Eu sabia que ele estava a mentir. A história era demasiado conveniente, demasiado nobre. Ele queria que eu participasse na farsa, que aceitasse o filho da minha irmã como se fosse um sobrinho distante, para manter a paz.
A raiva borbulhou dentro de mim, uma raiva fria e calculista.
Naquela noite, Tiago voltou para o nosso quarto. Ele tentou abraçar-me, sussurrar mais mentiras doces.
"Sofia, por favor, acredita em mim."
O telemóvel dele tocou. Era a Laura.
"Tiago, estou com desejos. Podes trazer-me morangos?" a voz dela soou, manhosa e exigente.
Ele olhou para mim, hesitando.
"Eu já vou," disse ele ao telemóvel, e depois para mim: "Ela está grávida, precisa de cuidados."
Ele saiu, deixando-me no quarto escuro. O desprezo que senti foi tão intenso que me fez tremer.
Pouco depois, ouvi os sons novamente. Desta vez, mais altos, mais descarados. O som da traição, a confirmação da mentira dele.
Quando ele voltou, horas depois, cheirando ao perfume da minha irmã, eu estava sentada na cama, à espera.
"Onde estiveste?" perguntei, a minha voz era gelo puro.
"Fui buscar os morangos. Depois ficámos a conversar," mentiu ele.
"Não me toques," disse eu, quando ele tentou pegar na minha mão. A repulsa era física.
A sua máscara de paciência caiu.
"Qual é o teu problema, Sofia?" explodiu ele. "Estás a ser ciumenta e irracional! A mulher está grávida e sozinha! O que querias que eu fizesse?"
Ele estava a inverter a culpa, a fazer-me parecer a vilã.
Nos dias seguintes, comecei a evitá-lo. Passava o máximo de tempo possível fora de casa. Mas isso só piorou as coisas. A minha mãe e a minha sogra acusaram-me de ser uma esposa negligente.
"A Laura precisa de apoio, e tu andas a passear," disse a minha mãe. "O Tiago está a fazer o teu trabalho."
Eles forçaram-me a assumir responsabilidades. Um dia, a Laura pediu-me para a levar às compras.
"O Tiago está ocupado na adega. E eu não me sinto segura a conduzir," disse ela, com um sorriso que não chegava aos olhos.
Eu sabia que era uma armadilha, mas não tinha como recusar sem causar mais um conflito.
No estacionamento do supermercado, enquanto eu manobrava o carro para sair do lugar, a Laura abriu a porta do passageiro e atirou-se para o chão.
"Ah! A minha perna! Sofia, tu atropelaste-me!" gritou ela, a sua voz cheia de pânico fingido.
As pessoas começaram a juntar-se. Eu saí do carro, em choque com a sua manipulação descarada.
Tiago deve ter estado à espera de uma chamada dela, porque apareceu em minutos. Ele nem olhou para mim. Correu para a Laura, ajoelhou-se ao lado dela.
"Laura! Estás bem? O bebé!" o seu desespero era real. Ele estava aterrorizado por ela.
Ele pegou nela ao colo, ignorando completamente a minha presença.
Enquanto a levava para o seu carro, ouvi-o sussurrar para ela.
"Calma, meu amor. Vai ficar tudo bem."
Meu amor.
Aquelas duas palavras atingiram-me com a força de um murro. Não era apenas sexo. Não era apenas um dever. Era amor. Ele amava-a.