela desapareceu de nossas vidas."
A crueldade em suas palavras é tão palpável que até Zé Coragem parece desconfortável.
Os comentários, no entanto, são de total apoio à família.
"Força, família! Vocês são guerreiros por aguentar isso."
"Essa menina era o próprio demônio."
"Imagina o sofrimento dos pais e da irmã..."
De repente, um som vem do andar de cima. Um rangido alto, como uma porta de sótão se abrindo.
Todos congelam.
"O que foi isso?" sussurra um dos cinegrafistas.
Zé Coragem ergue a lanterna em direção ao teto. "Tem um sótão?"
Meu pai assente. "Sim, mas... ninguém vai lá há anos. A escada está quebrada."
Outro som. Desta vez, um arrastar suave, como algo sendo puxado pelo chão de madeira.
O medo volta a tomar conta do ambiente. Desta vez, não há explicação fácil como um gerador sobrecarregado.
Zé Coragem, o "caçador de mitos", engole em seco. Seu trabalho era expor uma farsa, não encontrar um fantasma de verdade.
"Ok," ele diz, forçando um sorriso para a câmera. "Parece que temos um bônus hoje. Quem quer ver o que tem no sótão?"
Ele se dirige para o corredor, procurando a entrada. A família o segue, relutante, mas compelida pela presença das câmeras e pela necessidade de manter a farsa.
Eles não fazem ideia de que estão caminhando direto para a minha armadilha.
A minha verdade.